Escola da Fazenda Canuanã, em Formoso do Araguaia, Tocantins, projeto do designer Marcelo Rosenbaum, em conjunto com Aleph Zero Arquitetura, recebe o prêmio de Melhor Edifício de Arquitetura Educacional do mundo
por Isabela Palhares, O Estado de São Paulo
Dos 7 aos 17 anos, 780 alunos passam as 24 horas do dia dos sete dias da semana na escola. É nesse ambiente que estudam, brincam, fazem as refeições e dormem. Ainda assim, eles tinham dificuldade de chamar esse espaço de casa. Inaugurada há 44 anos, a escola da Fazenda Canuanã, na zona rural de Formoso do Araguaia, a 320 km de Palmas (TO), atua em regime de internato para acolher estudantes de localidades ainda mais afastadas.
A preocupação em transformar a escola em um lar fez com que a instituição, mantida pela Fundação Bradesco, ficasse conhecida com a construção das Moradias Infantis, um novo alojamento para os alunos, que recebeu o prêmio de Melhor Edifício de Arquitetura Educacional do mundo, da premiação Building Of The Year.
Os professores e a direção da escola sentiam a necessidade de proporcionar um ambiente com mais individualidade e privacidade para as crianças, já que eles se dividiam em quartos com 20 beliches e 40 estudantes. Para pensar um novo modelo de moradia, a fundação convidou o Instituto a Gente Transforma, do designer Marcelo Rosenbaum. “Nossa responsabilidade nesse projeto era fazer com que essas crianças não tivessem mais a sensação de que dormiam na escola. Tudo o que fizemos foi pensado para garantir a essas crianças a sua intimidade e privacidade”, conta o designer.
O projeto começou ouvindo as crianças para entender o que elas entendiam como necessário para transformar o dormitório em uma morada. “O que mais me tocou foi o consenso harmonioso entre eles. Os pedidos eram simples, o que eles mais pediam era que o prédio fosse mais fresco”, conta o designer. A região em que a escola está fica na faixa de transição entre o Cerrado, o Pantanal e a Floresta Amazônica, as temperaturas na região podem chegar a 38 ºC no verão.
Além de ouvir os alunos, Rosenbaum e os arquitetos do escritório Aleph Zero visitaram as casas das famílias para mapear elementos com potencial de gerar identificação e para solucionar os desafios impostos pelo clima da região.
“Visitamos populações ribeirinhas, caboclas e indígenas para fazer esse levantamento visual e cultural. A gente viu e explicamos a eles que a tecnologia existente no local, usada pelos pais e avôs deles, tem um ótimo desempenho e deve ser valorizada”, conta o arquiteto Pedro Duschenes.
Da conversa com os alunos, o projeto criou uma nova modulação para os quartos, que passaram a receber apenas seis crianças, divididos em dois pavilhões, um feminino e outro masculino. A construção usou painéis de palha trançada, tijolos de solocimento, chão de cimento queimado e madeira laminada.
“Também entregamos todo o mobiliário. Agora, cada criança tem seu próprio gavetão para guardar suas coisas, um abajur, um espelho. Em uma escola com tantos alunos, em que eles passam a maior parte do tempo de uniforme, é importante que eles tenham um momento em que possam enxergar e valorizar sua individualidade”, diz Marcelo.
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Os quartos foram entregues aos alunos no início de 2017 e, segundo Ricardo Figueiredo, diretor da escola, as mudanças foram significativas e sentidas rapidamente. “Elas estão muito mais tranquilos, passaram a valorizar o silêncio, cuidam muito da estrutura. Para muitas dessas crianças, é a primeira vez que eles têm um quarto já que a maioria mora com os pais em casas de apenas um cômodo”, diz.
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Bruno Santos, de 18 anos, saiu da casa dos pais aos sete anos para estudar no 2º ano do ensino fundamental na escola. “Sou o caçula de sete irmãos, fui o menino que mais chorou na primeira semana de aula de tanta saudade da minha mãe”, lembra. Agora, ele já não quer mais deixar a escola, onde nesse ano cursa o ensino técnico em agropecuária. “Tenho aqui tudo o que meu pai não poderia me dar, sempre foi a minha casa, mas melhorou muito no último ano. Antes eu só podia dormir quando apagavam a luz. Hoje, em dia, os meninos que moram no meu quarto são a minha família, a gente se respeita para cada um dormir e estudar na hora que quiser”.
Site sobre o projeto, clique aqui.