Gestão de crise no negócio rural: entenda o que é e como aplicar

Confira dicas de especialistas de como a gestão de crise pode fazer a diferença no empreendimento agropecuário.

A atividade agropecuária está intrinsecamente ligada ao risco, afinal, o “chão de fábrica” está a céu aberto e depende de uma série de fatores que vão além do domínio humano. Por isso, especialistas são unânimes em apontar que o produtor deve tratar a propriedade como um negócio, uma empresa rural, o que exige planejamento e gestão de crise. 

Para aprofundar sobre o tema e trazer mais dicas ao produtor rural, o Agro Estadão convidou dois especialistas para responder algumas perguntas relacionadas ao assunto. Géri Meneghello, doutor em sementes, servidor técnico administrativo e pesquisador da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), e Andrés Sanches, diretor da Faculdade CNA, abordaram a importância preventiva da gestão de crise e as formas de fazer isso na propriedade rural. 

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O que é gestão de crise?

A crise costuma estar associada a problemas ou situações inesperadas que fogem do controle e que causam algum tipo de dano ou prejuízo. Mas o que fazer para evitar esses momentos e quais são as atitudes a serem tomadas quando surgem essas situações? 

“A gestão de crises leva em consideração o levantamento de pontos críticos de controle, ou seja, os empresários e gestores rurais conseguem reconhecer e prever situações adversas que podem prejudicar a sua atividade agropecuária por safra/ciclo”, alerta Sanches.

Como a gestão de crise ajuda no negócio rural?

No ambiente rural, uma boa gestão de crise pode determinar uma safra boa ou ruim. Por isso, os especialistas são categóricos em dizer que é fundamental a adoção desse processo na administração do empreendimento. 

Além de aspectos como preço, mercado, maquinário, estrutura de armazenagem, gestão de pessoas, financeiro, o produtor rural também tem que lidar com outros fatores, como clima e doenças, que influenciam na tomada de decisão e nesse planejamento de uma eventual crise. 

Uma gestão de crise eficiente consegue mapear as áreas de maior vulnerabilidade dentro do negócio e adotar medidas preventivas ou de contingenciamento nesses casos “Balanceando a probabilidade de ocorrência e o impacto associado, a gente direciona as atividades preventivas. A gente não consegue prevenir todo e qualquer cenário de risco que exista, mas é possível mitigar os mais danosos”, pontua Meneghello.

Foto: Adobe Stock

Quais as principais crises no meio rural?

As crises podem ser de diferentes ordens, tamanhos e impactos. O diretor da Faculdade CNA aponta algumas:

  • Crise de mercado: geralmente associada a alguma questão econômica internacional ou nacional ou até mesmo em um dos elos da cadeia produtiva. Um exemplo recente foi a crise dos insumos, em 2022, ou a crise dos preços baixos do litro de leite, na metade final de 2023. 
  • Crises legais: é preciso estar atento a questões de regulamentação. Isso porque, como outras atividades econômicas, o agronegócio também é, em certa medida, regulado por instituições e o governo. Mudanças no Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc) ou nos calendários de vacinação podem acontecer, por isso, não acompanhar as evoluções normativas pode gerar uma crise no negócio. 
  • Crise de crédito: a estimativa de algumas entidades financeiras é de que o financiamento de uma safra no Brasil gire em torno de R$ 1 trilhão. Muitos produtores só conseguem plantar captando recursos, seja do Plano Safra, ou privados. Uma onda de recuperação judicial, por exemplo, pode fazer com que o crédito diminua ou se torne mais caro, o que tiraria da atividade muitos produtores que já trabalham com margens apertadas. 
  • Crise de mão de obra: o emprego de pessoas na atividade agropecuária é essencial. Algumas culturas ainda utilizam uma colheita manual, por isso, a escassez de trabalhadores pode sim afetar o resultado final do empreendimento. Já outras dependem de mais tecnologia, porém exigem uma mão de obra mais qualificada. Estar atento ao mercado de trabalho da região assim como um plano para gestão de pessoas também faz parte de um planejamento preventivo. 

Quanto aos aspectos técnicos da produção, o pesquisador da UFPel indica que é possível dividir em pelo menos dois grupos de riscos.

  • Riscos de natureza biótica – “São problemas causados por organismos vivos”, classifica Meneghello. Doenças, pragas e plantas daninhas são os principais exemplos. Esses riscos podem ser mitigados ou eliminados com adoção de medidas de controle – defensivos agrícolas, manejo adequado e uso de estratégias e de tecnologia. 
  • Riscos de natureza abiótica – esses são provocados por fatores ambientais. Em geral, estão associados ao clima e ao solo. Alguns são de fácil identificação e reparação, como a solo com deficiência nutricional. Outros, de ordem climática, exigem um monitoramento constante e são mais fáceis de identificar no curto prazo. Nesse caso, é recomendado adotar também medidas paliativas dentro da gestão de crise, como o Seguro Rural. Diversificar o plantio, seja com cultivares diferentes seja com culturas distintas, também é uma estratégia. 

Como lidar com crises no negócio rural?

Uma boa gestão de crise deve adotar alguns pilares. De forma geral, saber o que fazer em um momento de crise começa antes mesmo do momento crítico. Os especialistas elencaram um passo a passo. 

Foto: Adobe Stock

Captação de dados

Entender a cultura ou atividade agropecuária e como ela é feita é o primeiro passo. Quanto mais informações sobre o seu negócio o produtor tiver, mais fácil será a solução de uma crise. Por isso, dados básicos, como fertilidade do solo ou preço do produto no mercado, até dados mais refinados, como quantidade de água no solo, fazem a diferença. 

“Os pontos que devem ser levados em consideração são com relação à disponibilidade e qualidade dos recursos naturais na propriedade rural, tendências de clima e sobre os mercados, em geral. Para se elaborar um bom planejamento é preciso ter visão sistêmica de toda a cadeia produtiva em que determinado negócio estiver inserido”, afirma Sanches. “O empresário rural precisa fazer parte de redes estratégicas de troca de informações, seja nas federações e sindicatos de produtores, por exemplo, seja nos centros de pesquisas agropecuárias e nas instituições de ensino técnico e superior na área do agronegócio”, completa.   

Identificação de riscos

Uma vez que o produtor consegue ter um panorama da atividade, é preciso traçar os potenciais riscos, ou seja, as crises que podem existir, como os pontos de vulnerabilidade do negócio. 

Vale lembrar que essa análise também deve ser acompanhada com uma determinação de probabilidade. Por exemplo, as chances de uma nova pandemia a nível global são menores do que as chances de queda nos preços por fatores como guerras internacionais. 

Aliado a isso, é importante medir também os impactos. Um motor de trator estragado causa mais impacto na colheita do que uma peça simples com defeito. “Identificar a probabilidade de ocorrência, e depois, na ocorrência daquele evento, qual é o impacto que ele vai ter no meu negócio”, orienta Meneghello.

Plano de ação

Determinada as prioridades dentro do universo de crises, é preciso delimitar estratégias ou ações para enfrentamento dessas crises ou para eliminação das chances de ocorrência. É melhor pensar em medidas de respostas a esses momentos sem estar com o problema do que pensar e executar essas medidas quando o problema já chegou. 

Nesse ponto, quanto mais detalhado for o planejamento melhor será. Deixar claro o que fazer, como fazer, quem e quando fará acelera o tempo de resposta, com precisão no atendimento ao problema e aumento da crise. 

Comunicação

Deixar funcionários e outros membros da equipe de trabalho cientes do momento e das obrigações também ajuda no enfrentamento à crise. Por exemplo, formar os empregados para detectar pragas em uma cultura pode promover o ganho de horas ou dias no controle agrícola. 

Monitoramento constante

Alguns aspectos, como já citados pelos especialistas, demandam um acompanhamento rotineiro. Nesse sentido, estar atento a possíveis mudanças seja no cenário econômico mundial, seja climático, faz a diferença no resultado final. Geralmente, quanto mais rápido for a resposta para uma crise, menos danosa ela tende ser. 

Oportunidades da crise no meio rural

Fazer uma análise da crise após ela acontecer traz mais segurança e conhecimento no planejamento. Além disso, é possível “fazer do limão uma limonada”. Muitas tecnologias só surgiram a partir da identificação e entendimento de problemas inesperados. É o caso da vespa brasileira que ajuda no combate ao percevejo-marrom na cultura da soja e que foi mostrado pelo Agro Estadão. 

Outro ponto é que esse feedback no pós-crise pode indicar novas rotas ou estratégias. Por exemplo, a adoção de uma cultura para quebrar ciclo de fungos ou combater nematóides, como é o caso do trigo mourisco. 

Fonte: Agro Estadão

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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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