Os leilões presenciais vão voltar a acontecer?

A migração do presencial para o online mostrou o poder da inovação e adaptação de um dos setores principais do agronegócio brasileiro

A pandemia mundial da Covid-19 afetou radicalmente a vida pessoal e profissional de todos, sem exceção, obrigando uma mudança radical em muitos hábitos. No agronegócio, afetou drasticamente um segmento chave da pecuária: os leilões de venda de animais. Tradicionalmente realizados em recintos fechados e com grande número de pessoas, o setor foi obrigado a se reinventar para sobreviver. “Já vínhamos nos preparando para utilizarmos ferramentas digitais online em nossos leilões. As transmissões via internet já era realidade em muitos, mas era uma ferramenta para agregar, não principal”, afirma Devair Bortolato, o “Peninha”, diretor da Panorama Leilões, de Cascavel, uma das mais tradicionais leiloeiras do Brasil.

Mas, como o mote já diz, o “agro não pára”. Nas fazendas de pecuária de corte, a realidade do dia a dia não mudou e, mesmo nestes tempos de isolamento social, a venda de animais continua sendo um processo essencial na cadeia produtiva. O mercado se obrigou a achar uma solução rapidamente e a migração para o ambiente digital foi a saída encontrada. “A pandemia nos atingiu em pleno período de maior movimentação do mercado, que acontece nos meses de março, abril, maio e junho”, conta Cleber Bortolato, também diretor da Panorama Leiões. “Tinhamos 16 leilões agendados nesse período. E não tivemos dúvida do que fazer. Investimos em equipamentos profissionais de áudio e video, montamos um estúdio e criamos um sistema de suporte telefônico para registrarmos os lances dos participantes”, detalha.

O processo de preparação dos leilões mudou e, ao invés dos animais serem trazidos ao recinto, os profissionais foram às fazendas munidos de filmadoras, tripés e máquinas fotográficas. Neste processo, mais vantagens: o fim do custo de transporte, deságio de peso e stress dos animais.

Rapidamente, os leilões começaram a acontecer e os resultados se mostraram melhores do que os esperados. “Tivemos maior público, pois aquele pecuarista que por algum motivo não poderia estar presente por algum motivo, pôde participar de sua casa e tivemos mais amplitude, pois a transmissão pode ser acessada de qualquer lugar do Brasil ou do mundo que tenha internet.

Mas o melhor resultado foi o aumento de vendas. “No dia 18 de julho, realizamos o 14º leilão virtual do ano e o balanço indica um aumento de 32% nas vendas de animais se comparados com o mesmo período de 2019, quando realizávamos os leilões presenciais”, comemora.

Panorama Leilões, de Cascavel: exemplo de migração para a plataforma digital
Panorama Leilões, de Cascavel: exemplo de migração para a plataforma digital

O leilão virtual, que já era realidade há algum tempo nos grandes centros do Brasil, teve a vinda para o interior acelerada pela pandemia, onde teve uma aceitação muito grande. “Houve um aumento na nossa carteira de clientes, com a vinda daqueles pecuaristas que não traziam o gado em leilão porque não queriam gastar com frete, transporte, mão de obra, etc. Agora é só filmar os animais na propriedade e colocar à venda. Isso também aumentou muito o oferta de animais”, conta.

Além disso, houve incremento também no alcance dos leilões, ou seja, no número de clientes. Mais gente está vendo os animais, de locais mais distantes e também agora estão comprando. O pecuarista, que muitas vezes deixava de ir ao leilão por ser longo o deslocamento agora pode comprar um touro ou outros animais sentado no sofá de casa.

Pecuaristas comemoram

E não são apenas os profissionais das leiloeiras que estão satisfeitos com a novidade. Pecuaristas e donos de cabanhas estão bastante animados com os resultados até então apresentados com a mudança total do sistema do presencial para o digital.

Reno Paulo Kunz é um deles. Para ele, a mudança veio para ficar. “Cito dois fatores relevantes nessa transformação de paradigmas, do presencial para o virtual. Um é o respeito aos animais. Eles permanecendo na propriedade ficam menos estressados. O transporte é exaustivo para os animais, que perdem peso e demoram alguns dias para se readaptar. E também porque muda o nicho de clientes, pois há muito mais gente visualizando. País todo pode acessar”, disse.

Segundo ele, em seu leilão a comercialização foi acima das expectativas, vendendo para regiões do Paraná onde o presencial não “alcançava”. “Ainda tem muitos conservadores, que precisam ver o bicho de perto. No entanto, acreditam que vão se curvar às novas tecnologias”. Reno acredita que os leilões, pós-pandemia, serão mistos. Para ele, lotes pequenos vão ser presenciais, mas as vendas de lotes grandes serão só digitais.

Já Antonio Figueiredo, proprietário da Cabanha Brangus Boitatá, confessa que no inicio ficou receoso com a migração para o meio digital, mas afirma que se surpreendeu positivamente. “Minha avaliação é muito boa. Eu achava que não ia dar certo, porque é uma novidade. Fiquei ansioso quando fiz meu leilão, mas o resultado final foi bom demais. Vendemos os 50 lotes ofertados e tivemos um incremento de vendas e valorização em torno de 40%”, relatou.

Figueiredo afirma que o novo sistema de vendas foi um sucesso porque para o pecuarista é bem mais prático, evitando transportes, estresse dos animais e também o seu próprio deslocamento. “Se for pelo pecuarista, não volta mais ao presencial. Eu creio que os pequenos produtores ainda vão utilizar esse método (leilões presenciais), mas os grandes e médios vão todos migrar para o digital. É impensável um comprador sair de outros Estados ou de outras regiões do Paraná para vir até aqui assistir um leilão se ele pode comprar da sua casa”.

O futuro dos leilões presenciais

Devair Bortolatto relata que já havia um processo de mudança em andamento no mercado de leilões. “Sabíamos que a venda através de internet era uma tendência muito forte. Já estávamos preparados para isso, comprando equipamentos e já transmitindo todos os leilões digitalmente, mas os digitais só representavam 20% das vendas. No entanto, não esperávamos que ia ser assim tão bom”.

Questionado sobre os compradores, Bortolatto contou que não “é só a molecada que está comprando, mas os mais conservadores também”. Apesar de muitos ainda não aderirem ao sistema digital, para Bortolatto é um caminho sem volta. Ele acredita que ainda existirão leilões presenciais, mas vão diminuir consideravelmente.

Embora ainda haja uma resistência de muitos produtores a investir em tecnologia e a “abraçar” o meio digital, Antônio Figueiredo acredita que é um caminho sem volta. “Veio para ficar. É difícil uma propriedade rural que está investindo em tecnologia não estar sob o comando dos mais novos ou em processo de sucessão. A participação do jovem na pecuária é uma realidade. As famílias estão preocupadas com a sucessão e estão inserindo os jovens no processo e, com isso, a modernização e a adoção dessas novas ferramentas vai aumentar”, opinou o pecuarista.

Paulo Vallini, diretor do Sindicato Rural de Cascavel vê a modalidade como um atrativo para manter os jovens no campo. “O ambiente rural está mudando e se obriga a usar a tecnologia no dia a dia. Isso está ajudando a chamar a atenção dos jovens, que já nasceram nesse mundo tecnológico e antes não viam esse atrativo no campo”, afirma.

via portal SindiRural News

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