Livre mercado de genética bovina está em risco novamente no Brasil

MAPA quer estabelecer regras e procedimentos para a inscrição de reprodutores em centros de coleta e processamento de sêmen; estudo recente revelou que 70% dos touros que disseminam genética no país estão fora do sistema

Em abril de 2022 o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) remeteu um ofício ao superintendente técnico da Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ), Luiz Antônio Josakian. O ofício pedia à ABCZ a revisão dos critérios apresentados pela Associação, pois a Instrução Normativa 13/2020 estabeleceu regras e procedimentos para a inscrição de reprodutores em centros de coleta e processamento de sêmen visando promover ganhos genéticos aos rebanhos nacionais.

O projeto havia sido arquivado pela então Ministra Tereza Cristina, entretanto, através de representantes do atual Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) foi trazido à tona novamente. Nesta terça-feira (09) ocorrerá uma reunião do Conselho Deliberativo Técnico (CDT) na sede da ABCZ, em Uberaba, para mais uma vez os membros do conselho votarem para a aprovação, ou não, da Instrução Normativa.

Caso seja aprovado pelo conselho apenas os reprodutores com avaliação igual ou inferior a DECA 5 tenham acesso às centrais de inseminação a fim de coleta e comercialização de sêmen.

Confira algumas regras estabelecidas:

  • Peso à desmama – menor ou igual a Deca: 4;
  • Peso ao ano – menor ou igual a Deca: 6;
  • Peso ao sobreano – menor ou igual a Deca: 5.

As DECAs são uma forma de avaliar e agrupar os melhores animais avaliados para aquela característica ou para o Índice ABCZ. Essa é uma forma de classificar os animais de uma maneira mais clara, indicando a avaliação e a visualização dos animais superiores e inferiores.

A diretoria atual, encabeçada pelo presidente da ABCZ, Gabriel Garcia Cid, divulgou uma carta defendendo o livre mercado na comercialização de sêmen, regulado apenas por regras mínimas que garantam a procedência e a consistência do material genético a ser disseminado. Tal posicionamento visa permitir que diferentes conceitos e trabalhos de seleção possam ser acessados pelo mercado, especialmente quando se considera a diversidade das demandas e sistemas de produção existentes no país.

Segundo Robson Luiz de Padua, mais conhecido como Padu, infelizmente o posicionamento de alguns criadores, buscando por uma reserva de mercado e olhando somente para o seu bolso não tem o mesmo posicionamento, o que é simplesmente inaceitável e demonstra claramente uma política de favorecimento a uma ala de criadores, ou de uma linha genética, mostrando mais uma vez que parte da ABCZ é tendenciosa, sem considerar o prejuízo genético que a aprovação deste fatídico assunto trará a todas as raças envolvidas.

“A todos os integrantes do CDT, sugerimos que reflitam muito bem sobre seu voto, pois toda ação traz consigo uma reação e certamente a mais drástica será a inclusão do nome de cada um dos senhores nos anais da história do ZEBU como aquele que ajudou a acabar com o trabalho sério de muitos, favorecendo alguns poucos, colocando em risco eminente o futuro de um ZEBU, rústico e produtivo que ainda temos” – ressaltou Padu.

Ainda segundo ele, caso haja a aprovação, que seja isonômica, ou seja, que valha para TODAS as raças zebuínas, independentemente de ser PA, PO, POI, LEI ou qualquer outra denominação que exista.

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Foto: Divulgação

Quem também disse estar temerário com a possível mudança nos critérios para reprodutores zebuínos é o Médico Veterinário e titular do Nelore Cabeceira, Prof. Arley Coelho da Silveira. O criador afirma que no âmbito do progresso genético estes programas não são capazes com a atual metodologia, de atender uma exploração sustentável em termos de acuidade de dados e resultados convincentes.

“Assim como temos oportunidade de observar a falta de preservação das características inerentes a um zebuino produtivo em condições adequadas ao retorno econômico para o criador. Estamos à favor do Livre Mercado e à preservação dos aspectos raciais. Sem mais, despeço-me Atenciosamente” – ressaltou o criador.

Paulo Leonel, do Nelore ADIR e associado da ABCZ, nos disse que à partir do momento que a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu registra um animal, ele passa a ser um individuo melhorador, logo o criador tem o direito de promover a disseminação desse material genético, caso isso não seja seu objetivo qual seria? O criador ainda indaga a entidade sobre qual a necessidade do registro do animal, já que não poderá disseminar a genética do mesmo.

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Nelore ADIR / Foto: Olívia Carvalho

Não podemos ter um direcionamento contra o livre mercado de genética, cada criador compra o que deseja e considera melhor para o seu rebanho, desde que tenha o registro definitivo da entidade. Não vejo o menor sentido do governo direcionar que genética o criador deve consumir, isso não é visto no milho, arroz e feijão”. O criador finaliza questionando qual é o interesse do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) em proibir parte da genética disseminada no Brasil, até porque o Ministério é responsável pelos programas sanitários nacionais, não sendo seu papel direcionar a genética bovina brasileira.

Caso essas regras sejam aprovadas, muitos touros que estão em centrais de inseminação poderão ser descartados, pois não atendem aos requisitos da Instrução Normativa. Inclusive nós consultamos alguns grandes raçadores, pilares da raça no Brasil e eles também poderiam hoje, caso estivessem vivos, serem removidos da lista de “Touros Melhoradores”. Por exemplo: Gabillamu da SC, Gim de Garça, Ludy de Garça, Hanuman da Matinha e dezenas de outros touros.

Ressaltamos que as regras para seleção em vigor foram consolidadas em 2020 na ocasião liderado pelo atual presidente da Associação, Gabriel Garcia Cid, na época Diretor Técnico, de um processo que se iniciou em 2017, pelo Departamento Técnico da ABCZ. Em 2020 e 2021, foi apresentado e aprovado pelo MAPA um conjunto mínimo de valores que se aproximava do livre mercado. Entre as argumentações da ABCZ, está o fato de que apenas 1/3 dos rebanhos de seleção de raças participa dos programas de melhoramento, e 70% estão fora do sistema.

“A genética não é matemática, quando limitamos a seleção a somente alguns critérios podemos perder alguns animais que poderão ou poderia contribuir e muito com a genética nacional, podemos citar aqui o genearca Karvadi, que chegou ao Brasil no começo dos anos de 1960, seu pedigree mudou a genética do Nelore brasileiro, gerando Dumu, que gerou o Gim de Garça, que gero o Ludy que gerou tantos outros de tantas qualidades tipo Taju, Bitelo SS, Panagpur que gerou Enlevo e assim por diante. Imagina se esta geração tivesse este critério” – destacou o criador Lúcio Cornachini do Nelore IZBR e membro do CDT .

Outra destaque importante citado por Lúcio é, caso seja aprovado desta forma, estaremos fortalecendo os touros CEIP que tem outros critérios adotados pelo MAPA e limitando a genética dos animais Puros de Origem (PO). “Isso será um prejuízo genético muito grande e além de tudo vamos limitar as raças de menor volume a ter a variabilidade genética tais como: Indubrasil, Nelore pelagens, Tabapuã, Sindi entre outras” – finaliza o criador.

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