Azul, gigante da aviação, aposta no Agro; Mas como soja e cana estão envolvidas?

A aproximação com o setor faz parte de uma estratégia que no final busca cumprir a meta de zerar as emissões de gases do efeito estufa. Mas como será feito?

No Plenário 12 da Câmara dos Deputados, parlamentares, membros do governo e representantes do setor de biodiesel se reúnem para debater o futuro do biocombustívelprojeto conhecido como “combustível do futuro” foi aprovado no último dia 12 de setembro de 2024. Sorridente e empolgado, em uma das suas falas, o presidente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), Donizete Tokarski, anuncia a mais nova associada da entidade, a Azul. Mas afinal, o que uma companhia aérea está buscando com produtores de biodiesel?  

Segundo o gerente de Sustentabilidade da Azul, Filipe Alvarez, a aproximação com o setor faz parte de uma estratégia que no final busca cumprir a meta de zerar as emissões de gases do efeito estufa – também chamado de net zero. Para alcançar esse objetivo, a companhia deu início a um plano para entender e conhecer o potencial das cadeias produtivas do SAF – sigla em inglês para Combustível Sustentável de Aviação. 

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“O setor aéreo global tem uma meta definida de ser net zero em 2050. E a Azul, querendo entender para chegar nessa meta, começou a olhar para dentro de casa e entender: ‘bom, para eu ter essa redução, o que eu preciso fazer?’”, pontua Alvarez ao Agro Estadão. A primeira iniciativa foi modernizar a frota de aviões e tornar o consumo do querosene de aviação (QAV) mais eficiente. Porém, essas iniciativas têm um teto de redução de 46% na intensidade de emissões – a medição adotada pela Azul é de intensidade de emissões, o que quer dizer que para cada quilômetro voado, eles esperam reduzir em 46% as emissões dessa quilometragem. 

“A gente chegou a conclusão de que se não tiver SAF disponível para as companhias aéreas utilizarem não vai ter cumprimento de meta”, diz. Por isso, uma postura mais proativa de buscar fornecedores foi iniciada. “Essa aproximação com a Ubrabio, por exemplo, ela veio com esse casamento de interesses, porque a Ubrabio quer fazer a indústria de biocombustível funcionar no Brasil e a gente também quer que ela funcione porque a gente precisa disso”, explica o gerente.

Foto: Azul/Divulgação

No que a Azul está de olho?

Um dos aspectos fundamentais dessa interação com o setor é o valor final desse biocombustível. Isso porque um preço alto pode afastar as companhias aéreas ou mesmo encarecer os voos. Por isso, a intenção da empresa de aviação é chegar a um entendimento de preço acessível distante dos moldes praticados na Europa hoje. A nível de comparação, a SAF vendida no velho continente custa até cinco vezes mais do que o combustível convencional, como aponta Alvarez. 

Por isso, há uma preocupação da companhia em tornar o valor mais barato do que o praticado em outros lugares. Segundo o gerente, cerca de 40% do custo das companhias aéreas brasileiras vem do combustível e o QAV do Brasil é o mais caro do mundo. Se o SAF brasileiro chegar ao patamar europeu de preço, “não vai mais ter setor aéreo”. 

Por ainda não ter uma produção em escala industrial no Brasil, o SAF daqui também não tem preço. Sem uma previsão de valor, Alvarez explica que não é possível a companhia fazer, por exemplo, um contrato de compra futura. Essa falta de garantia também acaba sendo um problema, já que sem isso, o setor não irá despender recursos para construção de biorrefinarias, pois o custo para construir essas estruturas também é elevado. 

Nesse sentido, o envolvimento com a Ubrabio é também para apoiar nas esferas institucionais e de regulação. O gerente entende que o envolvimento do governo federal é importante para trazer mais segurança para investidores, produtores e compradores. Funciona como uma corrente de confiança. Se todos os elos passarem essas garantias, a tendência é de que a cadeia do SAF funcione. 

“O governo precisa estar alinhado e disposto a fazer esses tipos de investimentos nas empresas. Mas ao mesmo tempo, para as empresas conseguirem esses investimentos elas precisam ter do lado das companhias aéreas uma aproximação para garantir a compra da produção. E obviamente, nós não vamos comprar a qualquer preço”, comenta. 

De onde virá a matéria-prima?

A intenção de tornar o SAF mais barato também passa pela matéria-prima que será utilizada e onde será produzida. Isso porque, além da eficiência de cada matéria-prima para reduzir a emissão, o cálculo das metas do setor aéreo também mede as emissões da fazenda até a queima durante os voos. 

“Quando a gente fala de biocombustível o grande motor para essa discussão é a redução de emissões. Então, a principal coisa que a gente olha hoje é o quanto determinado biocombustível de um rota tecnológica vai entregar de redução de carbono”, reitera Alvarez. 

Nessa equação, além das emissões geradas na produção da matéria-prima, também é contabilizada as emissões do transporte da matéria-prima, da fabricação da SAF e do transporte dela até os locais de abastecimento dos aviões. Por isso, dependendo de onde for produzida, matérias-primas como soja, milho, cana-de-açúcar e macaúba podem impactar preços finais diferentes.  

Na dinâmica desse novo mercado, o gerente aponta que atualmente a metodologia e rota mais madura no Brasil é o biocombustível a partir do óleo de soja. Isso porque a Europa também já usa SAF originada a partir de óleo vegetal, então é possível observar na prática.  “Mas a gente sabe que o etanol, tanto de cana-de-açúcar quanto de milho, tem um potencial enorme de gerar uma redução de carbono ainda maior”, indica. 

Além disso, é provável que na formação desse mercado não sejam ofertados apenas SAF de uma única matéria-prima e que as companhias comprem e façam composição com biocombustíveis diferentes. Outro ponto é que os biocombustíveis com menores emissões tendem a ter um valor mais alto. “O biocombustível que entrega mais vai poder cobrar mais caro, então vai ter um prêmio por isso”, afirma o gerente da Azul.

Nesse sentido, a visão da Azul é de que o Brasil tem condições de ser líder ou figurar entre os principais países produtores de SAF. Isso porque, independentemente da matéria-prima, as dimensões, a localização entre os trópicos e a expertise de produção agrícola oferecem vantagens competitivas importantes. Entre essas vantagens estão a capacidade de produzir mais com menos emissões além de um custo de produção mais baixo do que outros países. 

O receio de não dar tempo

Outra preocupação do setor aéreo é se haverá SAF em produção quando as leis de redução entrarem em vigor. Uma delas é o projeto de lei dos combustíveis do futuro. Essa proposta prevê que esse setor reduza suas emissões em 10% até 2037 utilizando o biocombustível, porém isso começaria com um percentual de 1% em 2027. O temor é que em 2027 ainda não haja uma produção consolidada de SAF, já que é necessário um tempo para a construção das biorrefinarias. 

“Essa é uma das coisas que a gente tem medo, porque não vai dar tempo de ter biocombustível em larga escala para todo mundo para cumprir um mandato [de metas]. Mesmo sendo gradual, a gente acha que não vai ter o suficiente”, justifica o representante da companhia aérea. 

Apesar disso, a intenção não é que o projeto seja extinto ou transformado, mas sim que haja celeridade na tramitação e na entrada em vigor. Isso porque o entendimento é de que a legislação “é fundamental para dar segurança que o produtor precisa”. “Uma vez que tem uma lei que fala que as companhias aéreas precisam cumprir as reduções, o sinal está de que vai ter demanda pelo biocombustível”, afirma Alvarez.

Fonte: Agro Estadão

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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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