Retirada dos impostos a exportação Argentina: impactos para o leite brasileiro

O objetivo do governo é melhorar a competitividade dos produtos argentinos no mercado internacional e diminuir a sobrecarga tributária sobre o setor.

O governo argentino é bastante intervencionista em seu mercado agrícola. Uma das medidas praticadas pelo governo são as “retenciones”tarifa cobrada sobre as exportações agrícolas argentinas, que tem objetivo de controlar a inflação interna do país – como o país é um grande exportador de commodities do Agro e, assim sendo, fica muito sujeito às variações de preços no mercado internacional, usa este mecanismo de taxar as exportações para (tentar) controlar a inflação interna; via de regra não tem sucesso nisso, e acaba gerando muita instabilidade nos mercados do Agro argentino.

As tarifas são distintas de acordo com cada produto. Para os lácteos, por exemplo, é cobrado 9% para os leites em pó e 4,5% para os queijos.

A nova medida do governo

Recentemente, o governo anunciou uma medida provisória, de 90 dias, para a suspensão das retenciones sobre as exportações de lácteos. O objetivo do governo é melhorar a competitividade dos produtos argentinos no mercado internacional e diminuir a sobrecarga tributária sobre o setor, o que beneficia tanto as indústrias como os produtores, que vêm enfrentando enormes desafios de rentabilidade nos últimos meses.

Nesse mesmo anúncio, o ministro da economia, Sérgio Massa, comunicou o congelamento dos preços dos lácteos nos supermercados para o mesmo período de 90 dias, de modo que o consumidor não sofra com uma possível elevação dos preços nas gôndolas.

É importante destacar que Sérgio Massa é um dos candidatos à presidência da Argentina. O país vai às urnas no próximo dia 22 de outubro, para as votações do 1º turno.
 

Impactos no mercado lácteo argentino

A medida foi bem aceita pelo setor. Aliás, dá um alívio (temporário!) da carga tributária. O governo estima que cerca de 10.000 milhões de pesos argentinos (cerca de 29 milhões de dólares) deixem de ser arrecadados pelo imposto e fiquem no setor.

Teoricamente, com a menor sobrecarga fiscal sobre os preços dos lácteos, as indústrias teriam maior capacidade de elevar o preço pago ao produtor. Entretanto, em consulta do MilkPoint Mercado às indústrias lácteas argentinas, a expectativa é de que esses estímulos tenham pouco impacto nos preços ao produtor argentino nos próximos meses.

O setor vem de um período longo de redução dos preços de venda dos lácteos no mercado internacional e, apesar dos primeiros sinais de recuperação nas últimas semanas, o preço do leite dos produtores deve seguir pressionado.

No gráfico abaixo podemos observar a variação do preço médio do leilão Global Dairy Trade (GDT). Os preços dos lácteos atingiram o pico no início de 2022 e, desde então, vêm apresentando uma clara tendência de queda. Nos últimos meses, esse recuo foi ainda mais intenso, fazendo com que em agosto o preço médio do leilão GDT atingisse a mínima dos últimos 3 anos.

Gráfico 1. Preço médio do leilão GDT.

Fonte: Global Dairy Trade – elaborado pelo MilkPoint Mercado.

 Por ser um grande exportador de lácteos, os preços das exportações argentinas sofrem grande influência dos preços do mercado internacional (que tem como principal balizador, o leilão GDT). No período de janeiro/2011 a julho/2023, os preços de exportações do leite em pó integral (LPI) da Argentina apresentam uma correlação de +81% com o preço do LPI leilão GDT de 4 meses anteriores.


Gráfico 2. Preço médio leite em pó integral – exportações da Argentina vs GDT (USD/ton).

Fonte: GDT e MAGyP – elaborado pelo MilkPoint Mercado.

Além da questão do preço recebido pelo leite, o produtor argentino vem enfrentando outros sérios desafios, como a elevação dos custos de produção e a adversidade climática com a seca no país.

Em entrevista ao portal El Litoral, o coordenador do Observatorio de la Cadena Láctea Argentina (OCLA), Jorge Giraudo, abordou os possíveis efeitos das novas medidas para o produtor de leite. Em uma conta teórica, Jorge estima que o montante que deixará de ser arrecadado em forma de impostos pelo governo poderá refletir em um acréscimo de cerca de 2 pesos por litro de leite. Mesmo nesse cenário, o valor recebido pelo produtor ainda seguiria abaixo do custo de produção estimado.


Tabela 1. Preço ao Produtor vs Custo de Produção de leite na Argentina (agosto/2023)

Fonte: OCLA, com base nos custos regionais da produção de leite do INTA – elaborado pelo MilkPoint Mercado.

 Impactos no mercado lácteo brasileiro

O MilkPoint Mercado conversou com algumas empresas exportadoras de lácteos da Argentina para avaliar as expectativas das empresas em relação às medidas, os possíveis impactos no mercado e como essas medidas poderiam influenciar nas negociações com o Brasil.

Em relação aos preços de exportação, as empresas consultadas relatam que os preços praticados para exportações devem seguir a tendência do mercado internacional, que tem apresentado alta nas últimas semanas.

No que diz respeito ao preço ao produtor na Argentina, o imposto de “retenciones” é aplicado sobre o valor final do produto lácteo com valor agregado, não em relação à matéria-prima. Portanto, cabe à indústria repassar o aumento de valor para o preço pago ao produtor. Nesse cenário, não se espera um estímulo imediato à produção, o que poderia aumentar a disponibilidade de leite para exportações.

Os agentes consultados também destacaram os enormes desafios que a cadeia láctea argentina vem enfrentando. Os custos dos grãos, que também são afetados por intervenções estatais, têm apresentado uma alta volatilidade de preços. Os desafios climáticos ainda persistem. Além disso, há um grande grau de incerteza em relação aos preços internacionais e à rentabilidade do produtor em 2024, o que mantém uma perspectiva pessimista para a produção no próximo ano.

Fonte: Global Dairy Trade

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Juliana Freire sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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