A seca na região Sul frustrou as perspectivas de colheita e deve prolongar os repasses dos preços mais altos ao consumidor.
SÃO PAULO (Reuters) – As safras recordes de soja e milho que se desenhavam para o verão de 2021/22 eram a chance de um alívio aos custos da indústria de carnes do Brasil, mas a seca na região Sul frustrou as perspectivas de colheita e deve prolongar os repasses dos preços mais altos ao consumidor.
O salto de mais de 10% neste início de ano na cotação do milho, principal matéria-prima da ração, afastou do mercado aqueles compradores que tinham estoques, como é o caso da Aurora Coop, terceira maior produtora de aves e suínos no Brasil, onde as compras de milho estão temporariamente paralisadas.
Mas, pelo menos neste início do ano e até a entrada da segunda safra, não se espera alívio nos custos, que vêm elevados desde a temporada passada após perdas na produção por seca e geadas, e com impacto importante nos índices inflacionários.
“O milho vai continuar caro, mas não comporta mais processos especulativos por acharem que vai faltar ou não”, disse o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin.
O executivo da associação que reúne empresas como JBS (SA:JBSS3), BRF (SA:BRFS3) e Aurora, ressaltou que o setor tem opção de importar o cereal, como fez em 2021. “Então o que a gente vê é a necessidade das empresas continuarem os repasses de custos”, acrescentou Santin, em entrevista à Reuters.
A alternativa para empresas como a Aurora, com forte atuação no Sul do Brasil, será buscar o milho no Centro-Oeste ou a importação do grão da Argentina ou Paraguai.
- Frigorífico móvel que faz o abate de bovinos na própria fazenda
- Fundos agrícolas já podem ser indicados à calculadora da Receita
- Reforma tributária isenta cesta básica de impostos
- Volta de Trump ao poder deve acirrar concorrência agrícola entre Brasil e EUA
- População empregada no agronegócio cresce 2% no 3º tri de 2024
“Não acredito que vá faltar, mas será um produto caro, sem dúvida… Entramos em 2022 com custo mais elevado do que se esperava, sem dúvida”, disse o vice-presidente de agronegócios da Aurora, Marcos Antônio Zordan.
“De 15 dias pra cá, o milho já mudou por conta da estiagem. Chegava na indústria a 84 reais por saca e agora já está custando no produtor 94 reais”, disse.
Ele comentou que o cenário deve melhorar somente no segundo semestre, com a colheita da “safrinha”.
Segundo o vice-presidente da agronegócio da Aurora, a cooperativa ainda consegue ficar fora do mercado à espera de melhores oportunidades de negociação por 45 dias, mas o ideal é que nas próximas duas semanas voltem a girar compras para evitar risco de escassez para a operação.
Na terça-feira, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) fez uma forte redução em sua projeção para a produção nacional de milho, agora estimada em 112,9 milhões de toneladas, versus 117,2 milhões na previsão anterior.
Entretanto, para a safra de verão –cuja oferta atende parte da demanda da indústria de carnes no primeiro semestre– a previsão da Conab para o cereal caiu de 29 milhões de toneladas para 24,8 milhões.
Além do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, áreas de Mato Grosso do Sul sofrem com calor intenso e falta de chuvas causados pela La Niña, assim como algumas regiões dos vizinhos Argentina e Paraguai.
A Conab ainda baixou sua expectativa para a produção de soja em 2,3 milhões de toneladas, para 140,5 milhões, em uma perspectiva mais otimista do que algumas consultorias do mercado, que já não trabalham com a possibilidade de um novo recorde em 2021/22.
Estratégia e importação
O consultor de Agronegócio do Itaú BBA, Cesar de Castro Alves, lembrou que a perspectiva inicial indicava que os custos da indústria frigorífica se acomodariam um pouco, visto que o plantio de verão ocorreu em período ideal no início da temporada.
Agora, a primeira safra de milho ficou menor e a demanda por grãos está aquecida, disse ele, resultando em preços elevados ao longo da cadeia e margens mais apertadas.
“O milho já voltou a subir e vai ficar mais alto do que se imaginava. Ainda não dá pra condenar a safrinha, vai depender da colheita de soja, mas até lá, pelo menos o primeiro trimestre do ano, vai ser muito mais apertado para a indústria”, afirmou.
Apesar da redução na produção de verão, a Conab espera uma forte recuperação na colheita total, com alta de quase 30% ante 2021, na expectativa da segunda safra, que responde pela maior parte da oferta nacional.
O consultor do Itaú BBA alertou que a necessidade de repasse das despesas é uma notícia negativa para o setor, pois o início de ano é sazonalmente mais “fraco” para os preços e consumo de carnes.
O presidente da ABPA, Ricardo Santin, disse, por sua vez, que a indústria de aves e suínos procurou antecipar compras de grãos, reduzindo a dependência de negociações no mercado spot (à vista) e também inseriu cereais de inverno em suas programações de compra para alimentação animal, como o trigo.
Além disso, as empresas do setor continuam olhando para importação como uma forma de complementar a oferta.
Na terça-feira, a Conab ainda elevou a projeção de importação de milho pelo Brasil para 1,3 milhão de toneladas em 2021/22, versus 900 mil na previsão de dezembro. Na safra passada, diante de uma quebra mais acentuada na colheita, as compras no exterior somaram 3,2 milhões de toneladas.
Santin também descartou a hipótese de ajuste na produção de aves para controle de margens, pois vê demanda aquecida devido à substituição de proteínas de valor mais alto pelas mais acessíveis, como frango e ovo.
Fonte: Reuters