Presidente do Banco do Brasil descarta crise no setor agropecuário

Tarciana Medeiros rejeita a ideia de uma ampla repactuação de dívidas rurais no Rio Grande do Sul e comemora a projeção de recordes nos empréstimos para a safra 2024/25.

“A análise dos desafios climáticos e da volatilidade nos preços das commodities impactando as fazendas neste ano permanece incerta”, refletiu Tarciana Medeiros, presidente do Banco do Brasil, ao abordar as projeções para a safra 2024/25. Em uma entrevista exclusiva, Medeiros enfatizou: “Não podemos rotular a situação atual como uma crise no setor agrícola.”

Sobre a redução dos custos de produção e seu efeito na necessidade de crédito, a executiva destacou que “mesmo com custos menores na safra anterior, não houve uma diminuição na demanda por crédito.” Ela também opinou que a estabilidade das taxas de juros, ao invés de um corte mais profundo solicitado pelo setor, e o fortalecimento do dólar, não devem desencorajar os produtores de buscar financiamento. O Banco do Brasil anunciou planos de liberar um montante recorde de R$ 260 bilhões para o ciclo 2024/25.

“Em busca de recuperar sua participação perdida na oferta de recursos com subvenção direta da União, o Banco do Brasil planeja aumentar sua distribuição para mais de 40% dos R$ 138,2 bilhões em recursos equalizados”, revelou Tarciana Medeiros, presidente da instituição. “No início da safra 2023/24, nossa fatia era de 25%, mas após ajustes estratégicos, conseguimos alcançar 37% ao final do ciclo.”

Sobre a gestão das dívidas rurais no Rio Grande do Sul, Medeiros descartou a necessidade de uma reestruturação ampla. “Nossa abordagem será avaliar cada caso individualmente”, afirmou. O Banco do Brasil também tomou a decisão de suspender temporariamente a cobrança de R$ 4,5 bilhões em parcelas de empréstimos concedidos aos produtores, medida válida até 14 de agosto.

“A carteira de crédito agrícola da empresa, líder destacada nesse segmento, totalizou R$ 372,5 bilhões até março deste ano. Quanto à inadimplência do crédito rural, que era de 0,47% em junho de 2022, aumentou para 1,19% no primeiro trimestre de 2024. Segundo a porta-voz da instituição, o aumento da inadimplência reflete uma ‘acomodação’ do índice, que estaria retornando aos níveis pré-pandemia. Ela destacou que a inadimplência está ‘dentro da normalidade’. ‘Não vemos um aumento no risco no setor agrícola’, afirmou. No entanto, mencionou que eventos como as enchentes no Rio Grande do Sul, a seca na Amazônia e os recentes incêndios no Pantanal ‘causam preocupação’ e mantêm as instituições financeiras vigilantes quanto ao impacto das mudanças climáticas sobre o setor.”

“Medeiros destacou que o banco já observa benefícios tangíveis do novo marco de garantias na concessão de crédito, especialmente para a compra de veículos. A medida foi sancionada pelo governo no ano passado. ‘Estamos vendo um aumento nos desembolsos que não víamos há bastante tempo’, afirmou.

Ela adiantou à equipe de reportagem que, até sexta-feira (12/7), o Banco do Brasil pretende registrar R$ 1 bilhão em dívidas renegociadas através do programa Desenrola Pequenos Negócios, destinado a microempreendedores individuais (MEIs), microempresas e pequenas empresas.”

Aqui estão os principais pontos da entrevista.

“Como o banco visualiza a safra 2024/25?

” Tarciana Medeiros respondeu: “Houve muita conversa este ano sobre uma crise no setor agrícola, mas sempre mantive um otimismo sólido em relação ao setor. Tivemos safras recordes recentemente. Esperamos que a safra 2023/24 seja a segunda melhor da história, apesar da redução na produção de soja. Não vejo uma crise no agronegócio. Temos observado preços mais estáveis, e os produtores têm reservado parte da safra para aguardar a estabilização dos preços. Houve desafios climáticos significativos este ano, mas eles ocorreram após a colheita. Estamos bastante otimistas em relação a 2024/25. Não estaríamos liberando R$ 260 bilhões se não houvesse uma expectativa concreta de crescimento na safra deste ano.”

“Como o banco está se preparando para enfrentar eventos climáticos extremos?”

Tarciana explicou: “O banco conta com a maior seguradora da América Latina especializada em agronegócio. Utilizamos diversos modelos de risco da seguradora e de parceiros internacionais de resseguro para garantir a disponibilidade de seguros, mesmo em áreas afetadas por intempéries. O custo do seguro está diretamente relacionado ao risco, mas estabelecemos parcerias com consórcios de resseguradoras para assegurar que o preço seja acessível para os produtores. Embora a subvenção ao prêmio seja sempre bem-vinda, temos capacidade de operar de forma previsível mesmo sem aumento na subvenção. Mais de 70% da nossa carteira de crédito possui algum tipo de mitigação de risco. Para nós, é fundamental estar preparados para possíveis quebras de safra.”

“Mesmo no caso do Rio Grande do Sul?

” Tarciana respondeu: “Não há modelo de risco que possa prever o que aconteceu lá. Ainda estamos monitorando as informações dos produtores. Grande parte da safra já tinha sido colhida e muitos produtores estavam bem capitalizados, necessitando de menos recursos do banco.”

“Sobre as dívidas no Rio Grande do Sul, será necessário lançar uma ação de renegociação ampla ou algo mais específico?” Tarciana explicou: “A ideia de renegociação ainda é específica, limitada às áreas onde sabemos com certeza que as perdas são irreparáveis. Até 15 de agosto, temos R$ 4,5 bilhões em dívidas prorrogadas no Banco do Brasil, e dispomos de R$ 1,9 bilhão em

linhas de crédito emergenciais para pequenos e médios produtores. Esses R$ 4,5 bilhões são significativos, mas, devido à nossa vantagem de operar em todo o país, nosso risco é bem diversificado.”

“Tarciana analisa a situação atual do crédito para a próxima safra, considerando o histórico recente de desembolso recorde de R$ 230 bilhões. ‘A safra passada já apresentava custos de produção mais baixos que os de 2022/23. Mesmo com essa queda, a demanda por crédito no primeiro semestre deste ano não diminuiu. Esperamos uma possível estabilização da demanda para 2024/25.’

Quanto ao impacto do dólar, Tarciana observa: ‘A maioria dos produtores rurais já está acostumada com a variação cambial. Na agricultura familiar, os preços dos produtos são predominantemente nacionais. O risco de a flutuação do dólar afetar a demanda por crédito é bastante improvável.'”

Por que os juros do crédito não diminuíram?

“Tarciana: Até o fechamento do primeiro trimestre, tínhamos uma expectativa de Selic em 9% no fim do ano e em até 8,5% em 2025. Não houve corte na Selic nem nos juros dos Estados Unidos, e o dólar subiu no mundo todo. Isso é precificado para nós e para o custo do governo. A manutenção das taxas de juros, levando em consideração o cenário de elevação dos juros futuros, foi uma vitória muito grande.”

Como vai ficar a participação do BB na divisão dos recursos equalizáveis na safra 2024/25?

“Tarciana: O regramento de distribuição dos recursos foi aprimorado para que não falte dinheiro no Banco do Brasil. Para nós, levou-se em consideração, por exemplo, a capilaridade e capacidade de distribuição de recursos. No ano passado, tivemos, inicialmente, 25% dos recursos equalizados, abaixo do que recebíamos historicamente. Ao longo do Plano Safra, com recursos devolvidos por outras instituições, alcançamos quase 40% do total. Distribuímos 100% dos recursos equalizados que recebemos. Para 2024/25, temos boa expectativa [de receber] recursos condizentes com essa capacidade. Estou aguardando acima de 40% dos recursos equalizados.”

Como está a participação das Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) no crédito rural do BB?

“Tarciana: Está na mesma média do ano passado. Ainda não tivemos variação de investimento da LCA. A regra de exigibilidade de 50% de aplicação desses títulos mantém um conforto, porque a nossa LCA é aplicada no setor. Como o Plano Safra cresceu de um ano para o outro, vamos aumentar a oferta de recursos livres também. Tem uma boa carteira aplicada em Cédula de Produto Rural (CPR), mas isso representa cerca de 15% da carteira [R$ 37,6 bilhões]. É um instrumento leve, adequado, digital. Alguns clientes têm preferência por esse papel, dada a simplicidade na contratação.”

Qual é a tendência para a inadimplência no agro?

“Tarciana: A curva de inadimplência do agro se elevou. Isso representa uma acomodação nos níveis pré-pandemia, uma curva de normalização. Não considero uma elevação de risco no agro.”

Essa normalização a níveis pré-pandemia pode se replicar em outros segmentos?

“Tarciana: Com certeza, principalmente para a pessoa jurídica. Na pessoa física, já houve acomodação, até porque sua linha acaba se renovando em prazo menor. A pessoa jurídica ainda está em processo de normalização pré-pandemia, assim como o agro e as micro e pequenas empresas.”

A inadimplência na pessoa jurídica recuou em relação a dezembro do ano passado e estava em 3,19% em março. O índice vai ficar nesse patamar ou deve subir?

“Tarciana: Antes da pandemia, ela estava em torno de 3,2%. Acredito que qualquer variação em torno de 3,5% é normal. Não é nada que nos cause preocupação.”

Já é possível perceber algum efeito das medidas que o governo adotou no ano passado, como o marco de garantias, sobre a concessão de crédito?

“Tarciana: Sim. Tivemos uma elevação no crédito para [compra de] veículos. Agora, está mais fácil buscar e executar a garantia do que antes. No agro, ficou mais simples pegar como garantia a propriedade, e a execução da garantia também ficou mais simples. Mas, no financiamento de veículos, principalmente, o desembolso aumentou como não acontecia há um bom tempo.”

Para alguns analistas, com o cenário macro não muito favorável e a interrupção dos cortes na taxa Selic, o Banco do Brasil chegou ao seu pico de rentabilidade. Como a senhora avalia?

“Tarciana: Estamos trabalhando para entregar o ‘guidance’ [metas] com que nos comprometemos com o mercado, principalmente no crédito, que é o nosso ‘core’. Temos uma estratégia de longo prazo, então há evoluções, principalmente na transformação digital, que vai entregar eficiência em algumas linhas. Não vou afirmar que vamos bater recorde, mas se [os resultados] forem recorde, será uma consequência dessa estratégia.”

O presidente Lula tem cobrado dos bancos a ampliação da concessão de crédito a pequenos e médios. Qual a situação no BB?

“Tarciana: Neste ano, houve R$ 91,7 bilhões de crédito para pessoas jurídicas até junho, com mais de 165 mil empresas atendidas. No capital de giro, a principal linha para pequenos e médios, foram R$ 46,8 bilhões, para mais de 132 mil empresas. Um tempo atrás, o banco teve problema nas MPEs, mas reconstruímos a carteira com acompanhamento de evolução financeira dos clientes, o que permite pulverizar o crédito e diminuir o risco. Conseguimos [melhorar o índice de] inadimplência e recuperar o crescimento da carteira.”

Ainda há estoque para ampliar o Desenrola Pequenos Negócios?

“Tarciana: Temos, principalmente por meio da Ativos S.A. No banco, desde ano passado, já tínhamos um Desenrola para micro e pequenas empresas, e recuperamos muito em 2023. Da carteira ativa, há menos possibilidade de crescimento [adicional], mas [o crescimento] será mais por meio da Ativos S.A. Até sexta-feira, devemos alcançar R$ 1 bilhão de dívidas renegociadas de pequenos e médios.”

Qual é a sua avaliação sobre o impacto dos problemas climáticos e da queda dos preços das commodities sobre os resultados das fazendas neste ano?

“Tarciana: ‘Não há que se falar em crise no agro’, disse ela, categórica, em entrevista exclusiva à reportagem. O impacto é uma incógnita, mas, ainda assim, a produção agropecuária deverá bater novo recorde na safra 2024/25.”

A queda dos custos de produção não deverá afetar a demanda por crédito nesta temporada?

“Tarciana: ‘O custo já tinha sido menor na safra passada, e a demanda não caiu’, disse ela. Ela acredita que a manutenção dos juros — e não um corte mais profundo, como queria o setor produtivo — e a alta do dólar também não afetarão a busca por financiamentos.”

O BB anunciou que vai liberar R$ 260 bilhões no ciclo 2024/25, um recorde. Como a instituição pretende retomar parte da fatia perdida na oferta de recursos com subvenção direta da União?

“Tarciana: O banco prevê distribuir mais de 40% dos R$ 138,2 bilhões em recursos equalizados. No início da safra 2023/24, a fatia do BB chegou a ser de 25%, mas, após remanejamentos, a participação alcançou 37% no fim do ciclo.”

Tarciana Medeiros descartou a necessidade de uma ampla repactuação de dívidas rurais no Rio Grande do Sul. O banco pretende avaliar caso a caso. Qual é a posição do BB sobre esse assunto?

“Tarciana: Em vez de uma ampla repactuação, estamos avaliando cada caso individualmente. O BB suspendeu, até 14 de agosto, a cobrança de R$ 4,5 bilhões de parcelas de empréstimos a produtores.”

A inadimplência do crédito rural subiu de 0,47% em junho de 2022 para 1,19% no primeiro trimestre deste ano. Como a presidente do BB avalia esse aumento?

“Tarciana: O aumento da inadimplência é resultado de uma ‘acomodação’ do índice, que está retornando aos níveis pré-pandemia. A inadimplência está dentro da normalidade. Não vemos elevação de risco no agro.”

Como o BB está lidando com episódios recentes como as enchentes no Rio Grande do Sul, a seca na Amazônia e as queimadas no Pantanal em relação ao setor agropecuário?

“Tarciana: Episódios como esses ‘assustam bastante’ e colocam as instituições financeiras em alerta para o impacto das mudanças climáticas sobre o setor. Estamos monitorando de perto essas situações.”

Quais são os efeitos positivos que o Banco do Brasil já está sentindo do novo marco de garantias sobre a concessão de crédito?

“Tarciana: O banco já percebeu impactos positivos significativos do novo marco de garantias, especialmente na concessão de crédito para a compra de veículos. O governo sancionou essa medida no ano passado e desde então tivemos uma elevação de desembolso que não víamos há bastante tempo.”

O BB vai registrar R$ 1 bilhão em dívidas renegociadas até sexta-feira (12/7) no programa Desenrola Pequenos Negócios. Como está sendo o desempenho desse programa voltado aos microempreendedores?

“Tarciana: Até sexta-feira, estaremos registrando R$ 1 bilhão em dívidas renegociadas no âmbito do programa Desenrola Pequenos Negócios, destinado aos MEIs, microempresas e empresas de pequeno porte. É uma iniciativa que visa apoiar esses segmentos durante esse período desafiador.”

Escrito por Compre Rural

ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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