Confira algumas curiosidades e vantagens da raça Nelore Mocho, contatas por um especialista, nestes cinquenta anos de história.
Por José Otávio Lemos
Sim, neste 2019, no qual a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu completa 100 anos de existência, o grupamento Nelore Mocho com 50 anos de registro oficial. Desde 25 de fevereiro de 1969, foi iniciada a marcação, registro, da variedade mocha no Nelore. Desde Caburey e Simpatia, macho e fêmea da propriedade de Ovídio Miranda Brito, tal variedade tem sido a opção de selecionadores que viram nela qualidades que são objetivos de uma fatia do mercado.
Inicialmente, insistiu-se em que o caráter mocho, um dominante, fora incluído em rebanhos a partir de animais zebuínos que sofreram mutação. Não foi. É correto afirmar que a variedade foi conseguida através de cruzamentos absorventes, a partir de animais mestiços zebuínos com um gado de origem europeia formado no Brasil, o Mocho Nacional. Isso se deu principalmente no estado de Goiás, onde também surgiram animais mochos que formaram a Gir Mocho e de onde veio o animal ponto inicial do primeiro rebanho de formação da raça Tabapuã, na Fazenda Água Milagrosa (Tabapuã/SP).
Mas o caráter mocho não pode ser analisado aos olhos da genética mendeliana. Ele é controlado por pares de gens de penetração incompleta. Por isso, em rebanhos em formação e que buscam a variedade, é muito mais fácil produzir fêmeas mochas do que machos. Isso, olhando só o aspecto da ausência de chifres. No mocho total, o qual apelida-se de “carequinha”, a característica domina em todos os indivíduos na primeira geração (F1). Cruzando os seus produtos entre si, 19% serão mochos e 81% de chifre. Dos 19 mochos, somente 1 será homozigoto mocho contra 18 heterozigotos.
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O Nelore Mocho, com menos animais registrados até mesmo pelo seu tempo de existência, foi muito bem trabalhado e é gritante o bom resultado nas diversas provas a que foi submetido. Ele não está como um filho do Nelore de chifre. Caminha lado a lado como irmão e formando um time coeso de dois.
Antigamente, durante as edições da Exposição Internacional do Nelore, Expoinel, existia um prêmio dado para o animal com melhor caracterização racial. Na última vez em que a Expoinel aconteceu na capital mineira, 1992, Phylades Prata Tibery, jurado que cedia o seu nome ao troféu dado ao animal que recebia o título, estava julgando. De repente, tirou dos bolsos um par de chifres de Nelore, colocou-os sobre o crânio do touro Siso da FC, Grande Campeão daquela versão, e disse ao microfone: “Ele é tão bom que para ser perfeito só faltava o chifre.”
É isso. A seleção da variedade mocha chega ao estágio de paridade com a padrão, a de chifres, pela coerência de buscar um animal eficiente na produção de carne nobre. E os acasalamentos das fazendas de mochos utilizam muito a genética dos de chifres. Portanto, já deveriam até estarem sendo julgados numa mesma pista.
Raças europeias, originalmente chifrudas, também tiveram trabalhos seletivos para terem grupamentos mochos. Desde um bom tempo, com chifres e mochos delas são julgados nas mesmas pistas. Principalmente, porque são usados animais dos dois tipos em acasalamentos sem restrições. Variedade não é raça.
É uma característica regida por vários pares de genes e discorremos sobre isso anteriormente neste texto. Também, há uma distribuição diferente dos resultados entre machos e fêmeas portadores da característica. Isso significa que algum gene que participa do caráter mocho está inserido no cromossomo Y. E a penetração do caráter é incompleta. Por isso, existem calos, batoques nos descendentes do Nelore Mocho.
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As vantagens comerciais buscadas com a ausência de corno são ocupação de menor espaço por animais mochos (naturais ou possuidores de chifres) e menor escoriações nos couros devido a brigas (entre machos) ou brincadeiras nos lotes. Além de dar mais padronização aos grupos.
Com certeza, descendentes do Bos akeratos, um bovino europeu, ascendente do Aberdeen Angus, foi que deram origem do caráter mocho primeiramente em bovinos taurus no Brasil e, depois, por cruzamentos absorventes em cima de gado zebuíno, conseguiu-se fixar a característica da ausência de cornos.
José Magno Pato, técnico histórico no meio da zebuinocultura, fez análises bem objetivas quanto à origem dos mochos zebuínos. Chegou à conclusão de que o fazendeiro José Gomes Louza, da região de Leopoldo Bulhões, no estado de Goiás, adquiriu reprodutores zebuínos da importação de 1907. Cedeu três desses para os irmãos Gabriel e Salviano Guimarães, criadores de Mocho Nacional (um Caracu mocho natural), que usaram e colheram os primeiros mestiços zebuínos mochos. Dali por diante, cruzamentos absorventes selecionando o caráter mocho, que tem relativa dominância. Em 1912, os irmãos Guimarães já haviam apresentado na capital de Goiás produtos mochos com uma evidência de sangue Zebu. Isso ficou registrado na revista Informações Goianas. Esse é o ponto de partida para todos os mochos que passaram a existir nos zebuínos, registráveis como o Nelore Mocho, o Gir Mocho, o Indubrasil Mocho, o Sindi Mocho, o Tabapuã.
Na Fazenda São Vicente, de Ophélia Zancaner e Francisco Lourenço Cintra, nasceu um bezerro Nelore Mocho, produto do acasalamento do touro Galan, um PO, com vaca igualmente “pura”, mas não registrada. O nome dado a ele foi Pau d’Alho. E foi usado para formar rebanho mocho “puro”.
Hoje, sabemos que dois animais com chifres poderão gerar um mocho e isso foi matéria bem discutida no conselho técnico da ABCZ. Tudo ficou comprovado com exame de DNA do produto e de seus pais.
Durval Garcia de Menezes, da Fazenda Indiana, usou um touro chamado Netinho, produto da Fazenda Experimental de Criação de Sertãozinho, para cobrir um lote de novilhas Nelore PO para começar um dos mais importantes centros de seleção do Nelore Mocho.
Esse touro usado por Menezes nas suas fêmeas, era o pai de Netinho de Novo Horizonte, que tinha na sua ascendência a vaca Capanga e ela deu outro touro importante para o Nelore Mocho, o touro número 1 da variedade, o Caburey.
Essa vaca, cria do uberabense Neca Andrade, tinha na sua genética o caráter mocho.
O uso intenso do Caburey no rebanho Nelore OB (iniciado em 1947, com a aquisição do touro Tic na Exposição Nacional de Animais, em Belo Horizonte/MG), inclusive com pressão para a consanguinidade, fixou bem o caráter mocho e deu origem a um grande rebanho, que, indubitavelmente, foi o mais importante para o avanço da variedade pelo Brasil e em outros países (primeiramente, Paraguai e Bolívia).
Os resultados de ganho em peso e fertilidade foram a tônica da seleção OB. Exemplos fortes disso é Folguedo, bisneto do Caburey, com 455 kg aos 12 meses; e Flauta, com 13 crias aos 14 anos de vida (Melhor eficiência reprodutiva da ExpoZebu de 1982).
Vale a pena o registro feito por Jan Bonsma sobre o que ele viu na Fazenda Santa Marina, na última visita que fez ao Brasil: “Eu desejo dizer que nunca vi um rebanho tão grande e tão bem controlado, como o da Fazenda Santa Marina. Em minhas 12 viagens à América do Norte e minhas 11 visitas à América Latina, nunca vi nada igual a este trabalho. Eu fico grato por ter tido a oportunidade de vê-lo.”
Turco, Cangaceiro e Monte Branco foram três touros com a marca OB de Ovídio Miranda Brito para Francisco Jacinto da Silveira, de Barretos/SP, para ele formar o seu rebanho e ser grande divulgador das qualidades da variedade do Nelore.
São vários os centros de seleção que impulsionaram o Nelore Mocho
Inclusive, Torres Homem Rodrigues da Cunha também selecionou a variedade a partir de descendentes de Amendoim VR, pai do Netinho. O rebanho dele foi vendido integralmente a Geraldo Ribeiro, que impulsionou a marca GR como das principais do Nelore Mocho em todas as épocas. Joaquim Vicente Prata Cunha, filho de Torres, também fez um excelente trabalho com o Nelore Mocho VR da RV (Rancho Verde). Frederico Chateaubriand, que foi dono de Iran, cria da marca OB, foi destaque no criatório. Juan Carlos Wasmosy, proprietário da seleção Goya, do Paraguai, ex-presidente do país, inclusive, continua firme na seleção, com fazenda no Brasil, e ajudou a levar tal genética mocha a outros cantos, como na Bolívia. Ruy Moraes Terra e Antônio Renato Prata – Pratinha, ambos com seleções na região de Presidente Prudente/SP, não podem faltar na relação dos principais do Nelore Mocho. Nenê Costa se dedicou muito a esse tipo de seleção e até a venda total do seu plantel de chifres, conservou o Nelore Mocho, que passou para o seu neto Sérgio Costa. Da região de Barretos ainda, a Fazenda Boa Vista, do Grupo Paulo Ferraz, onde nasceram Falo da Boa Vista e Feltro da Boa Vista, destacados reprodutores Nelore Mocho.
Poderia me estender bem mais, mas não vou sair sem citar o nome de Carlos Viacava, que foi um marco na presidência da Associação Nacional dos Criadores de Nelore, e é um grande selecionador; e da amiga Tutuca Suleiman, da Fazenda São Luiz dos Coqueiros.
*O Zootecnista José Otávio Lemos, produtor rural, jurado e conselheiro técnico da ABCZ e diretor da JOL Empresa Múltipla Assessoria e Consultoria.