“Assim como tem a crise atual, outras vão acontecer. O que precisamos saber é como vamos nos preparar para as próximas crises. É importante que a gente saiba que tipo de risco queremos assumir. “
Nos últimos 15 anos, o Brasil aumentou a dependência de insumos importados para a agricultura. Em 2021, 90% dos insumos usados no país foram trazidos de fora. Esta grande dependência das importações e as alternativas para reduzir os riscos foram o tema da mesa redonda que marcou o encerramento do IX Congresso Brasileiro de Soja e Mercosoja 2022, realizado em Foz do Iguaçu (PR).
Moderada por Giovani Ferreira, diretor de conteúdo do Canal Rural, o debate reuniu José Carlos Polidoro, pesquisador da Embrapa Solos e atualmente coordenador na Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Bruno Caligaris, diretor de projetos estratégicos da mesma secretaria, e Ricardo Tortella, diretor executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda).
Antes de iniciar o debate, Giovani Ferreira relembrou que o Brasil produz cerca de um terço de toda a soja disponível no mundo. Somando com os vizinhos Argentina, Paraguai e Uruguai, a América do Sul concentra mais da metade da produção mundial. Ao mesmo tempo, há uma dependência cada vez maior da importação de insumos. Ele destacou ainda que o que está em questão não é a autossuficiência em produção de fertilizantes e sim a redução da dependência externa.
Nesse sentido, Polidoro lembrou que, com exceção de regiões do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, os solos brasileiros não são naturalmente férteis. Dessa forma, a produção agrícola de muitas áreas ocorre em solos com fertilidade construída e dependente do uso constante de fertilizantes. Ele mencionou ainda que não é só o adubo que é importado, mas também a tecnologia embutida neles. Dessa forma, é necessário que o Brasil também desenvolva tecnologias próprias para a adubação e, acima de tudo, use as tecnologias que já têm disponíveis desenvolvidas por universidades e instituições públicas de pesquisa. “O assunto é estratégico e precisa ser tratado com soluções a curto, médio e longo prazo”, disse.
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Uma dessas soluções é a Caravana Embrapa FertBrasil, que foi iniciada neste mês de maio e percorrerá a todas as principais regiões produtoras do país levando informações sobre alternativas para uso mais eficiente dos fertilizantes. “Temos tecnologias para melhoria da eficiência do uso do NPK. Temos que utilizar essas boas práticas. Não é aceitável que tenhamos perdas acima de 60% em fertilizantes que trazemos de tão longe”, ponderou Polidoro.
A Caravana é parte do Plano Nacional de Fertilizantes, que o governo brasileiro lançou em março desde ano. A política de Estado visa, sobretudo, garantir a segurança alimentar por meio de 80 metas a serem cumpridas até 2050. Bruno Caligaris explicou que o Plano começou a ser desenvolvido muito antes da atual crise de oferta de fertilizantes provocada pela guerra entre Rússia e Ucrânia e algumas das ações relacionadas a ele começaram a ser desenvolvidas ainda antes do lançamento, como a busca por novos mercados fornecedores de insumos.
“Assim como tem a crise atual, outras vão acontecer. O que precisamos saber é como vamos nos preparar para as próximas crises. É importante que a gente saiba que tipo de risco queremos assumir. Nossa exposição a risco estava muito alta. Temos que diminuir nosso risco sem reduzir nossa competitividade”, disse Bruno Caligaris.
O presidente da Anda, Ricardo Tortorella ampliou a contextualização sobre o cenário dos fertilizantes e mostrou a evolução da dependência brasileira de fertilizantes, que passou de 65% para 90% em apenas 15 anos. No caso dos adubos nitrogenados a produção interna supre 20% da demanda, no fósforo são 40% e no potássio apenas 5% da demanda atendida pela produção interna.
As importações de cloreto de potássio somaram 12,5 milhões de toneladas em 2020, sendo que 3,4 milhões de toneladas vieram da Rússia e 2,3 de Belarus. No caso de Balarus, sanções internacionais impediram a exportação, a partir do fim de 2021. No caso da Rússia, sanções econômicas estão dificultando o pagamento, porém, as exportações têm ocorrido. “Por ora, o alerta é amarelo (em relação à Rússia). Estamos conseguindo importar e estamos conseguindo pagar. Mas a oferta e a demanda estão desequilibradas, logo os preços devem continuar altos”, disse Tortorella.
Outro ponto abordado foi a necessidade de se reduzir os custos por meio da melhoria da infraestrutura de logística. Porém, além do aumento da capacidade portuária e de transporte interno, é preciso decisões políticas como a priorização do desembarque de fertilizantes nos portos, reduzindo o tempo de espera dos navios.
O painel sobre dependência agrícola de insumos importados marcou o encerramento do IX Congresso Brasileiro de Soja e Mercosoja 2022. O evento foi promovido pela Embrapa Soja e realizado em Foz do Iguaçu de 16 a 19 de maio. Ao longo dos quatro dias, 1800 participantes do Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia acompanharam seis conferências, 18 painéis com 50 palestras, apresentação de 287 trabalhos científicos em forma de pôster ou oral, além de apresentações na Arena de Inovação Soja e do relacionamento com 35 empresas expositoras. A programação teve como tema “Os desafios para a produção sustentável no Mercosul”.