Com a diversidade funcional, aumenta-se a microbiologia do solo, a produção de fitomassa, o aporte de exposição, o que resulta em aumento na produtividade.
Durante o 2º Simpósio de Sistemas Intensivos de Produção (II SIP), realizado na última semana em Campo Grande (MS), o Painel “Importância agronômica e econômica da diversificação dos cultivos nos sistemas de produção”, moderado pelo pesquisador Rodrigo Arroyo Garcia, da Embrapa Agropecuária Oeste, trouxe reflexões sobre a produção agropecuária nacional.
A palestra inicial foi do professor Edicarlos Damasceno de Souza, da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), com o tema “Rotação e diversificação de culturas como estratégia de intensificação e sustentabilidade”. “Sistemas de produção devem ser economicamente viáveis, mas também precisam promover benefícios ecossistêmicos. Entendemos o que é intensificar o sistema de produção sem deixar de melhorar a saúde do solo. Temos visto que há relação entre melhorar a qualidade do solo e o rendimento dos cultivos”, afirmou.
O professor faz parte da Aliança Sistemas Integrados de Produção Agropecuária (Aliança SIPA) que tem como objetivo gerar sistemas inteligentes de produção, formados pelas Universidades Federais do Rio Grande do Sul, Paraná e Rondonópolis, além de parceiros da iniciativa privada “Temos experimentos de pesquisa de longa duração com mais de 30 anos de produção, publicada em revistas de alto impacto”, garante Damasceno.
Ele lembrou que, em 2050, o planeta terá 10 bilhões de pessoas e será necessário em torno de 56% a mais de produção de alimentos. O desafio é aumentar a produção, experimentar a pressão por abertura de novas áreas. “Também precisamos reduzir em 50% a emissão dos gases de efeito estuga (GEE) e mitigar o que já foi emitido. Por isso, é importante utilizar e criar sistemas de produção mais intensivos e com serviços ecossistêmicos”.
Uma das alternativas para que isso efetivamente aconteça é sair da especialização que é a monocultura. “Na diversificação, estamos ampliando, recuperando algumas funcionalidades que os sistemas naturais oferecem, como ciclagem e reciclagem de nutrientes”, afirmou Damasceno. Na comparação feita pelo professor, ele mostra que o arroz em plantio convencional pode produzir 547 kg/ha de proteína consumível; já na área que houve plantio de arroz-soja-azevém a produtividade foi de 913 kg/ha.
Intensificar e diversificar ao mesmo tempo é aumentar a eficiência agrícola, utilizando técnicas e tecnologias inovadoras para suprir a demanda por alimentos e garantir segurança alimentar, por meio de processos levem o sistema a um estado de diversidade funcional. “Aumentar a diversidade do sistema não é necessariamente ter um maior número de espécies, porque várias espécies podem ter a mesma funcionalidade ecossistêmica e, desta forma, não existe diversidade funcional”, ponderou.
Para entender, ele deu os exemplos do consórcio braquiária + milho + aveia que são três gramas com funcionalidades semelhantes, ou seja, não há diversidade funcional. Já o consórcio entre braquiárias, girassol e nabo são plantas de famílias diferentes, sistemas radiculares e funcionalidades diferentes, tendo como resultado o aumento da diversidade florística e funcional do sistema de produção.
Ele citou ainda o consórcio de braquiária, girassol, trigo mourisco, nabo, feijão-caupi bovino integrado como um nível excelente de diversificação, “porque, além da diversidade de plantas, coloca-se outro elemento que é o gado”. As raízes de gramíneas, na camada superficial, aumentam e se aprofundam três vezes mais na condição pastejada, porque o animal estimula o perfilho e o enraizamento maior intensifica a atividade microbiana. Em números, o resultado são 4,5t MS/ha em área com pastejo e sem pastejo, 1,5t MS/ha.
Com a diversidade funcional, aumenta-se a microbiologia do solo, a produção de fitomassa, o aporte de exposição, o que resulta em aumento na produtividade. “Nossa agricultura já foi baseada em insumos. Temos que trabalhar mais em processos aliados aos insumos”, finaliza Damasceno.
Leandro Zancanaro, pesquisador da Raízes Consultoria Agrícola, ministrou a palestra “Rotação de culturas e diversificação para a estabilidade do sistema de produção”. A análise de solos é muito importante em sistema diversificado, mas por si só não reflete a capacidade do solo produzido. “As culturas alteram a capacidade do solo produtivo. Às vezes, a análise de solo é próxima, mas têm produtividades diferentes”, disse Zancanaro.
A produtividade em um experimento após 11 anos foi 65 sc/ha de soja (pousio), 91 sc/ha (soja-milheto), 97 sc/ha (soja/braquiária, soja/milho e soja/crotalária). Em áreas diversificadas, a atividade enzimática, a qualidade microbiana é mais intensa. Em anos menos chuvosos, a diversificação proporciona mais estabilidade. A sequência de culturas ao longo do tempo também é a melhor estratégia para reduzir a disseminação de nematóides. “A diversificação não pode ser esporádica, o sistema tem que ser cíclico e planejado”, alerta Zancarano.
Alexandre Cunha, pesquisador da Embrapa Algodão, enfatizou que a intensificação ocorre cada vez mais, mas não significa diversificação. Ainda falta muito para sermos um sistema diversificado. Sua palestra foi sobre a “Diversificação de cultivos em sistemas de produção de algodão”.
Lembrou que, antigamente, a cultura do algodoeiro estava em um sistema com revolução e sem palha. Depois, os produziram a realizar a sucessão soja-milho, assim como soja-algodão. “É um sistema intensivo, mas não diversificado. Muitas vezes, o produtor acha que faz Sistema Plantio Direto (SPD) só porque ficou sem revólver o solo dois anos seguidos, mas gira no terceiro ano. Isso não é SPD”. A partir do momento que tem diversidade e tem SPD, já é possível melhorar o estoque de carbono no solo e, com isso, atender a política pública brasileira”, alertou Cunha.
No algodão, pode-se trabalhar com culturas de serviço ambiental, como sorgo, milheto, crotalária e estilosantes. A diversificação com plantas de cobertura fornece aporte de palha (semeadura direta) e produção de raízes (proteção e melhoria do solo). “Não tem como aumentar o carbono no solo se não houver aporte de palha, de matéria orgânica no solo. Em nosso ambiente tropical, a perda do carbono e do material vegetal é alta e rápida”, declara o pesquisador.
Monocultivo, sucessão de culturas, com resultado de baixo aporte de palha e revolução do solo são os problemas atuais. Mas o produtor não precisa abrir mão do algodão e da soja. A recomendação é que se faça a diversificação com outras culturas em alguns talhões “e comece a transformar o discurso em prática. O agricultor tem que perceber que vai ter benefícios com a diversificação por aumentar biomassa, carbono, estabilidade produtiva, estruturação do solo, retenção de água e biodiversidade”, garante Cunha.
O Sistema Plantio Direto em área de algodão resultou de 10,5@ a 16@ de fibra a mais quando comparado ao convencional, além de 10 sacas de soja a mais no SPD. Na safra 2019/2020, o algodão obteve 341@/ha em área sem diversificação e 401@/ha com diversificação, na mesma área experimental, com repetição, mesmo período de semeadura e mesma cultivar. “O SPD do algodoeiro resulta em maior segurança produtiva, principalmente em períodos de veranicos, com redução de arranhões e possui maior eficiência das adubações, sobretudo potássio”, informou o pesquisador da Embrapa Algodão.
Luis Carlos Bergamaschi, engenheiro agrônomo da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), disse que os produtores na Bahia têm obtido bons resultados com o Sistema Plantio Direto quando envolvem milho com braquiária e plantio direto de algodão. “Viabiliza o plantio. É plantar rápido e ser eficiente. Eu acredito neste sistema. É o básico e temos entregado milho, algodão e soja”, garantiu.
Outra vantagem, do SPD, garantida por Bergamaschi, com soja em sucessão, soja-braquiária ruziziensis é que se diminui o risco de fogo no período seco e melhora-se o manejo de plantas daninhas. Os problemas com plantas daninhas, como buva e capim-amargoso, também têm sido solucionados com o uso da braquiária.
Na sucessão de culturas em áreas que não conseguem usar o milho, ele indica o uso do milho e do sorgo. “Temos que descobrir a melhor variedade, melhor época e população ideal da cultura (pode ser de soja, de milho ou de algodão). Precisamos alinhar os outros conhecimentos fitotécnicos à diversificação e novas pesquisas. É bom para nós, para a agricultura brasileira, para toda a sociedade”, finalizou Bergamaschi.
Fonte: Embrapa Agropecuária Oeste
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