Uma pergunta que sempre fica é: “quem é o maior responsável pela garantia do fornecimento do leite, indústria ou produtor?”. Vamos tentar entender!
A relação entre produtor e laticínio é, como diria os especialistas, um casamento por “interesse”. Infelizmente, uma das maiores características dessa cadeia produtiva é a desconfiança ou melhor infidelidade.
De um lado, o pecuarista, que reclama da falta de condições adequadas para sua produção e a manutenção desse “casamento” – principalmente no que diz respeito ao preço recebido pelo leite. O produtor sempre corre para aquele que “paga mais”. Do outro, o laticínio, onde temos empresas que se comprometem na “fala”, a médio e longo prazo, com os produtores mas, basta o preço no mercado oscilar que ele pede o “divórcio”, sem qualquer respaldo para o produtor.
Não é mistério, para ninguém, que essa rotatividade de produtores é muito ruim para toda a cadeia. O fato do setor ser muito desconectado, é um peso para uma boa relação entre produtor e laticínio. Vamos pegar como exemplo a ligação entre os produtores de aves e suínos, onde esse setor tem uma “ligação” muito forte entre os fazendeiros e indústria, um via de mão dupla, entretanto isso não acontece no leite.
O fato é que, qualquer relação depende dos dois lados para dar certo. Mas, existe um consenso que essa perenidade está muito mais nas mãos dos laticínios, em criar políticas e condições para fidelizar o produtor, do que o oposto. Embora, a indústria também acabe se beneficiando com essas políticas – captação de leite com qualidade e volume com baixo custo. Precisamos entender, de uma vez por todas, que o produtor não visa apenas o preço recebido mas, também, os outros benefícios que tem a agregar como a assistência técnica e gerencial, preço mínimo e pagamento por qualidade.
Confira o depoimento do Deputado eleito, Amauri Ribeiro, exclusivamente para o Compre Rural, sobre a situação dos produtores de leite do Brasil:
Esse depoimento retrata a visão que o produtor tem dessa relação com o laticínio.
Garantias
Toda relação requer garantias. O produtor quando começa a gerenciar sua propriedade como uma empresa rural, ele começa a fazer projeções a longo prazo de investimentos necessários para seu planejamento. Entretanto, ele precisa do laticínio uma sinalização do comportamento da cotação ao longo dos meses, e esse é um fator cobrado por 90% dos pecuaristas para fidelização. Não há planejamento/investimento que possa ser feito sem saber o que irá acontecer daqui 30 dias, o produtor de leite é um dos únicos que vende sem saber o que irá receber.
“O criador precisa saber com antecedência o que vai acontecer com o preço do leite. Se o laticínio passa essa projeção, é uma forma de estimular um fornecimento regular e fel, pois o fornecedor se sente mais seguro”, explica o chefe-adjunto da Embrapa, André Novo, assinalando, porém, que o que predomina ainda é a “falta de comunicação” entre as partes.
O Compre Rural, trouxe uma matéria muito interessante sobre o tema: Produtor/Laticínio: Quem precifica nosso leite de cada dia?.
Sob este aspecto, a pesquisadora Rosana de Oliveira Pithan e Silva, do Instituto de Economia Agrícola (IEA- -Apta), elogia a iniciativa do Conselho Paritário Produtores/Indústrias de Leite do Estado do Rio Grande do Sul (Conseleite-RS), que projeta, mensalmente, o valor do litro pago ao produtor. “Eu acredito muito nesse sistema”, diz Rosana. “A cotação fica transparente pra todo mundo, com planilha, cálculos e um valor de referência que auxilia muito o produtor a se planejar. Esta é a melhor saída, pela previsibilidade que dá a ambas as partes.”
Enquanto o laticínio não entender que, pagando por qualidade, ele não estaria só fidelizando o produtor, mas também garantindo uma matéria-prima de qualidade e com maior rendimento na indústria, será uma relação de “cabo de guerra”. Precisamos mudar o cenário de “quantidade” para “qualidade”, de uma forma que os dois lados estejam ganhando.
Se não unirmos a cadeia, seremos engolidos pelas importações de leite
Outros fatores que contribuem para fomentar a cadeia leiteira também passam pela iniciativa dos laticínios – queira ou não, o elo mais forte. “A indústria pode estimular, por exemplo, produtores de uma mesma região a formarem grupos de consumo para adquirir insumos como ração, fertilizantes e medicamentos veterinários”, sugere Resende, da Embrapa Gado de Leite. A compra em maior quantidade é uma garantia de menor preço dos insumos, com uma consequente redução nos custos de produção.
Questionamentos
A fidelização das partes, laticínio e produtor, depende de alguns questionamentos que devem ser respondidos de forma “amigável”. Sabemos que não é só o produtor que é “infiel”, na maior parte das vezes a indústria, para atender as suas necessidades, prefere buscar leite mais longe do que auxiliar o produtor que está do seu lado. Entenda:
- De que tipo de leite a indústria precisa? Se ela precisa de um leite de alta qualidade, ela precisa dar condições para que o produtor atinja esse patamar de produção. Prestação de assistência técnica, pagamento por qualidade ou o que for necessário.
- O produtor precisa de um melhor preço, com previsão da cotação, pelo leite entregue? Se o produtor luta por isso, ele precisa fazer seu papel dentro da porteira, garantir a qualidade do leite, aceitar opiniões dos técnicos, utilizar tecnologia e, principalmente, utilizar gestão da sua empresa rural.
Fidelização
Garantir que um cliente seja fiel é o maior sonho de toda indústria. Entretanto essa questão, dentro da cadeia do leite, é algo que não está longe de ser alcançado, desde que as partes estejam engajadas para isso.
A utilização de contratos, com tempo mínimo de duração, é uma forma eficaz de conseguir iniciar uma transparência nessas negociações. As clausulas devem ser claras e abranger os dois lados da relação, produtor e laticínio. Utilizar os serviços que o laticínio tem a oferecer ao produtor, além da previsão do preço que será pago pela matéria-prima. O produtor, por sua vez, deve ficar fidelizado ao laticínio, garantindo o volume a ser entregue com a qualidade exigida.
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Inúmeros são os casos em que esse tipo de contrato tem feito efeito positivo em toda a cadeia produtiva, como na pecuária de corte com os contratos futuros, na produção de aves e suínos com a fidelização através de contratos, dentre outros.
Chegou a hora de acabar com essa discussão e separação dos elos da cadeia. É preciso que cada um assuma o seu papel e faça sua parte para manter o mercado abastecido com o nosso produto, ou seremos engolidos pelas grandes importações que vem sendo feita.
**Foram procurados inúmeros laticínios para poder falar sobre o seu lado desse casamento. Entretanto, até o momento da publicação dessa matéria, nenhum quis se manifestar sobre o assunto. Fica aberto o canal para podermos divulgar, caso algum tenha interesse.