Empresas como Illycafé, Lavazza e Starbucks investem para expandir a produção em locais como Cuba, Peru, Uganda, Ruanda, entre outros; Diante disso, segundo a Bloomberg, a produção de café avança em outros países como alternativa ao domínio do Brasil
Bloomberg — O café do Peru, da Tailândia e de outros países produtores menores [menor produção de café comparada ao Brasil] costumava ser um luxo para consumidores exigentes apreciadores da bebida que buscam grãos mais exóticos. Agora, em um mundo em aquecimento, ele pode ser fundamental para o futuro do setor.
Cerca de 40 países cultivam café, mas mais da metade da produção global vem de apenas dois: Brasil e Vietnã. E quando o mau tempo atinge ambos – um risco crescente em um clima desestabilizado -, os preços sobem. No Estados Unidos, por exemplo, a seca que atingiu os dois países fez o preço dos lattes subir a US$ 9.
O cenário tem dado um novo impulso aos investimentos no setor cafeeiro em outros países, de Cuba a Ruanda. Há claramente um mercado, já que muitos consumidores buscam grãos de origem incomum. E o setor, que passa por uma consolidação, tem necessidade de uma cadeia de suprimentos mais diversificada.
“Há uma urgência agora. Este ano prova que o impacto da mudança climática não pode ser subestimado”, disse Andrea Illy, CEO da Illycaffe, em uma entrevista. “Isso começa a mudar o próprio mercado.”
A empresa familiar Illycaffe, fundada em 1933, voltou a operar em países do leste e do sul da África, de onde costumava comprar grãos, e tem expandido a aquisição de produtos fora do Brasil e do Vietnã.
Em maio, a comerciante de café Volcafe obteve um financiamento de US$ 60 milhões para impulsionar as operações na África Oriental.
A Starbucks (SBUX) tem distribuído mudas e investido em empréstimos para produtores no Peru, Ruanda e Tanzânia.
A empresa europeia de torrefação de café Lavazza está no meio de um projeto de 20 anos para ajudar a ressuscitar o setor cafeeiro de Cuba, que desapareceu após a Revolução Cubana na década de 1950.
A Nespresso, da Nestlé, anunciou um investimento de US$ 20 milhões no setor cafeeiro da República Democrática do Congo no início deste ano.
A empresa já gastou 60 milhões de francos suíços (cerca de US$ 71 milhões) nos últimos cinco anos como parte de seu programa Reviving Origins, que visa restaurar a produção de café em áreas como Uganda, Zimbábue e Cuba.
“Preservar a produção de cafés requintados de circunstâncias adversas, como conflitos, desastres econômicos ou ambientais, e garantir um futuro para os agricultores que os produzem é uma parte fundamental de nossos negócios”, disse um porta-voz da Nespresso.
Nada disso deve reduzir os preços finais nas cafeterias, pelo menos não tão cedo. Os países produtores menores não têm as economias de escala do Brasil e do Vietnã, muitas vezes dependendo de fazendas familiares que fazem a colheita manualmente.
A eficiência de produção – e os preços mais baixos que ela proporciona – é o que levou o setor a depender tanto do Brasil e do Vietnã, em primeiro lugar.
Mas os consumidores de hoje estão mais dispostos a pagar mais por cafés de alta qualidade e de produção pequena, disse Peter Radosevich, chefe de vendas internacionais da importadora Royal Coffee, com sede na Califórnia.
Desde que o consumo de café passou a ser feito com mais frequência em casa durante a pandemia da covid-19, os consumidores têm sido “mais exigentes e demandam mais qualidade”, bem como variedade e rastreabilidade, disse ele.
Há muito tempo, os produtores menores são associados ao café “especial” – grãos com maior pontuação em qualidades que vão desde a fragrância até o sabor residual.
Um relatório de junho da National Coffee Association constatou que quase metade dos adultos americanos agora consome café especial diariamente, superando pela primeira vez as opções do mercado de massa.
A mudança dos cafés de coador para bebidas à base de café expresso levou os consumidores a pensar mais sobre o sabor de sua xícara diária, disse Xavier Alexander, cofundador da Metric Coffee, sediada em Chicago, que adquire grãos em países como Peru e Honduras.
Os países de pequena produção têm colhido os benefícios. Honduras, por exemplo, tem aumentado a produção de café, embora os agricultores também tenham enfrentado margens mais apertadas com o aumento dos custos de produção, disse Miguel Pons, presidente executivo da associação de exportadores de café do país.
Esses países ainda são um pequeno subconjunto da oferta mundial, mas a produção tem aumentado “porque é considerada muito mais lucrativa para os agricultores em geral”, disse Praewa Boonyawan, produtor da Thabdheva Thapthai no norte da Tailândia. “Certamente há uma demanda maior por parte do consumidor.”
Para manter o ritmo, no entanto, as empresas de café precisarão continuar agregando valor para os clientes. Além disso, devem promover o fornecimento direto e a sustentabilidade, ou enfatizar as interações humanas e personalizadas que ocorrem quando se vai a uma cafeteria da velha guarda, segundo Matthew Barry, gerente de insight para alimentos e bebidas da empresa de pesquisa Euromonitor International.
Caso contrário, os consumidores podem optar por bebidas mais econômicas e “fáceis”, como o café frio e enlatado, disse Barry. “Fazer compras em supermercados é estressante hoje em dia”, disse ele. “Comprar seu café não deveria ser.”
É provável que os preços mais altos ao longo de toda a cadeia de suprimentos permaneçam. Se os preços caírem, os pequenos agricultores terão menos incentivo para cultivar café – o que acabará reduzindo a oferta e fazendo com que os preços voltem a subir, disse Jay Kling, diretor de café da Irving Farm New York.
“Sinceramente, espero que o preço do café permaneça alto a longo prazo, porque é disso que o setor precisa no momento”, disse ele.
Conteúdo originalmente publicado pela Bloomberg, em material com a colaboração de Dayanne Sousa, Mumbi Gitau e Fred Ojambo
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