Estudo aponta crescimento de público feminino na zona rural, além do aumento do consumo de informação pelo meio digital e do uso de aplicativos
O campo está mais jovem e feminino, de acordo com a sétima edição da pesquisa Hábitos do Produtor Rural. Conduzido pela Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio (ABMRA), o estudo entrevistou, in loco, 2.835 agricultores de 15 Estados.
A presença de mulheres em funções de decisão nos empreendimentos rurais triplicou em relação a 2013: passou de 10% para 31%. Já a idade média dos produtores rurais caiu 3,1% e, hoje, é de 46,5 anos. O trabalho aborda ainda hábitos de compra, envolvimento dos produtores com as novas tecnologias e as mídias que consultam para sua informação pessoal e profissional.
O diretor de Pesquisa da ABMRA, Ricardo Nicodemos, destaca que mesmo nas propriedades onde não é a mulher quem toma decisões, sua presença é valorizada. “Perguntamos aos homens sobre a importância da participação da mulher e 88% classificaram como essencial ou muito importante”, ilustra.
Nicodemos frisa ainda a abrangência do estudo realizado pela associação. O trabalho passou por 15 Estados – em torno de 300 cidades – e conversou com produtores que trabalham com 11 culturas e quatro atividades animais: pecuária de corte; pecuária de leite; avicultura e suinocultura. “É uma radiografia do produtor nacional, que mapeia e pode dar um norte para governo e empresas”, define.
A advogada Carolina Alves Luiz Pereira, 30, encarou o desafio de atuar na gestão do campo com apenas 16 anos. Na época, seu pai assumiu um cargo público e ela passou a cuidar da Fazenda Candeias, em Crixás, na região noroeste de Goiás, que no período tinha cerca de 4 mil animais.
Precisou aprender sobre gado nelore e melhoramento genético, ramo de atuação da família. “A primeira coisa que fiz foi começar a estudar. Fiz vários cursos, como de inseminação artificial, e passei a fazer atividades como a escrituração zootécnica, a comunicação de nascimento e de inseminação”, relembra.
Hoje, ela concilia a gestão da fazenda com as atividades da Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA), da qual é diretora, e o trabalho como advogada ambiental. Para a advogada, a experiência no campo repercutiu positivamente em sua atividade profissional. “Trabalho na área ambiental, com muitos fazendeiros. O dia a dia no campo me ajudou muito. Entendo as demandas do produtor, como as necessidades específicas do plantio e da criação dos animais”, exemplifica.
Para o professor da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Federal de Goiás (UFG) Ricardo Campos a participação feminina historicamente sempre foi marcante entre os pequenos proprietários, passando a ser “contabilizada” quando o agronegócio desponta. “A atividade se beneficia desta ‘feminilização’ principalmente em atividades que requerem maior versatilidade, flexibilidade e sensibilidade, fatores que as mulheres desenvolveram em torno da lida multifuncional da agricultura”, analisa ele, que coordena trabalhos sobre desenvolvimento rural e agricultura.
Otimismo e desafios
A pesquisa também mostra que o otimismo marca a atividade rural, mesmo em tempos de turbulências político-econômicas que se arrastam desde 2014, na esteira da Operação Lava Jato. Aliado com a tecnologia crescente, a confiança refletiu no número de produtores que deixaram a cidade e se instalaram definitivamente na zona rural. Em 2013, 47% dos entrevistados moravam na propriedade. Em 2017, esse número foi para 56%.
O professor do curso de MBA Agronegócio & Agroindústria, do Instituto de Pós-Graduação e Graduação (Ipog), Frederico da Silva também aponta a modernização do campo como um dos fatores para o aumento de produtores que vivem na zona rural. “O campo passou a ser visto como uma empresa, um negócio agrário. Por isso, existe esse olhar de volta ao campo por essa geração que um dia abandonou por uma questão de qualidade de vida, de segurança”, avalia.
No quesito percepção da própria imagem, 68% se declararam otimistas em relação ao futuro da atividade agropecuária no Brasil e 91% disseram ter orgulho de ser produtor rural. “A tecnologia traz uma conveniência grande e dá conforto e segurança para estar no campo, o tempo todo, se o produtor assim quiser. Vemos um produtor extremamente confiante no seu negócio, que se mostra bem otimista em relação a sua atividade no Brasil”, declara Nicodemos, da ABMRA.
Apesar dos prognósticos otimistas, o campo ainda enfrenta desafios para consolidar a renovação e a sucessão rural. Um mercado de trabalho com remunerações pouco atrativas, pode ser decisivo na hora de tocar o próprio negócio ou o negócio da família, na zona rural, na avaliação do pesquisador Ricardo Campos, da UFG. “No agronegócio, existe uma maior dedicação exclusiva”, frisa. Segundo o estudo da ABMRA, 81% dos produtores entrevistados têm na atividade a única fonte de renda.
Produtor mais conectado
Se na cidade o WhatsApp virou febre, no campo o aplicativo também ganhou espaço. E muito! Entre as mídias digitais, ele lidera a preferência dos produtores rurais com 96%, seguido pelo Facebook, com 67%. Depois, vem o YouTube, com 24%, o Messenger, com 20%, o Instagram, com 8% e Skype, com 5%.
Para o professor do curso de MBA Agronegócio & Agroindústria, do Instituto de Pós-Graduação e Graduação (Ipog), Frederico da Silva a internet deve ser aliada do produtor para a troca de informações. “Um produtor, hoje, que não esteja conectado com a bolsa de mercadorias de São Paulo e com a bolsa de Chicago estará naturalmente atrasado em suas discussões de negócios. A variação se dá, literalmente, a cada segundo”, exemplifica, citando que o WhatsApp, especificamente, pode servir para a formação de grupos locais e regionais com produtores que atuam na mesma área.
Já a televisão aberta perdeu um pequeno espaço na preferência dos produtores rurais. No entanto, permanece com folga na liderança como o meio de comunicação mais usado. É o veículo de atualização e informação para 92% dos produtores. Na pesquisa de 2013, o porcentual dessa mídia era de 95%.
Já o rádio cresceu 7% em relação ao levantamento de 2013 e hoje é usado por 75% dos produtores. A internet também apresentou aumento de 7,7% e abocanhou 42% das referências. Os jornais têm 30%; a TV paga 28%; e as revistas, 27%.
Atualização em alta
A atualização técnica no campo está em alta, tanto entre os agricultores quanto os produtores de animais, conforme a pesquisa ABMRA. Entre os agricultores, os dias de campo (54%), as feiras agropecuárias (22%) e as palestras técnicas (16%) são os eventos preferidos. Quanto aos produtores de animais, os dias de campo lideram com 36%, seguidos pelos leilões de bovinos (19%), as feiras pecuárias (18%) e as palestras técnicas (17%).
A preocupação com o conhecimento sempre pautou a atuação da pecuarista Ana Miranda, 50, desde que ela passou a atuar na área, em 2000, junto com o marido, criador da raça tabapuã. Hoje, além da criação de gado em propriedades nos municípios de Inhumas, Caturaí e Paraúna, todos em Goiás, eles também são produtores de mogno africano. A fazenda em Inhumas, distante 35 quilômetros de Goiânia, aliás, é campo de estágio para estudantes da área agrária de cursos de instituições de ensino goianas.
Já a fazenda de Paraúna recebe produtores para a realização de cursos, conforme explica Ana, que é vice-presidente da Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura (SGPA) e presidente da Associação Brasileira do Tabanel (ABTnel). “Fizemos uma opção pelo melhoramento genético e a forma de mostrar a necessidade das propriedades trabalharem isso, foi por meio das exposições agropecuárias. As pessoas foram vendo o quanto, de um ano para o outro, foram melhorando”, recorda.
Tecnologia
Na lida dos negócios, os agricultores destacam o uso frequente das mais modernas tecnologias para o aumento da produtividade, como adubação (95%), pulverização (82%) e controle de pragas (80%).
Já os pecuaristas, investem preferencialmente em adubação das pastagens (57%), rotação de pastos (52%), controle de enfermidades (36%) e uso de cerca elétrica (35%).
As maiores preocupações dos criadores são a saúde (41%), a nutrição animal (18%), a gestão das propriedades (13%) e a mão de obra (9%). E 21% deles têm curso superior, especialmente agronomia (42%), veterinária (9%) e administração de empresas (7%).
Fonte: Revista Safra