Ultraprocessados não são comida e podem causar 32 doenças, dizem estudos

Cientistas fizeram uma revisão completa de 14 artigos sobre o consumo dos ultraprocessados; estão na lista dos efeitos nocivos doenças cardíacas, câncer, problemas de saúde mental e morte precoce.

Cientistas americanos, australianos e europeus fizeram a maior revisão mundial dos estudos sobre os malefícios dos alimentos ultraprocessados e chegaram à conclusão de que eles estão diretamente associados a 32 doenças. Estão na lista dos efeitos nocivos doenças cardíacas, câncer, diabetes tipo 2, problemas de saúde mental e morte precoce.

Os cientistas fizeram uma revisão guarda-chuva – que é um resumo de evidências de alto nível – de 45 diferentes meta-análises provenientes de 14 artigos de revisão. Um artigo de revisão é um resumo das evidências científicas sobre um tema específico.

Todos os 14 artigos usados na revisão guarda-chuva foram publicados nos últimos três anos e envolveram cerca de 10 milhões de pessoas. O mais importante: nenhum deles foi financiado por empresas envolvidas na produção de ultraprocessados.

A cientista brasileira Fernanda Rauber, doutora em ciências da Saúde e pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde Pública da USP, resume o motivo deste tipo de alimento fazer tão mal à saúde: “A maior parte dos ultraprocessados não é comida. É uma substância comestível produzida industrialmente.”

Alimentos ultraprocessados está emburrecendo os seres humanos
Foto: Divulgação

Alimentos ultraprocessados causam grande malefício na saúde humana

O consumo de alimentos ultraprocessados é responsável por aproximadamente 57 mil mortes prematuras de pessoas entre 30 e 69 anos por ano no Brasil, segundo um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e Universidade de Santiago de Chile e publicado no “American Journal of Preventive Medicine”. 

Ainda segundo a pesquisa, se o consumo desse tipo de produto fosse reduzido ao que era uma década atrás, 21% dessas mortes seriam evitadas. Além disso, uma redução de 10% a 50% no consumo de ultraprocessados poderia evitar de 5.900 a 29.300 mortes anualmente.

Mais de 80 cientistas, representantes de governo e da sociedade civil, produziram documento em que sintetizam evidências científicas sobre os malefícios dos alimentos ultraprocessados à saúde humana e planetária.

A proposta, que será encaminhada à Cúpula de Sistemas Alimentares, da Organização das Nações Unidas (ONU), pleiteia que o tema seja tratado com a devida relevância e que seja incluído nas discussões do evento, que acontecerá em setembro de 2021, quando se discutirá pontos críticos de sistemas alimentares, com foco em alcançar os objetivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.

Pães de forma, macarrão instantâneo, refrigerantes: os ultraprocessados são produtos que passaram por um longo processo industrial ao ponto de sua composição final não lembrar a comida de verdade. Vários estudos mostram os prejuízos que eles causam à saúde.

Uma das pesquisas mais recentes foi realizada por cientistas da USP com base no Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil) e mostra que o consumo de ultraprocessados é um dos fatores que contribuem para o declínio do desempenho cognitivo ao longo do tempo. Os dados mostraram que a queda cognitiva ao longo da vida é 28% maior em quem consome mais de 20% das calorias diárias em ultraprocessados. Isso equivale, por exemplo, a comer três pães de forma todos os dias.

Consumo brasileiro de ultraprocessados é baixo

A cientista brasileira disse ao Brazil Journal que o Brasil ainda está bem posicionado no mapa mundial dos países que menos consomem ultraprocessados. Cerca de 25% das calorias consumidas pelo brasileiro vem deste tipo de alimento. Nos Estados Unidos e no Reino Unido, este percentual ultrapassa os 50%. Mas Fernanda alerta que isto pode estar mudando com o fato de que os alimentos ultraprocessados estão ficando mais baratos.

Um estudo recente da UFMG mostra que já aumentou o consumo de ultraprocessados nas periferias brasileiras, com as pessoas trocando o arroz com feijão por este tipo de alimento. Falta de informação, os preços altos dos alimentos saudáveis e muita publicidade da indústria de ultraprocessados são alguns dos pontos levantados pela pesquisa.

De qualquer forma, Fernanda comemora o fato de que recentemente o governo federal regulamentou o tipo de alimento que se pode comprar para a merenda escolar, proibindo a distribuição de alimentos ultraprocessados.

Além disso, desde o ano passado as embalagens precisam vir com uma tarja preta quando possuem muita gordura ou açúcar. “Poderia ter abrangido todos os ultraprocessados, mas já é uma vitória porque, de fato, as pessoas compram menos quando recebem este tipo de alerta,” disse Fernanda.

Para a pesquisadora, este tipo de política pública influencia a indústria alimentícia, que tende a mudar seus produtos quando uma tarja passa a fazer parte da sua embalagem.

Exposição da população aos ultraprocessados

A ampla revisão dos estudos sobre o tema – feita pelos especialistas de instituições como a Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg, a Universidade de Sydney e a Sorbonne – também faz o alerta de que é preciso reduzir urgentemente a exposição da população aos ultraprocessados.

As evidências analisadas mostram que uma maior ingestão deste tipo de alimento está associada a um risco cerca de 50% maior de morte relacionada a doenças cardiovasculares, um risco de 48% a 53% maior de ansiedade e transtornos mentais, um risco 12% maior de diabetes e um aumento de 22% do risco de depressão.

Há também evidências de associação do consumo de ultraprocessados com asma, saúde gastrointestinal, alguns tipos de câncer e fatores de risco cardiometabólicos como níveis elevados de gordura no sangue e baixos níveis de colesterol bom – apesar destes mesmos cientistas dizerem que as evidências destas conexões são limitadas.

O problema deste tipo de substância, segundo Fernanda, é que elas são tornadas palatáveis e atraentes pelo uso de combinações de sabores, cores, emulsificantes, espessantes e outros aditivos.

“Eles fazem uma explosão de sabores na boca das crianças,” diz Fernanda. Estes alimentos também viciam e são macios, fazendo com que as pessoas comam mais do que precisam comer.

Mas como então saber se os ultraprocessados invadiram sua casa? Basta olhar a embalagem. Se os ingredientes descritos não são aqueles que você conhece e tem na sua cozinha, devolva para a prateleira do supermercado, disse a pesquisadora.

Informações adaptadas do BrazilJournal

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