Articulação liderada pela entidade impediu “nos acréscimos” que governo do Paraná aprovasse projeto que taxaria o setor agropecuário.
Mais uma vez, o setor agropecuário deu mostras de que sua força é reflexo direto da união. Em uma mobilização em tempo recorde coordenada pela Faep, o campo conseguiu que o Governo do Paraná recuasse de uma iniciativa que criaria mais uma taxação ao agronegócio. Foi como uma defesa nos acréscimos em uma partida de futebol, já que estamos em clima de Copa do Mundo. Tudo isso, a partir de uma articulação política ampla, que envolveu sindicatos rurais e produtores para a intermediação com deputados. É o mais recente episódio que ilustra como o fortalecimento do sistema de representatividade é eficaz em defender os interesses dos agricultores e pecuaristas do Paraná.
O caso chegou ao conhecimento do setor rural no dia 21 de novembro, quando a Faep soube que o Governo do Paraná enviaria à Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) o Projeto de Lei 498/22. A proposta previa a criação do Fundo de Desenvolvimento da Infraestrutura Logística do Estado do Paraná (FDI-PR), voltado, principalmente a investimentos e obras em rodovias. O governo propunha que esse fundo tivesse como principal fonte de recursos a taxação de produtos da agricultura e da pecuária paranaenses.
O agravante é que o governo solicitou que o projeto tramitasse em regime de urgência, em uma manobra conhecida como “tratoraço”. Com isso, a proposta passaria no mesmo dia pelas comissões da Alep e, em seguida, seria submetida à votação em plenário, em dois turnos. Com isso, havia possibilidade de que o projeto pudesse ser aprovado definitivamente no dia 23 de novembro. Todo esse processo a toque de caixa, é claro, dificultaria a mobilização de possíveis protestos e, principalmente, o debate das propostas apresentadas pelo governo e suas consequências.
A criação da taxação foi classificada pela Faep como uma chantagem rasteira que ia contra o interesse público. Ágide Meneguette, presidente da entidade, publicou um artigo contundente, intitulado “Bate carteira do agro”. “Como a cobrança do ICMS sobre produtores agrícolas está diferida há décadas – cobrar imposto sobre comida seria um escárnio –, esses governos querem uma lei que diga: se o produtor rural não quer ter o ICMS cobrado, então que pague a taxa que ele está criando para construir as rodovias que foram abandonadas por ele mesmo”, escreveu Meneguette.
Reação
A Faep convocou os sindicatos rurais, que responderam com uma ação rápida. O Departamento Técnico e Econômico (DTE) começou, imediatamente, a elaborar um estudo técnico, concluído no dia 22 de novembro. O levantamento apontou que os altos custos de produção que incidem sobre a produção agropecuária e que a nova taxação causaria um rombo de R$ 2 bilhões no setor. Liderada pelo presidente Ágide Meneguette, a Faep e os sindicatos rurais passaram, então, a estabelecer contato com cada um dos deputados estaduais do Paraná, levando as informações técnicas e argumentando as dimensões do prejuízo que a aprovação do projeto provocaria ao setor produtivo.
A mobilização do campo paranaense resultou em um grande elo com os produtores rurais de cada município, apresentando informações sobre as negociações e mobilizando as bases. Ainda no dia 22, a Federação emitiu uma nota de repúdio contra o projeto, apontando que o setor agropecuário não tinha sequer sido ouvido pelo governo. No posicionamento, a entidade enfatizou que o projeto era fruto da incompetência do governo federal, que não solucionou em tempo hábil a concessão das rodovias.
“Os governos estão, na prática, criando um imposto que recai sobre as costas dos produtores rurais e indiretamente sobre toda a sociedade. Em resumo: como não souberam fazer nada até agora, acharam uma solução fácil: bater a carteira dos produtores rurais, que vão pagar pelas duplicações das rodovias para que todo mundo pague uma tarifa de pedágio menor”, escreveu Meneguette.
Ao longo da sessão da Assembleia Legislativa daquele dia, diversos deputados se pronunciaram contrariamente à proposta de taxar o setor agropecuário. A nota da Faep foi lida na íntegra durante a sessão pelo deputado estadual Plauto Miró. O presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Alep, deputado Anibelli Netto, fez um pronunciamento em que conclamou os parlamentares a encontrarem, conjuntamente, alternativas para a manutenção das rodovias, sem que o peso recaísse exclusivamente sobre os agropecuaristas. “Não é correto taxar os produtos agropecuários”, enfatizou Anibelli Neto.
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A mobilização surtiu efeito. Ainda na tarde de terça-feira, o governo do Paraná recuou e retirou o projeto da pauta de votação. O governo, no entanto, não detalhou se a proposta será extinta ou se deve ser reformulada e reapresentada à Assembleia Legislativa. Por isso, a Faep vai manter sua atuação política, no sentido de garantir que não haja prejuízos ao setor agropecuário.
“Ainda bem que o governador teve o bom senso de retirar esse projeto da pauta da Assembleia Legislativa. Mas a gente continua vigilante. Se tiver novos movimentos, nós, do setor agropecuário, temos que participar ativamente. Nós demos um exemplo de democracia e de mobilização”, disse Meneguette. “Somos contra qualquer imposto que discrimine o setor rural. Se tiver impostos que toda sociedade terá que pagar, tudo bem, estamos juntos. Mas não vamos admitir que o governo jogue toda a carga tributária sobre o setor rural”, acrescentou o líder.
A Faep ressaltou seu entendimento de que a proposta do governo tem relação direta com o fim das concessões das rodovias. O contrato com as concessionárias venceu em 2021. Em vez de seguir os pedidos do setor produtivo de manter a concessão das rodovias federais sob tutela do Estado do Paraná, a atual gestão entregou a responsabilidade à União. Esta não renovou as concessões nem fez uma nova licitação, e as estradas ficaram com administração e manutenção a cargo do próprio governo do Estado.
Meneguette reiterou que o setor agropecuário não vai aceitar assumir todos os encargos. “Todo mundo sabia que os contratos de concessão das rodovias iam vencer e nada foi feito. Ninguém tomou providência e agora estamos com as estradas esburacadas. O agricultor não tem culpa disso”, ressaltou o presidente da Faep.
Estudo técnico detalha prejuízos
A nota técnica publicada pela Faep trouxe um diagnóstico da situação do agronegócio e o porquê de não ser uma boa ideia taxar o setor. “Além de inesperada, a taxação dos produtos do agronegócio parece ter sido proposta sem a reflexão necessária. Nos últimos anos, o setor agropecuário vem enfrentando muitas oscilações, tanto na produção quanto no preço”, reflete Jefrey Albers, coordenador do Departamento Técnico e Econômico (DTE) da Faep.
Apesar da disparada dos preços desses produtos observada nos últimos dois anos, esse fenômeno veio acompanhado de expressivo aumento nos custos de produção dos produtos agropecuários, que foi agravado pela invasão da Ucrânia pela Rússia. Entre fevereiro de 2020 e agosto de 2022, os principais agroquímicos utilizados na agricultura apresentaram aumento entre 185% e 316%. Na pecuária não foi diferente, a avicultura que tem no Paraná seu líder nacional, viu os preços aumentaram em 29,41% entre 2020 e 2022. Porém, nesse mesmo período, os custos de produção do segmento aumentaram 83,72%.
Outra prova de que o setor rural não tem condições de arcar com a manutenção das estradas do Paraná é que, nos últimos anos, as lavouras foram fustigadas por secas e geadas que causaram perdas significativas ao campo. A estiagem histórica enfrentada entre 2018 e 2020 causou quebras severas nas safras, principalmente de soja, milho e feijão, impactando os custos de produção pecuária e contribuindo para inflação de alimentos para população.
Vale lembrar que muitos dos ganhos obtidos pelas commodities agrícolas no mercado internacional foram ocasionados pela valorização dos grãos na bolsa e principalmente pela cotação do dólar no mercado interno. Esses fatores devem sofrer alterações significativas nos próximos meses.
Taxação em outros Estados
O Paraná não foi o primeiro Estado a tentar taxar o setor agropecuário. Outro expoente do agronegócio, Goiás também colocou em tramitação um projeto de lei semelhante, que prevê a criação de fundo de infraestrutura, a partir da taxação da agropecuária. Lá, o Projeto de Lei foi aprovado. A polêmica foi tanta que o segundo turno da votação teve que ser suspenso, depois que representantes do setor agropecuário invadiram o plenário da Assembleia Legislativa de Goiás. Porém, a votação foi concluída no dia 23 de novembro e agora vai para a sanção ou veto do chefe do Poder Executivo do Estado.
O Mato Grosso tem desde 2000 uma iniciativa parecida já em funcionamento: o Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), que é mantido com taxas imputadas ao agronegócio. A arrecadação anual com essa taxa já passava de R$ 1,5 bilhão em 2019, segundo a Secretaria de Fazenda mato-grossense.
Antes disso, em 1999, o Mato Grosso do Sul aprovou a criação de um modelo semelhante, o Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário (Fundersul). Mais recentemente, em abril de 2022, o Maranhão recorreu a uma medida similar, criando o Fundo Estadual de Desenvolvimento Industrial (FDI).
Fonte: Ascom Faep
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