Joãozito, como era conhecido, faleceu em 2011 com 91 anos de idade; um dos mais tradicionais selecionadores de Nelore do país, João Batista de Andrade
Joãozito, como era conhecido, faleceu no auge de seus 91 anos no dia 16 de junho de 2011. Dono de um dos mais tradicionais criatórios de Nelore do país, era considerado um dos melhores selecionadores do mundo, dedicou sua vida a Pecuária brasileira e deixou um grande legado. Nascido em Jeremoabo, na Bahia, ele criava bovinos das raças Nelore e Cangaian, além de cabras e ovinos na Fazenda Trindade. De família de pecuaristas, iniciou a seleção de Nelore em 1942 com seis vacas e um gado com característica do legítimo Nelore indiano de Ongole, oriundos do rebanho do pai, Manoel Vieira de Andrade.
Joãozito possuía além da Fazenda Várzea dos Gatos, duas outras propriedades, o Rancho Trindade, em Feira de Santana e a Fazenda Trindade, em Cícero Dantas, local onde iniciou a seleção do Gado Nelore na década de 40.
Joãozito desenvolvia um trabalho em consanguinidade e criava o rebanho em regime de pasto e caatinga, sem suplementação mineral. O objetivo era obter animais com rusticidade, fertilidade, habilidade materna, conformação de cobertura de carcaça, mansidão e valorização econômica.
No sertão da Bahia, o pecuarista Joãozito Andrade formou o plantel Nelore mais puro do Brasil
O criador também realizou experiências com a raça Kangayan. Segundo suas pesquisas, grande parte do rebanho nacional possuía sangue Kangayan. Foram 30 anos de pesquisa e experiência, período em que o rebanho foi preservado em estado de pureza, contribuindo para a conservação do patrimônio genético da raça.
Com um plantel de cerca de 1,3 mil animais da raça Nelore, sempre fez questão de preservar as linhagens POI Akasamu e Padhu, dois reprodutores trazidos da Índia na década de 60 pelo braço direito do criador, Torres Homem da Cunha, um dos responsáveis pela histórica importação de 1962.
Joãozito recebeu várias homenagens ao longo de sua vida. Uma delas foi o Mérito da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), em 1992. A honraria é concedida pela associação a criadores e profissionais do setor que contribuem para a evolução do zebu no país.
O criador era referência também na seleção da raça de Caprinos Canindé (na foto em destaque no artigo). O plantel de 3,2 mil exemplares é considerado o maior do mundo e o trabalho de resgate e preservação dessa raça fez com que ganhasse prestígio internacional.
Joãozito sempre foi um homem sertanejo de muita simplicidade, suas origens têm tudo a ver com o negócio que construiu na pecuária. Foi lá, em meio à natureza rude da caatinga, que ele formou o plantel de gado Nelore Puro de Origem Importado (POI) mais puro do mundo, que reúne semelhanças idênticas ao primitivo gado Ongole da Índia. E isso se deu de forma natural: gado criado no pasto, monta natural e sem suplementação mineral. “Eu não fiz nada, só respeitei a necessidade dos animais na natureza, que lhes ofereceu o necessário para sobreviver na caatinga”, dizia Joãozito em material retirado de entrevista à Dinheiro Rural.
Origem do Seu Joãozito
A vocação de Joãozito para a pecuária sempre foi nata. Com um ano de idade, ganhou de presente uma vaca curraleira, proveniente do plantel de Garcia D’Ávila, o conde que povoou o nordeste brasileiro com gado. Aos 22, fez o seu primeiro negócio: trocou a curraleira por seis vacas velhas e um garrote que o pai comprara de criadores de Nelore do Recôncavo. Com o dinheiro que sobrou, adquiriu dois hectares de terras – origem da Fazenda Trindade. Em Minas Gerais, conheceu o lendário pecuarista Torres Homem Rodrigues da Cunha, que lhe cedeu algumas novilhas e, assim, foi aumentando o rebanho.
“Não me considero dono de nada, sou um administrador”, costumava afirmar. O fazendeiro, que quando jovem chegou a fugir do cangaceiro Lampião, temendo que este lhe roubasse suas vacas, sempre creditou a pureza do seu rebanho ao manejo simples que adotou. “Os animais têm hora para acordar, dormir, comer, ruminar”, diz. “Eu os respeitei e eles preservaram suas qualidades nativas.”
Seu rebanho Nelore seguia as linhagens de Akasamu e Padhu, touros importados da Índia em 1967 e que fecharam seu plantel de cruzas consanguíneas perfeitas. “Fiz um trabalho de consanguinidade, tendo como base animais selvagens, que se mantêm em estado de pureza sem sinais de degenerescência”, dizia Joãozito. O trabalho de observação, segundo ele, o levou a acompanhar de perto os partos de todas as suas vacas por pelo menos 20 anos. “Eu vi todos porque precisava saber se haveria anomalias, anotar as qualidades do bezerro e ajudar caso fosse preciso”, explica.
Para facilitar, ele mandou construir o curral bem próximo à janela de seu quarto. “O critério é simples: os animais que sobrevivem à seca da caatinga, sem suplementação alimentar, foram adaptados. Os que não sobreviveram foram eliminados do plantel.” A pureza deste rebanho é tão rara que, em 1994, o presidente da Associação Ongole da Índia, Narendra Mallapuddi, pediu para conhecer o Nelore Trindade, em busca de exemplares que pudessem recompor o plantel indiano. “Eu não acreditei quando recebi a carta dele”, emocionou-se Joãozito, que também visitou a Índia para conhecer os Ongoles.
Este manejo simples dava ao Nelore Trindade uma qualidade difícil de se obter, a docilidade. Na Várzea dos Gatos, os rebanhos atendiam pelo nome. Joãozito chamavaos bois e eles vinham, faceiros entre os pés de xiquexiques que se espalham pelo pasto, até chegar a ele, pedindo carinho.
A Pecuária brasileira sempre se lembrará do mestre e selecionador Joãozito Andrade e seu legado deixado as futuras gerações, seus olhos e observações contribuíram de forma decisiva para o sucesso do gado Nelore no Brasil.