Trigo do Cerrado apresenta alta qualidade, verifica estudo

Os testes das amostras de trigo tropical mostraram qualidade tecnológica muito boa, com elevada força de glúten na maior parte delas

trigo produzido no Cerrado brasileiro possui alta qualidade e mostra bom rendimento no campo e na agroindústria, com características especiais que habilitam seu uso na panificação industrial. Essa é a constatação de uma pesquisa conduzida pela Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), Embrapa Trigo (RS) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) com o trigo cultivado no Cerrado Mineiro.

Foram estudadas 34 amostras provenientes de 12 genótipos de trigo desenvolvidos pela Embrapa e cultivados sob sistemas irrigado e de sequeiro, em cinco municípios do Cerrado Mineiro. Os testes das amostras de trigo tropical mostraram qualidade tecnológica muito boa, com elevada força de glúten na maior parte delas, comprovando que o cereal é apropriado para ser utilizado na panificação ou mesmo em mescla com trigo de força menor, em caso de ser melhorador.

“Existe um enorme potencial comercial a ser explorado com o cultivo do trigo em ambientes tropicais, como o Cerrado Brasileiro”, afirma Martha Zavariz, pesquisadora de Laboratório de Qualidade de Grãos, da Embrapa Trigo. A região de Cerrado é caracterizada por não ter chuva na época de colheita, assim, os grãos são sadios com baixa atividade da enzima alfa-amilase, ou seja, não se apresentam germinados, sendo, portanto, adequados para produção de farinha para fazer pão. Além disso, os grãos, em geral, apresentam textura dura, gerando um bom rendimento em farinha, o que é muito interessante para os moinhos em termos comerciais. “Na moagem industrial, quando os grãos são duros, a casca ou farelo separa-se mais facilmente do endosperma (parte branca do interior do grão), permitindo rendimentos mais elevados em farinha branca”, explica.

O estudo foi publicado no Journal of Food Processing and Preservation e contou com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Potencial prebiótico

A equipe de pesquisa também realizou uma abrangente caracterização do amido. “Identificamos um equilíbrio entre os teores do amido danificado e da força de glúten nas amostras analisadas, adequados para produção de pães de qualidade, com miolo macio, crosta crocante e visual atraente”, revela Cristina Takeiti, pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos.

Especialmente as variedades cultivadas no município mineiro de Piumhí (MG) expressaram um alto nível de amido resistente, devido ao clima e ao solo da região. “Esse trigo apresenta uma estrutura molecular de amido mais cristalina, compacta e organizada, o que indica ser mais resistente à digestão, compatível, portanto, com potencial efeito prebiótico” aponta Mariana Larraz, professora e pesquisadora do curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição da Unirio. “Essa fração de amido resistente possui ação metabólica de fibra alimentar, trazendo benefícios para a microbiota intestinal e, consequentemente, para a saúde humana. Trata-se de um diferencial superinteressante do trigo cultivado no Cerrado Mineiro para o desenvolvimento de alimentos funcionais que contribuem para a promoção de uma alimentação mais saudável”, complementa a pesquisadora.

Em síntese, os dados indicam que o Cerrado possui grande potencial para se tornar uma das maiores regiões produtoras de trigo de alta qualidade no mundo. Para alcançar esse patamar, segundo o professor e pesquisador do curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição da Unirio Luiz Carlos Gutkoski, que atua há mais de 30 anos em estudos de qualidade tecnológica de trigo, é preciso continuar investindo em pesquisa e desenvolvimento de novas cultivares de trigo adaptadas ao solo nacional e avançar em políticas públicas para incentivar a cadeia produtiva.

Melhoramento genético

Outra questão importante sobre o cultivo de trigo na região de Cerrado é a suscetibilidade à seca e a brusone, que é a principal doença do trigo na região tropical. Martha Zavariz, que há 23 anos colabora com a área de melhoramento de trigo na Embrapa, destaca a necessidade de contínuo desenvolvimento de novas cultivares com resistência à seca e a brusone, combinadas com elevada produtividade de grãos e qualidade tecnológica adequada ao uso final, seja para uso doméstico ou industrial para essa região.

Foto de homem em frente a colheitadeira em lavoura de trigo.
Pesquisadores afirmam que genética precisa seguir evoluindo | Foto: João Leonardo Pires/Divulgação

“A cultivar BRS 264 adotada em ambientes tropicais tem se mostrado bem resistente à seca e excelente para produção de pães”, afirma a pesquisadora. Por ser um produto de ótima qualidade, a farinha produzida a partir desse trigo pode ser comercializada a preço superior e resultar em produtos alimentares, como diversos tipos de pães, biscoitos tipo “cracker” e massas alimentares secas que atendam a demanda de consumidores mais exigentes.

Nesse sentido, para a pesquisadora, é imperativo o contínuo investimento público em programas de melhoramento de trigo no Brasil. “Estamos sempre desenvolvendo novas cultivares de trigo para atender às necessidades que surgem no campo e também às demandas da indústria moageira e de uso final ao longo do tempo. É um trabalho contínuo que beneficia todo o complexo agroindustrial do trigo”, conclui Martha.

Fonte: Embrapa

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