Menor oferta de carne bovina explica baixa no consumo

A média de consumo per capita da carne bovina no Brasil em 2021 foi de 26,5 quilos, segundo o Conas, 38% a menos do que no pico de 2006.

O Brasil vive uma espécie de tempestade perfeita, que explica a queda no consumo de carne bovina nos últimos anos, culminando em 2021, quando a compra do produto no mercado chegou ao menor patamar dos últimos 25 anos, de acordo com um levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento. A média de consumo per capita do produto no Brasil em 2021 foi de 26,5 quilos, segundo o Conas, 38% a menos do que no pico de 2006, quando houve consumo médio de 42,8 quilos de carne bovina por habitante.

Não é só a inflação global, que acelerou no período de pandemia da Covid-19, que explica essa diminuição da presença de carne bovina no prato dos brasileiros. “Com desemprego e inflação persistentes desde 2014, estamos ‘desconstruindo’ esse consumo per capita”, diz Lygia Pimentel, presidente da casa de análises de investimento em ativos agropecuários Agrifatto.

Mas, para Maurício Palma Nogueira, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária, é até difícil mensurar de fato o consumo no Brasil com uma entrega tão baixa do produto, devido à diminuição de oferta que o país enfrenta.

“Não conseguimos, hoje, explicar uma queda causada pela demanda. Não tem como falar que o consumidor parou de comer por opção. O fato é que não tem carne bovina. Não há como mostrar um efeito de demanda causada pelo preço, que está alto, está todo mundo reclamando, mas a carne no supermercado vai embora, você não vê sobra”.

Estoque alto de carne bovina no passado

Nogueira explica que, embora o ciclo pecuário dure de 6 a 8 anos, no Brasil questões históricas fizeram com que um único ciclo perdurasse por décadas. Em resumo, durante muitos anos, com as expansões humanas para o interior do Brasil, a pecuária avançou junto, o que criou um estoque muito grande de animais.

Contudo, quando a inflação começou a ser controlada, a partir do Plano Real, nos anos de 1994, o mercado foi paulatinamente se ajustando. “A pecuária é lenta, então toda a reação dos produtores às mudanças econômicas acontece nesse mesmo ritmo, diferente da agricultura”, ressalta Nogueira. Os efeitos na cadeia pecuária só começaram a aparecer em 2015, quando o estoque de gado se esgotou.

Para contribuir com esse cenário, Pimentel, da Agrifatto, lembra que, em 2019, o volume de exportações cresceu proporcionalmente à produção, devido ao grande apetite chinês pela carne brasileira, em meio a uma peste suína africana, que dizimou 50% dos porcos do país em um ano.

A China então, devido às exigências internas do país, levou boa parte do rebanho brasileiro mais novo. Mas Nogueira não vê isso com maus olhos, já que percebe um desenvolvimento tecnológico no setor pecuário muito grande desde então, que pode resultar numa diminuição dos preços no futuro.

A parte negativa, contudo, é o agravamento da queda no suprimento de carne bovina no Brasil. Um levantamento feito pela Athenagro com dados do IBGE e da Secretaria de Comércio Exterior, do Ministério da Economia, mostra que, de 2018 para 2021, houve queda de quase 17% na disponibilidade per capita de carne bovina total, seja no mercado formal ou informal, como o abate para consumo próprio.

Em 2019, houve queda de 41,4 quilos por habitante para 38,02 quilos; em 2020 caiu ainda mais, para 33,86 quilos, enquanto em 2021 houve uma leve alta para 34,37 quilos por habitante. Dados do Conas apenas sobre o abate formal, que passa pela fiscalização sanitária federal, estadual e municipal, também mostram uma queda acentuada de disponibilidade de carne bovina per capita desde 2019, de 33,9 quilos para 30,6 quilos. Depois, em 2020, foi para 27,7 quilos e, em 2021, para 25,8 quilos até novembro.

Atual ciclo pecuário

Lygia Pimental explica que o ciclo pecuário é um fenômeno em que um aumento do estoque de animais dos pastos é seguido por uma redução, em resposta aos preços do bezerro. “Quando os bezerros estão com o preço em alta, há estímulo para que o pecuarista invista na produção dessa categoria e, por isso, ele retém fêmeas no rebanho acima do ritmo médio”.

Com essa retenção das fêmeas, aumenta-se a capacidade produtiva de bezerros, o que vai resultar em um estoque maior de animais “terminados” no futuro. Assim, automaticamente os preços dos bezerros e, posteriormente, do boi gordo caem, desestimulando essa grande produção. Nesse momento, as fêmeas também são levadas para o abate, reduzindo a oferta de bezerros no mercado hoje e, futuramente, de animais prontos para o abate, o que força a subida dos preços.

“Hoje, estamos saindo da fase de retenção, os preços do bezerro estão começando a cair, o que sugere que a fase de baixa do ciclo está em curso e deverá aumentar a oferta de boi gordo – e de carne bovina – a partir do próximo ano”, projeta Pimentel. Portanto, a alta no consumo de carne bovina deve ser retomada a partir de 2023, estima a especialista.

Migração para outras proteínas

Ainda de acordo com a presidente da Agrifatto, o consumo de carne de frango e de ovos tem sido beneficiado por esse movimento de baixa da carne bovina nos últimos anos. “O brasileiro tem que encontrar um substituto de alguma forma e o frango é o principal”, afirma. Além do menor valor agregado ao quilo da proteína de aves, os preços da avicultura de cortes estão sendo beneficiados pelo aumento da disponibilidade per capita, que tem acontecido nos últimos três anos em sentido oposto ao da carne bovina.

De 2018 para 2021, houve aumento de quase 15% na disponibilidade per capita de proteína de frango, indo de 44,5 quilos por habitante para 51 quilos até novembro do ano passado, segundo o Conas.

Texto: Stéfanie Rigamonti – Fonte: TC

Siga o Compre Rural no Google News e acompanhe nossos destaques.
LEIA TAMBÉM