Por que não tem rodeio nas Olimpíadas?

Conheça os motivos por que o rodeio não está nas Olimpíadas; o rodeio já fez parte das Olimpíadas, mais de uma vez; confira análise completa de especialista do esporte

Por Abner Henrique Therézio – Com os Jogos Olímpicos de Tóquio em evidência na televisão e nas redes sociais nas últimas semanas, uma pergunta antiga volta a mente dos fãs de Rodeio: Por que não tem Rodeio nas Olimpíadas? O questionamento é válido, porém, há uma explicação para isso e vamos tentar responder esta questão nesta matéria exclusiva onde o assunto será exposto pela primeira vez para o público brasileiro. Artigo produzido pela Rodeio S.A.

Mas o que muita gente também não sabe e abordaremos nesta matéria é que já houve competição de Rodeio em Jogos Olímpicos sim e vamos contar como ocorreu, assim como também vamos buscar explicar por que não tem montarias nas Olímpiadas em 2021 e por que certamente não haverá tão cedo.

Os fãs de Rodeio, em especial os que tem o Rodeio como esporte favorito sempre trazem este questionamento ou esta revolta, de o por que não “colocarem Rodeio nas Olímpiadas”. Mas, apesar do Rodeio – principalmente a Montaria em Touros – ser um dos esportes mais vitoriosos do Brasil, não basta apenas isso para “nos notarem” e nos colocarem nos Jogos Olímpicos.

E claro, esta “dor” não é apenas do Rodeio. Muitos outros esportes passam por isso e estão longe de um dia serem integrados ao calendário do evento esportivo mais importante do mundo, enquanto outros tantos, que as vezes consideramos “desconhecidos” e até irrelevantes, estão lá. Por isso, vamos explicar ponto à ponto aqui e talvez acabar de vez com este questionamento, pelo menos daqueles que irão entender que as Olímpiadas não são obrigadas a ter Rodeio apenas por que nós gostamos de assistir. É preciso um pouco mais do que a nossa vontade.

O que é preciso para ser um esporte Olímpico?

Para uma modalidade esportiva se tornar Olímpica, ou seja, fazer parte oficialmente dos Jogos Olímpicos, depende de uma série de fatores que vão desde requisitos técnicos, popularidade, importância, relevância, organização nos países em que é disputada, entre outros tantos. Em resumo, só esportes globais conseguem unir estes fatores e como vamos explicar mais abaixo, infelizmente o nosso querido e amado Rodeio não é um esporte global.

Mas para não haver dúvidas detalhamos à seguir alguns desses fatores e ao ler, mentalmente você já pode decifrar se o Rodeio é capaz de preencher ou não estes requisitos.

Ser reconhecido pelo COI: quer dizer basicamente que o COI – Comitê Olímpico Internacional, entidade que organiza os Jogos Olímpicos, entende que a atividade é de fato um esporte.

Ter uma Federação Internacional reconhecida pelo COI: é preciso que o esporte tenha uma Federação Internacional específica que reúna as Federações de diversos países, em um exemplo prático, algo como a FIFA, entidade que comanda o futebol profissional no mundo todo.

Número mínimo de países onde é praticado: deve ser praticado amplamente, tendo muitos adeptos e diversas competições anuais em pelo menos 75 países de quatro continentes diferentes, para modalidades masculinas e pelo menos 40 países de três continentes, para modalidades femininas.

Porém, apenas preencher estes requisitos não basta para se tornar um esporte Olímpico oficialmente, há esportes que atendem estas exigências, mas você não os verá nos Jogos. Isto por que o COI limita a quantidade de modalidades esportivas presentes no seu evento e atualmente para um novo esporte entrar, outro tem que sair.

Para isso, a entidade avalia constantemente os esportes, tanto nos Jogos Olímpicos, quanto fora deles, podendo substituí-lo caso perca relevância e popularidade. Obviamente, este é um processo complexo e demorado, assim como também é o processo para se tornar um novo esporte Olímpico substituindo um que perdeu popularidade. Dá pra imaginar que esta fila não é pequena.

Um caminho “mais curto” no passado eram os “esportes de exibição” ou “esportes de demonstração”, que eram inseridos pelo COI em uma ou mais edições dos Jogos devido a sua importância no país que fosse sediar as Olímpiadas ou o seu crescimento mundial. Por conta da complexidade de todo esse processo e para “enxugar” a programação dos Jogos Olímpicos o COI deixou de inserir esportes de exibição na década de 90, ficando na programação somente os “esportes oficiais”.

Recentemente o COI definiu que à partir dos Jogos Olímpicos de 2020, o comitê organizador local pode sugerir esportes que serão inseridos na programação do evento e a entidade escolhe cinco entre os esportes sugeridos para serem realizados somente naquela edição, obviamente, que esta decisão precisa ser feita com muita antecedência. Surfe e Skate, por exemplo, que estrearam na atual edição dos Jogos Olímpicos foram sugeridos pelos japoneses e só permanecerão na próxima edição porque também foram sugeridos pelo comitê organizador de Paris, mas não se tornaram ainda de fato, esportes olímpicos.

Para os Jogos Olímpicos de 2016, realizados no Rio de Janeiro o COI ainda não havia implantado esta opção de sugestão dos organizadores locais, sendo realizados apenas os esportes que já eram oficiais. Será que se na época houvesse esta opção o Rodeio seria lembrado e inserido a programação das Olímpiadas? A resposta é não e a explicação também está logo mais abaixo.

Enfim, agora você já sabe por que os esportes que você não gosta fazem parte das Olímpiadas e o Rodeio ainda não chegou lá. Talvez, ao ler os parágrafos acima você já entendeu que o Rodeio não se encaixa em nenhum dos requisitos e agora sabe por que não teremos nosso “esporte caipira” nos Jogos Olímpicos pelos menos nas próximas décadas. Porém, caso não esteja convencido, continuamos abaixo e agora vamos mostrar a realidade do “nosso esporte”.

Por que afinal, não tem rodeio nas Olimpíadas?

Se você foi paciente de ler cada linha acima, te convido para a discussão “assustadora” de o por que o Rodeio não será um esporte olímpico a curto e médio prazo, ou até mesmo, por que provavelmente não o veremos nem como “esporte de exibição”.

Primeiro, por mais que amamos o Rodeio é preciso admitir que ele não é global. Apesar da Montaria em Touros hoje ser um dos esportes mais populares nos Estados Unidos, que é o maior mercado esportivo do mundo, a modalidade mais radical das arenas e principalmente as demais modalidades de Rodeio tem um alcance limitado além das fronteiras dos poucos países que as realizam com mais frequência.

Hoje podemos dizer que apenas seis países no mundo realizam Rodeios de forma ampla, com grande frequência e contando com um bom número de praticantes, são eles: Estados Unidos, Brasil, México, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Ainda podemos citar vários eventos de Montaria em Touros ou Cavalos e/ou Provas Cronometradas realizados com mais frequência em países como a Guatemala, Costa Rica, Paraguai, além de competições de alguma das modalidades registradas em pelo menos outros dez ou quinze países na América Latina, África e Europa.

Nesse ponto devemos abordar também a complexa discussão sobre a definição de quais modalidades pertencem ao “esporte Rodeio”. Em países como a Itália, onde há provas de Três Tambores regularmente, poderíamos considerar que há Rodeio? As Montarias em Cavalos no estilo xucro realizados frequentemente no Uruguai e Argentina, são uma modalidade do “nosso Rodeio”? Quais modalidades de Rodeio seriam disputadas nos Jogos Olímpicos considerando que somente os seis primeiros países citados acima realizam competições em mais de quatro ou cinco estilos diferentes?

Ai já entra um grande problema de identidade para nós: definir quais são as modalidades oficiais do “esporte Rodeio” e o que fazer com os países que não realizam todas elas? A PBR – Profissional Bull Riders, atualmente tem competidores filiados de oito países diferentes, então seria justo somente a Montaria em Touros nas Olímpiadas com representantes somente destes países e ligados somente a PBR?

E se o parâmetro fosse a PRCA – ProRodeo Cowboys Association, a maior e mais antiga entidade do Rodeio mundial que realiza oficialmente oito modalidades, como ficariam os países que não realizam todas elas? Isso sem contar que o Cutiano, só disputado no Brasil, também não teria espaço em uma Olímpiada, por falta de atletas de outros países. “Quem esse COI pensa que é pra deixar de fora a nossa tradição”, seria um comentário bem comum nas redes sociais.

Com tudo isso nem é preciso explicar que o Rodeio não tem uma Federação Internacional e dificilmente terá, já que nem as nacionais existem. As principais entidades dos Estados Unidos, México, Canadá, Austrália e Nova Zelândia são associações particulares e não “mandam” no esporte de seu país, como acontece com outros esportes, elas apenas “mandam” nos eventos que fazem parte de sua entidade. Assim, qualquer entidade mundial que fosse criada – se fosse, não teria a mesma validade de outros esportes, devido ao sistema organizacional do Rodeio ser diferente.

E não para por aí… ainda tem mais!

Outro ponto polêmico que é uma “pedra na nossa bota” é que o conceito esportivo do Rodeio é relativamente novo, de três ou quatro décadas nos Estados Unidos e bem mais recente em nosso país. Historicamente as competições acontecem na maioria das vezes em qualquer um dos países dentro de eventos com perfil cultural, como exemplo, Festa do Peão ou Feira Agropecuária no Brasil. E por mais dolorido que seja dizer isso, o COI jamais reconheceria como uma competição esportiva uma atividade realizada dentro de um evento deste, que tem uma diversidade de atrações em volta, geralmente sem relação com a ação do esporte.

Bom, mas já que analisando estes pontos demoraria um século para o Rodeio se tornar global, que tal se usarmos o caminho mais curto, de um dia sermos um “esporte de exibição”? Nesse caso ainda precisaríamos quebrar todas as barreiras descritas acima, mostrar que o Rodeio é de fato importante para o mundo dos esportes e não apenas para nós de dentro dele, e entrar na fila. Um caminho que “dependeria da colaboração e vontade de quem está dentro”, então acho que essa frase já se explica por si só.

Analisando o mercado esportivo, nota-se que o processo para uma modalidade estar presente nas Olímpiadas envolve além dos dirigentes, praticantes e fãs, as empresas ligadas à ela, que fazem investimentos de todas as formas para ajudar o esporte crescer e justificar sua inclusão nos Jogos. Por exemplo, fabricantes de pranchas, skates, equipamentos, roupas e acessórios investiram no esporte e trabalharam muitos anos para que o Surfe e o Skate pudessem chegar nas Olímpiadas, tendo retorno com o que podem faturar com esse crescimento. Conseguem imaginar quantas empresas de produtos ligados ao Rodeio fariam isso, em especial no Brasil?

E por último, mas não menos complexo, precisamos falar do “detalhe” de que o Rodeio é realizado com animais e obviamente não é qualquer país que tem animais aptos para as competições de montarias e provas, da mesma forma que não é simples nem barato levar animais aptos de um dos países que realizam Rodeios regularmente. Ou seja, não é em qualquer edição dos Jogos Olímpicos que poderia ter Rodeio. Somando-se a isso, ainda teríamos a questão do ativismo contra o uso de animais em competições, que certamente causaria enormes protestos, uma dor de cabeça que não valeria a pena para os organizadores.

Para fechar, esclarecendo a questão “se era possível ter tido Rodeio no Rio 2016”, a resposta é obviamente NÃO! Mesmo que na época o COI já tivesse essa opção da organização local indicar um esporte, para o Rodeio ser aprovado teria que ter feito uma trabalho de muitos anos no Brasil, crescendo, se profissionalizando, se desenvolvendo e se justificando como um esporte de relevância para o país e ainda assim disputar a vaga com diversos outros esportes. Infelizmente, quando olhamos de dentro, com o amor pelo Rodeio, ele parece gigante e que o mundo não dá o devido valor, porém, apesar de sua importância, se comparado com outros esportes, ele é apenas mais um, em especial no Brasil, aceite você ou não.

E uma coisa que todos os fãs e principalmente quem trabalha com Rodeio precisa entender é que nem o COI e nem ninguém deve nada ao Rodeio. O reconhecimento que muitos esperam só vai acontecer quando a evolução substituir certas tradições que puxam o Rodeio para trás. Na real, o mercado esportivo no qual as Olímpiadas fazem parte não funciona de favor ou de compaixão, é preciso ser grande de fato fazer parte dele e infelizmente, repito, historicamente o Rodeio não é do tamanho que sonhamos que ele devia ser ou até que alguns pensam que é. E isso não se resolve da noite para o dia.

Mas, já teve rodeio nos jogos Olímpicos sim e mais de uma vez

Porém, apesar de tudo isso, podemos dizer que já houve Rodeio em Olímpiadas sim, mais precisamente nos Jogos Olímpicos de Inverno de 1988 e também nos de 2002. Os Jogos Olímpicos de Inverno são uma extensão das Olímpiadas principais, porém reservadas a esportes praticados no gelo e na neve, sendo realizados em um evento diferente devido as condições climáticas de alguns países que sediam os chamados Jogos Olímpicos de Verão, ou tradicionais.

Em 1988 o Rodeio fez parte dos Jogos realizados em Calgary no Canadá, contando com a participação de nomes como Lane Frost, Tuff Hedeman, Charmayne James, Lewis Feild, Joe Beaver, Bruce Ford, Matha Josey, entre outros, e mais tarde durante os Jogos de Salt Lake City nos Estados Unidos em 2002 o Rodeio novamente fez parte da programação olímpica. Mas vamos contar em detalhes como foi a inserção do Rodeio nos Jogos Olímpicos e como as competições foram realizadas em nossa próxima matéria especial que será publicada logo mais.

Em ambas as ocasiões as competições contaram apenas com competidores dos Estados Unidos e Canadá e apesar de os atletas receberem as mesmas medalhas dos outros esportes, elas não contaram para o quadro oficial de medalhas dos países. O motivo é que o Rodeio não foi de fato um esporte oficial daquelas edições, mas entrou na programação cultural das Olímpiadas, devido à sua importância para a região das cidades sedes.

Foi usado aquele caminho mais curto, inserido como “esporte de exibição” e nas duas vezes só foi possível por que houve a contribuição de vários fatores que citamos acima. Entre estes fatores estão o empenho de entidades locais de Rodeio, apoio dos organizadores dos Jogos e combinação logística, já que ambas as edições ocorreram na América do Norte e em regiões que habitualmente já realizavam Rodeio, facilitando o fornecimento de animais, por exemplo.

Depois de 2002, os Jogos Olímpicos de Inverno foram realizados em cidades da Itália, Rússia e Coréia do Sul, países sem tradição e sem infraestrutura para Rodeios. Somente a edição de 2010 foi realizada na América do Norte, novamente no Canadá, mas em uma região também sem muita tradição no nosso esporte e o Rodeio não foi acrescentado a programação. Existe uma remota chance do Rodeio voltar aos Jogos Olímpicos de Inverno nas mesmas condições, já que Salt Lake City é pré-candidata a receber novamente os Jogos de 2030 e 2034. Será que desta vez poderíamos ter brasileiros? A discussão disso já vale tema para muitas matérias e nos vemos em breve em muitas delas por aqui.

Via Rodeio S.A.

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