O desemprego e a redução do poder aquisitivo da população frearam a demanda interna de carne bovina, que atingiu nível histórico de queda. Para se ter ideia, há dez anos, o consumo per capita por brasileiro era de 40 quilos por ano, ante os atuais 32 quilos por ano, o menor da década, segundo dados na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O cenário atual é de demanda interna fraca e oferta restrita, na análise de especialistas do setor.
Na avaliação do consultor de mercado da Scot Consultoria Gustavo Aguiar, o quadro é de preços firmes do boi e oferta limitada, devido à redução de fêmeas, em resposta à alta valorização do bezerro. “A retração na oferta de fêmeas impacta o mercado de carne por ter menos matéria prima disponível nos frigoríficos”, ressalta.
De acordo com Aguiar, em razão dessa oferta curta, os preços vêm reagindo desde o começo do ano. “De maneira geral, os preços caem no primeiro semestre, mas nesse ano foi diferente, ou seja, permanecem firmes e, na entrada de julho, a oferta continua limitada, o que consegue segurar as cotações em patamares altos”, observa. “Por outro lado, há uma grande dificuldade na venda de carne no atacado e no varejo, que tem diminuído de maneira constante”, acrescenta.
DIFICULDADE EM FECHAR A CONTA
Aguiar afirma que os frigoríficos exportadores também estão com problemas para fechar a conta. “Quando o dólar estava beirando 4 reais, a margem era bem melhor e isso fazia com que fechassem a conta de forma um pouco mais tranquila. Agora, com o câmbio na casa dos três reais, está mais difícil”, acentua Aguiar. “A margem dos frigoríficos está em um momento histórico muito apertado”, resume.
De acordo com o boletim semanal do Instituto de Mato-Grossense de Economia Aplicada (Imea), no acumulado de janeiro a junho, o dólar caiu 15,50%, afetando a competitividade da carne bovina brasileira no exterior e diminuindo a receita em reais. “A situação da demanda interna ou externa é delicada, e com a oferta ainda restrita, a queda de braço entre os elos deve acirrar-se nos próximos meses”, prevê a equipe de analistas do Imea.
MEDIDAS RESTRITAS
Em resposta ao cenário de margens historicamente apertadas, os frigoríficos começaram a adotar medidas restritivas. “Em razão do ponto de retorno que a atividade chegou, é possível que as algumas unidades sejam paralisadas ou operem com atividade reduzida e, quem sabe, algumas empresas menores, com uma ou duas plantas, com menor poder de barganha no mercado interno, venham a fechar as portas”, prevê o analista da Scot Consultoria.
De acordo com Péricles Salazar, presidente Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), a demanda fraca resultou em uma crise histórica para o setor que garante o emprego de mais de 1 milhão de pessoas no Brasil. “Este ano, muitos frigoríficos encerraram suas atividades. Em julho, por exemplo, as unidades do JBS, em Epitácio Pessoa, SP, e da Oregon, em Apucarana, PR, demitiram mais de mil funcionários”, ilustra.
Segundo o boletim do Imea, a dificuldade de escoamento de carne no mercado interno reduziu a rentabilidade dos frigoríficos mato-grossenses. O indicador Equivalente Cortes Desossados (ECD), que expressa as receita brutas das indústrias no Estado, atingiu, em junho, R$ 151,05 por arroba, acumulando desvalorização de 8% desde o início do ano. “A dificuldade de comercialização da carne bovina no mercado interno motivou essa redução”, destaca a publicação.
Em Mato Grosso, os frigoríficos operam com ociosidade alta e alguns estão pulando dias de abate. Analistas do Imea afirmam que há meses a margem de comercialização das indústrias atingiu patamares históricos baixos, o que limita a força do mercado, mesmo com a oferta restrita e animais.
Na visão do consultor da Scot, atualmente o mercado vive um grande dilema. “Sem muita oferta, o preço do boi permanece alto. A dúvida é até onde o mercado pode ir e como ocorrerá o ajuste em curto prazo, no segundo semestre”, ressalta. “O cenário é de grande dificuldade operacional e a expectativa, para o segundo semestre, é de onde virá o ajuste.”
PRESSÃO
“Em São Paulo, os preços do boi gordo acumulam pequena queda no correr de julho, refletindo principalmente a pressão de frigoríficos, que seguem relatando dificuldades para a venda de carne no atacado. Por outro lado, a oferta de animais para abate não é significativa, o que acaba limitando a redução dos valores da arroba”, analisa Shirley Menezes, pesquisadora do Cepea.
Segundo a pesquisadora, na parcial do mês (até o dia 26), o Indicador Esalq/BM&FBovespa (Estado de São Paulo) do boi gordo registra queda de 0,6%, fechando a R$ 154,65, na terça-feira, 26 de julho.
Fonte sna.agr.br