STF pode derrubar compra de terra por estrangeiro

Após Bolsonaro prometer que vetaria qualquer proposta aprovada nesse sentido, agora, quem pode resolver o assunto é o STF. Confira abaixo!

Em dezembro, quando prometeu vetar qualquer proposta aprovada no Congresso Nacional que flexibilize as regras sobre compras de terras por estrangeiros, o presidente Jair Bolsonaro deu um banho de água fria nas pretensões de parte da bancada ruralista e das entidades do agronegócio. Agora, quem pode resolver o assunto é o Supremo Tribunal Federal (STF).

A Corte inicia hoje o julgamento de duas ações sobre a constitucionalidade das restrições impostas pela legislação de 1971 e por um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) de 2010. Entre outros itens, as normas restringem a 25% do território do município, sem exceder 10% para pessoas de mesma nacionalidade, as áreas rurais que podem ser vendidas a empresas brasileiras com maioria de capital internacional. Essa mesma regra vale para pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras.

O ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso, indicará a manutenção do entendimento atual, informa o texto de seu voto, obtido pelo Valor. Segundo ele, a restrição respeita os princípios da soberania, da segurança nacional, da proteção do meio ambiente e da ordem econômica. A aquisição indiscriminada de imóveis rurais, afirma o ministro, poderia violar a independência do país.

“A ausência de regulação compromete o aspecto externo da soberania, ao permitir que parcela do território seja submetida à vontade de pessoas de fora”, escreveu ele, no âmbito da ação em que a Sociedade Rural Brasileira (SRB) contesta o parecer da AGU que limitou o acesso às terras.

O ex-presidente da SRB e atual secretário de Agricultura de São Paulo, Gustavo Junqueira, autor da ação, diz que o parecer da AGU, publicado no segundo governo Lula, segue uma “cartilha socialista”, que limita investimentos no agronegócio ao estabelecer uma “intervenção estatal na vida privada das empresas e pessoas”.

Ao Valor, ele criticou a diferenciação de tratamento dado ao capital estrangeiro direcionado ao campo e disse que, devido à rigidez das leis fundiária, trabalhista e ambiental brasileiras, a soberania nacional não está sob risco. “O risco está mais com estrangeiro que vai investir aqui do que com o brasileiro”, opinou.

Para o relator do caso, contudo, a lei pretende garantir “a autodeterminação do povo brasileiro para conduzir a política econômica de forma eficaz, sem ser constrangido ante influência externa indevida”. Ao contrário de interferir na autonomia das pessoas jurídicas, prossegue o ministro, a norma estimula a igualdade em relação às demais potências no mercado global e evita “atividade econômica predatória”.

De acordo com Marco Aurélio, o parecer da AGU traduz a urgência da regulamentação, diante da expansão da fronteira agrícola e do aumento nos índices de biopirataria, desmatamento e grilagem de terras. “A terra rural ocupa posição nuclear na condução dos assuntos econômicos, tendo em conta a distribuição desigual. A liberdade absoluta à circulação de capital estrangeiro ensejaria graves reflexos do capital especulativo na questão agrária, com o aumento de latifúndios e de conflitos agrários”.

O ministro também dá razão ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e considera ilegal um parecer da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo que dispensou tabeliães e oficiais de registro de observarem as restrições e as determinações impostas pela lei.

Com a indicação dada por Bolsonaro de barrar mudanças saídas do Congresso, o agronegócio foi pego de surpresa com a pauta do Supremo. Marco Aurélio indeferiu os pedidos da SRB e do governo paulista para que o julgamento não fosse virtual, alegando que o tribunal está sobrecarregado e a prestação jurisdicional “não pode ficar paralisada”.

Com isso, o julgamento de ambos os casos começará hoje no plenário virtual do STF. A plataforma fica aberta até o próximo dia 5 para receber os votos dos ministros, depositados por escrito.

O advogado Ricardo Quass Duarte, sócio do escritório Souto Correa, defendeu uma empresa brasileira com capital estrangeiro na compra de imóvel rural em São Paulo em 2012, caso que gerou a ação movida pelo Incra. Na sua visão, a regra não mais se sustenta em um mercado aquecido de fusões e aquisições. “Se a pessoa jurídica tem sede no Brasil e é organizada sob as leis brasileiras, pagando impostos e gerando empregos aqui, não há motivo para equipará-la a estrangeiro”, afirmou.

Procurada, a AGU disse que as restrições são compatíveis com os preceitos constitucionais da soberania, do desenvolvimento nacional e da função social da propriedade. O Incra, em nota, defendeu o cumprimento da lei.

Com informações do Valor.

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