
Espécie invasora que ameaça lavouras, biodiversidade e a pecuária brasileira, mas a legalidade da caça de javalis e do abate está sendo questionada no STF por entidade de proteção animal
A disputa em torno do controle da população de javalis no Brasil chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). O Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7.808) para suspender a Lei 18.817/2023 de Santa Catarina, que autoriza o abate da espécie como medida de manejo. Com o novo capítulo e, atual posição da Suprema Corte sobre os temas, existe uma grande chance do STF deve proibir a caça de javalis após pedido de entidade.
O processo está sob relatoria do ministro Kassio Nunes Marques e reacende o debate entre ambientalistas, caçadores, produtores rurais e o próprio governo federal sobre a forma mais eficaz — e ética — de lidar com a que já é considerada uma das maiores pragas ambientais e agropecuárias do país.
O avanço descontrolado da praga
O javali-europeu (Sus scrofa), espécie exótica trazida para o Brasil há mais de meio século, e os javaporcos — híbridos entre javalis e suínos domésticos — já estão presentes em todos os estados brasileiros. A rápida expansão se deve à sua alta adaptabilidade, ausência de predadores naturais e, segundo denúncias de órgãos como o Ibama, à liberação proposital dos animais na natureza para a prática da caça esportiva, frequentemente travestida de controle populacional.
Esses animais representam uma ameaça tripla:
- Agrícola: devastam lavouras de milho, soja e outras culturas, com perdas estimadas em até 40% da produção em algumas regiões, segundo o MAPA;
- Sanitária: transmitem doenças como a peste suína clássica e a febre aftosa, colocando em risco o rebanho nacional;
- Ambiental: competem com espécies nativas por alimento e habitat, alterando ecossistemas e causando desequilíbrio na fauna silvestre.
Caça de Javalis: Um milhão de abates em 2025?
Diante desse cenário, a Associação Brasileira de Caçadores “Aqui Tem Javali” estima que será necessário abater mais de 1 milhão de javalis em 2025 para conter os danos. Segundo o presidente da entidade, Rafael Salerno, foram abatidos cerca de 500 mil javalis em 2024, mas os números aumentaram drasticamente após a suspensão do uso de armas de fogo no segundo semestre de 2023, apontado como um dos principais fatores para o descontrole atual.
A associação também denuncia o que chama de “boicote oficial” ao controle da praga, com mais de mil licenças de caça suspensas, lentidão nas autorizações de transporte de armas e falta de escuta aos caçadores por parte dos ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura.

A contestação no STF
Na ação apresentada ao STF, o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal afirma que a legislação de Santa Catarina ultrapassa os limites da competência estadual, pois a regulamentação da fauna e da caça cabe à União, segundo a Constituição. Além disso, a entidade denuncia que a norma abre brechas para a prática da caça desportiva, o que contraria a Lei Federal 5.197/1967, que veda a caça profissional e qualquer abate de animais silvestres sem autorização expressa da autoridade competente.
A ação cita também investigações de criadouros clandestinos em áreas de preservação permanente (APPs), supostamente mantidos para alimentar a prática da caça sob o pretexto de controle.
A posição do Ibama e alternativas ao abate
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) reconhece os prejuízos causados pelos javalis, mas critica a proposta de abate em massa. O biólogo e agente federal Roberto Cabral afirma que não há base técnica para estabelecer metas como a de um milhão de abates, pois o país sequer possui um censo nacional da espécie. Ele ressalta que o controle via caça com armas de fogo, em vigor desde 2013, não surtiu efeito — e pode, na verdade, ampliar a dispersão dos animais.
Para o Ibama, a solução passa por armadilhas e captura de grupos inteiros, o que seria mais eficaz e ético. Está em estudo um novo plano nacional para controle da espécie, com menor dependência de caçadores armados e maior foco em inteligência ambiental.
Entre a urgência e a legalidade na caça de javalis
O caso coloca o STF diante de um dilema: como equilibrar o combate urgente a uma praga devastadora com o respeito às leis ambientais e à proteção dos animais?
Enquanto o Supremo não decide, produtores seguem arcando com prejuízos e caçadores enfrentam insegurança jurídica para atuar. A decisão poderá não apenas definir o futuro da caça ao javali no Brasil, mas também moldar o rumo das políticas ambientais e agropecuárias diante de espécies invasoras.
Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias.