A tão famosa frase: “isso é caro”, então te convido a exercitar os números da “matemática do boi”. Faça a conta, entenda a composição de custos da arroba produzida.
Não é novidade nenhuma se eu falar para você que margens da atividade pecuária têm reduzido ano a ano, que existe uma demanda latente por aumento de produção e que ganhos futuros, tanto zootécnicos como econômicos, se darão pela adoção de tecnologias que incrementem a produtividade do animal e/ou gerem aumento da produção por área.
Também é fato que as regras do jogo mudaram, já não se compra mais tantos bezerros com a venda de um boi gordo, igual nossos avós faziam. O saco de milho e a tonelada de farelo de soja assumiram um novo patamar de preços, e ser um fazendeiro de sucesso está muito mais relacionado a quantas arrobas se produz por hectare do que quantas cabeças se tem.
Boi China, ágio da reposição, custo fixo, janela de compra, hedge, dentre várias outras novas/velhas palavras e expressões, são cada vez mais comuns na mesa da fazenda e no vocabulário do pecuarista moderno. E seguindo esse contexto é que eu gostaria de falar um pouco da recria.
Antes de continuar, pense comigo:
Se da porteira para dentro existe o tal do ágio da reposição, que nos força a abater o animal mais pesado; se existe um custo cabeça por mês, revelando que quanto mais tempo o animal ficar na fazenda, menor meu giro de estoque e maior meu custo acumulado por animal e; se existe uma pressão de mercado, que tende a pagar mais por um animal jovem e com um mínimo de acabamento, nada mais coerente do que encararmos o tema “intensificação da recria” de uma forma diferente do que conversávamos até então.
Pois bem, assim como vivenciamos na fase de engorda – com os primeiros confinamentos surgindo no início da década de 80, em São Paulo, e posteriormente com a TIP (terminação intensiva a pasto) nascendo no Mato Grosso a partir dos anos 2000 -, temos que a intensificação da recria também se dará no cocho. Nossa vantagem agora é que poderemos pular uma etapa, pegando as lições do confinamento e da TIP, sabendo que o lugar que iremos colocar o cocho é muito mais uma questão estratégica de cada fazenda, dependente da estrutura e dos recursos disponíveis pelo produtor.
Como técnico de campo vejo a turma querendo comparar o lugar onde se coloca o cocho – pasto ou confinamento – como se essas estratégias fossem concorrentes, quando na verdade elas são duas ótimas ferramentas disponíveis na fazenda, poderosas e até complementares em algumas situações. O que precisamos entender ao avaliar qual a melhor opção são as particularidades de cada sistema produtivo e como cada um se ajustará.
Se por um lado a recria confinada libera pasto e permite maior controle do ganho de peso (conceito de dieta total), ela requer maior estrutura (currais, vagão) e mão de obra, um volumoso suplementar, a adaptação dos animais ao novo ambiente e um plano nutricional bem elaborado de retorno ao pasto. Já na recria intensiva a pasto (RIP) o animal fica a pasto, recebendo de 0,5 a 1,0% do peso vivo em ração, o que demanda menos estrutura (não esquecendo aqui da necessidade de uma oferta mínima de forragem). Nesse sistema o animal acaba demandando maior quantidade de concentrado, porém não precisará se readaptar no retorno ao pasto.
Já conduzimos, em parceria com a Apta de Colina/SP, alguns estudos que revelaram a similaridade produtiva entre as estratégias, desde que ajustadas aos objetivos do projeto. Destaco mais uma vez a importância do entendimento de cada realidade e do correto planejamento de cada uma.
Caso a estratégia eleita seja o confinamento de recria, atente-se em ajustar a relação proteína e energia da dieta; monitore o consumo frente ao que foi predito para não extrapolar o ganho de peso e comprometer o retorno ao pasto e; lembre-se da importância dos planos nutricionais crescentes, tão bem apresentados junto ao conceito do boi 777. Se a opção for pela RIP, também se preocupe em ajustar a proteína e energia da ração, busque associar a estratégia ao manejo do pasto, explorando ao máximo seu potencial.
No planejamento e dia a dia, no confinamento de recria, os desafios operacionais igualam-se ao confinamento tradicional, destacando o cuidado com o consumo dos animais. Já na RIP, é preciso pensar na sucessão dos ciclos produtivos. Como esta estratégia viabiliza-se melhor ao trabalharmos com altas taxas de lotação, comparada a uma recria convencional (3 a 6 animais por hectare durante todo período), surge a necessidade de conciliarmos o término de um ciclo produtivo e início de um outro, sobre a perspectiva da produção forrageira. Com certeza será preciso pensar em períodos de diferimento de algumas áreas da fazenda e/ou adubação estratégica.
Cuidado ao avaliar a viabilidade da RIP em comparação a outros sistemas de produção, principalmente em relação ao que será considerado como unidade produtiva, dado o aumento do GMD e da lotação, na RIP, colhe-se mais arrobas por hectare e em menor espaço de tempo. Sendo assim, os resultados obtidos com a estratégia elevam exponencialmente a produção de arrobas por hectare, que, se ajustadas pelo tempo, pode chegar à marca de 40@/ha/ano.
Fazendo um paralelo e pegando o boi 777 como exemplo, no qual trata-se o animal como unidade produtiva, propondo 7@ na recria em até 12 meses, na RIP, trata-se do sistema contemplando a produção de arrobas por hectare no tempo, conseguindo as mesmas 7@/animal em período de 8 a 9 meses.
Cabe destacar que, na RIP, por ser uma estratégia que envolve o fornecimento de um grande volume de ração – operacionalmente falando -, caso exista o desafio logístico de distribuição e fornecimento diário na fazenda, deve-se optar por rações com modulação de consumo.
- Vaca Nelore Carina FIV do Kado bate recorde mundial de valorização
- ‘Boicote ao boicote’: cadeia produtiva de bovinos quer deixar o Carrefour sem carne
- Jonh Deere enfrenta possíveis tarifas com sólida estratégia, diz CEO
- Maior refinaria de açúcar do mundo terá fábrica no Brasil para processar 14 milhões de t/ano
- Pecuarista é condenado a 3 anos de prisão por matar mais de 100 pinguins na Argentina
Por fim, antes de ouvir de você a tão famosa frase: “isso é caro”, te convido a exercitar os números da “matemática do boi”. Faça a conta, entenda a composição de custos da arroba produzida. Você notará que aumentar desembolso com custos variáveis que promovam aumento de receita (aumento de ganho médio diário) e ao mesmo tempo, reduzem os custos fixos (aumento de lotação), terão grande potencial de aumentar o lucro por hectare com a atividade.
Planeje bem sua operação (seja ela a pasto ou no confinamento), gere dados e transforme-os em informações que contribuam com a sua tomada de decisão. Lembre-se sempre que: quanto mais apertada a margem maior será a necessidade de escalarmos a produção.
Fonte: Nutrição Animal – Agroceres Multimix