A aprovação do plano de recuperação judicial do Grupo Sperafico Agroindustrial foi confirmada tanto pelos credores quanto pela Justiça. Esta companhia, uma gigante do agronegócio do Brasil, já chegou a registrar um faturamento superior a 1,2 bilhão de reais durante a segunda metade da década de 2000.
Mais de um ano após iniciar seu processo de recuperação judicial, que incluiu até a mudança do estado onde o caso estava sendo julgado, o Grupo Sperafico Agroindustrial finalmente viu seu plano de recuperação ser aprovado pelos credores e validado pela Justiça. Reconhecida como uma das empresas precursoras no agronegócio brasileiro, a Sperafico vivenciou sua melhor fase em meados do ano de 2007, quando chegou a faturar R$1,2 bilhão com o plantio de soja, milho e trigo.
O juiz Eugênio Giongo, da 3ª vara cível de Toledo (PR), aceitou o pedido de recuperação judicial da Sperafico Agroindustrial e homologou o plano apresentado pela empresa. No dia 11 de dezembro, a assembleia de credores havia aprovado o plano.
Fato é que, assim como inúmeras outras empresas e produtores do setor que entraram em recuperação judicial neste ano, diversos fatores contribuíram para a crise financeira da empresa, incluindo dois litígios judiciais significativos, perdas parciais na safra de soja, instabilidade econômica no Brasil, flutuações na taxa de juros e variações cambiais. As dívidas acumuladas no processo de recuperação judicial totalizam 1,3 bilhão de reais.
Perfil do Grupo Sperafico Agroindustrial
A trajetória da Sperafico começou com a migração da família homônima de Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, para Toledo, no Paraná. Lá, Ismael Sperafico e seus três filhos, Dilso, Itacir e Levino, gerenciavam uma loja de secos e molhados.
Na década de 1960, a família expandiu suas atividades para a compra e venda de suínos, distribuindo-os para cidades como Ponta Grossa, São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Esse negócio levou à aquisição dos primeiros caminhões para transporte de animais. No final dos anos 60, iniciaram o cultivo de soja, trigo e milho.
Esses foram os primeiros passos para a consolidação do grupo, que mais tarde se diversificou na comercialização de insumos, industrialização, refino e venda de óleos vegetais, moagem de trigo e soja, produção de alimentos derivados e rações para animais.
As décadas seguintes marcaram um período de expansão e diversificação, com a criação de condomínios agroindustriais, produção de rações e desenvolvimento logístico. A Sperafico vivenciou sua melhor fase em meados do ano de 2007, quando chegou a faturar R$1,2 bilhão com o plantio de soja, milho e trigo. A empresa também atuava na produção de lecitina de soja, óleo vegetal, óleos refinado e enlatado, gordura vegetal, farelo, rações para animais, sabão em barra e farinha de trigo.
O grupo chegou a administrar 34 armazéns, com capacidade total para 1 milhão de toneladas de grãos, e cinco unidades de esmagamento de soja, com capacidade diária para esmagar 7 mil toneladas.
Início da crise que levou a Sperafico a recuperação judicial
A crise na Sperafico teve início em 2008, desencadeada por um aumento nos preços da soja e agravada pela crise financeira global, dificultando o pagamento de fornecedores e empréstimos bancários. Dois eventos específicos aprofundaram a crise, culminando na necessidade de recuperação judicial.
O primeiro evento foi uma negociação mal sucedida com a Glencore, uma multinacional suíça. A Sperafico, buscando enfrentar as adversidades econômicas, negociou a venda de ações de duas de suas empresas para a Glencore, uma das principais traders de commodities e matérias-primas. O acordo previa a aquisição de 51% das ações por 128 milhões de reais e um financiamento adicional de 240 milhões de reais para capital de giro. No entanto, apesar de cumprir todas as exigências, a Glencore desistiu da compra, resultando em um prejuízo financeiro de cerca de 30 milhões de reais para a Sperafico.
Outro fator que exacerbou a crise foi a falência das Fazendas Boi Gordo no início dos anos 2000, com dívidas de 2 bilhões de reais. A Sperafico havia arrendado duas fazendas da Boi Gordo no Mato Grosso e comprou parte de uma empresa relacionada, o que levou a um entendimento judicial equivocado de responsabilidade da Sperafico pelas dívidas da Boi Gordo. Isso resultou no bloqueio temporário de bens da empresa, afetando sua operação no mercado.
Além disso, a Sperafico investiu nas áreas arrendadas, mas perdeu esses investimentos quando as terras foram vendidas a outras empresas. Estes problemas, juntamente com a quebra de safra em 2021 e 2022, contribuíram para a situação de dívida bilionária enfrentada pela empresa atualmente.
Plano da Gigante do Agro para deixar a crise e voltar a crescer
Inicialmente, a Sperafico deu entrada em seu pedido de recuperação judicial em Campo Grande (MS), em junho de 2022. O argumento era que, apesar de a companhia ter sede no Paraná, era em Mato Grosso do Sul que o maior volume financeiro era gerado e onde as subsidiárias teriam melhores condições de honrar os compromissos.
A empresa reportava dívidas pouco superiores a R$ 1 bilhão. O pedido foi aceito pelo juiz José Henrique Neiva de Carvalho e Silva, da Vara de Falências de Campo Grande, que nomeou a Cury Sociedade Individual de Advocacia como administradora judicial.
Seis meses depois, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul determinou a transferência da RJ para Toledo (PR). Com 60% dos credores no Paraná, a ideia de trazer a recuperação para o Estado tinha por objetivo aproximar os credores do processo.
Entre os maiores credores da Sperafico estão a Imcopa, a Glencore, a cooperativa LAR, os bancos Voiter, Daycoval, Santander, Bradesco e Safra e o fundo PCG-Brasil. “Com a homologação do plano, os primeiros a receber são os credores trabalhistas, a partir de janeiro”, disse Isabella Nunes, advogada da DASA Advogados, representante da Sperafico.
O plano de reestruturação prevê o que será feito para pagamento dos credores, sendo definido que:
- Credores trabalhistas: será aplicado um deságio de 73,5%. Para 15% dos credores, o pagamento será feito em um ano. Para o restante, em 20 anos.
- Credores com garantia real: será aplicado um deságio de 78,2% sobre o valor da dívida. O saldo restante será pago em até 20 anos.
- Credores quirografários: será aplicado um deságio de 78,7% sobre o valor da dívida. O saldo restante será pago em até 20 anos.
- Credores microempresas: será aplicado um deságio de 80% sobre o valor da dívida. O saldo restante será pago em até 20 anos.
“Isso foi de fato um grande case para uma recuperação judicial”, afirmou avalia o advogado Daniel Amaral. Ele comentou ainda, segundo a Exame, que ver a dívida passar de 1,3 bilhão de reais para 280 milhões de reais é algo extraordinário.
Processo: 0003537-55.2023.8.16.0170
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