Pesquisas abrem oportunidades de uso de biotecnologias moleculares para controlar a doença, como silenciamento gênico, edição gênica entre outras metodologias
O Phakopsora pachyrhizi, fungo causador da ferrugem-asiática da soja, possui um dos maiores genomas entre os patógenos vegetais (1,057 Gb) tamanho similar ao do genoma da soja, seu principal hospedeiro. Além disso, é enriquecido com sequências repetitivas (elementos transponíveis ou transposons), capazes de “saltar” ou mudar de posição no genoma, característica que pode conferir uma adaptabilidade e então “driblar” ações de controle. Essas foram algumas das descobertas obtidas a partir do sequenciamento e da montagem de três genomas do microrganismo (Phakopsora pachyrhizi), realizados entre 2019 e 2021 pelo ASR Genome Consortium, grupo internacional de pesquisa.
- Trabalho descobriu que o fungo age sobre uma proteína da soja envolvida na resposta de defesa da planta e que a presença do fungo inibe a atividade dessa proteína.
Esses resultados foram apresentados este mês no o IX Congresso Brasileiro de Soja, em Foz do Iguaçu (PR), pela pesquisadora da Embrapa Soja (PR) Francismar Marcelino-Guimarães. “Vimos, por exemplo, que parte desses elementos estão ativos no genoma do fungo durante sua interação com a soja, o que pode contribuir para sua variabilidade genética e, consequentemente, para sua adaptabilidade às medidas de controle”, frisa a cientista.
Os dados do consórcio estão publicamente disponíveis para a comunidade científica na internet. “A disponibilidade do genoma de referência do fungo é essencial para o avanço no conhecimento da biologia e nos fatores envolvidos na adaptabilidade desse fungo, com o intuito de acelerar o desenvolvimento de novas estratégias de controle da ferrugem-asiática”, acrescenta Guimarães.
- Segundo levantamentos do Consórcio Antiferrugem, os custos com a ferrugem-asiática ultrapassam os US$ 2 bilhões, por safra.
Além disso, a pesquisadora relata que o P. pachyrhizi apresenta um esporo com dois núcleos e com elevada diferença (polimorfismo), além de baixa comunicação entre eles. “Essa característica possibilita que esse fungo mantenha variações ou cópias alternativas de genes, o que também pode constituir uma fonte de variação importante”, diz a pesquisadora.
Ela conta que o genoma de referência tem possibilitado comparações entre o conjunto de genes de P. pachyrhizi com o de outras espécies de fungos. Adicionalmente, os estudos identificaram famílias de genes exclusivas em P. pachyrhizi , algumas com elevado número e outras com número reduzido, quando comparadas com outras espécies.
Segundo a pesquisadora, são genes envolvidos na produção de energia e no transporte de nutrientes da planta, o que pode indicar uma flexibilidade do seu metabolismo e adaptações ao seu parasitismo. “Entender o estilo de vida desse parasita, em nível molecular, é importante, por exemplo, para identificarmos os genes que podem atuar no parasitismo da planta de soja e, portanto, que são essenciais à aquisição de nutrientes e à sobrevivência do fungo”, explica. “Tais genes são alvos importantes para o desenvolvimento de estratégias de controle, como as de silenciamento gênico ou RNA interferência, que podem comprometer processos vitais da espécie e reduzir a agressividade do fungo”, destaca.
Resultados conjuntos
A Embrapa Soja, em parceria com a Universidade Federal de Viçosa (UFV), está buscando decifrar os mecanismos de ataque do fungo, identificando quais alvos da soja estão sendo manipulados pelo patógeno. “Descobrimos que o fungo age sobre uma proteína da soja envolvida na resposta de defesa da planta e que a presença do fungo inibe a atividade dessa proteína”, explica.
Outra descoberta importante foi veio da análise de variações no DNA da soja neste gene alvo do fungo, que mostrou um polimorfismo que separa as cultivares de soja que contêm os genes de resistência a esse fungo daquelas suscetíveis a ele. “Essa variação revela um potencial marcador baseado no DNA, que pode auxiliar no desenvolvimento de cultivares de soja combinando tais genes de defesa basal com os de resistência (genes Rpp)”, ressalta. A Embrapa já vem utilizando no programa de melhoramento genético os genes de resistência Rpp no desenvolvimento de cultivares de soja, por intermédio da tecnologia Shield.
Outra linha de pesquisa da Embrapa, em parceria com a Bayer, vem explorando a variabilidade existente nas populações naturais do fungo, de ampla ocorrência no Brasil e no continente americano. “O re-sequenciamento e a comparação das sequências de DNA entre diferentes isolados, coletados no Brasil e em países de outros continentes, e em uma ampla escala temporal, têm revelado regiões do genoma com diferentes índices de diferenciação. Isso permitiu, por exemplo, a identificação de novas mutações em um dos principais genes alvos dos fungicidas, que pode estar associada com a eficiência dessas moléculas. Tais informações podem auxiliar no direcionamento de novos estudos para incrementar o manejo químico da ferrugem da soja”, explica.
Fonte Embrapa