Dono de uma área de 120 hectares que herdou do pai, o produtor começou a selecionar vacas girolando que têm apenas a beta caseína A2A2
Ganha cada vez mais espaço no Brasil a produção de leite A2, aquele que atende à demanda de pessoas alérgicas ao leite, porém boa parte dos produtores ainda não recebe um centavo a mais pelo leite especial ao entregar o produto nos grandes laticínios. A saída, então, é investir na verticalização. É o que tem feito o produtor e advogado mineiro Tomáz de Aquino Rezende, cuja família Rezende Gontijo produz leite há 200 anos na fazenda Grotadas, em Santo Antônio do Monte, que fica a 228 km da capital mineira, Belo Horizonte. Dono de uma área de 120 hectares que herdou do pai, o produtor começou a selecionar vacas girolando que têm apenas a beta caseína A2A2, a mesma encontrada no leite materno, que, de acordo com pesquisadores da Embrapa Gado de Leite, não causa desconforto em pessoas com alergia ao leite e tem melhor digestibilidade.
Rezende conta: “participei de um leilão na Expozebu há dez anos e comecei a estudar esse leite especial como uma oportunidade de agregação de renda nessa atividade. Fiz alguns experimentos e vi nessa produção o leite do futuro”. Ele diz que mandou fazer testes em todas as suas vacas e passou a investir em melhoramento genético e descartar aquelas fêmeas que não tinham a exclusividade da proteína A2A2. Há dois anos, toda sua produção passou a ser do leite A2, mas ele não conseguiu até agora nenhum bônus no laticínio Embaré, que recolhe uma média diária de 1.000 litros produzidos na fazenda Grotadas. Por isso, o produtor decidiu dobrar sua produção diária de leite, captada com ordenha mecânica, com a aquisição de mais vacas e mais tecnologia e investiu de R$ 350 mil a R$ 500 mil na instalação de um laticínio e de uma queijaria na fazenda.
Rezende continua: “vou pasteurizar e envasar o leite A2, além de produzir queijo minas artesanal do tipo canastra para quem tem alergia ao leite comum”. Ele está finalizando a nova sala de ordenha, o laticínio e a queijaria em formato redondo de queijo, mas ainda depende das licenças para passar a operar. “Queria oferecer o leite A2 em garrafa plástica, mas a logística de armazenamento das embalagens se mostrou bem complicada, assim como o custo. Decidi, então, pasteurizar e envasar o leite em saquinho e oferecer ao consumidor da região de Santo Antônio por um preço mais acessível”, diz o produtor, que se formou em direito graças ao trabalho como retireiro de leite. Além de tirar o leite de suas vacas, ele coletava o produto dos vizinhos e levava para o laticínio.
Rezende calcula que seu leite especial em saquinhos deva custar por volta de R$ 5 ou R$ 6, o que já seria o dobro do que ele recebe hoje da indústria. Ele, no entanto, não pretende parar de fornecer para a Embaré. “Devo manter pelo menos um 500 litros por dia para a eventualidade de ter problemas no meu laticínio”.
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A fazenda Grotadas investe, além do leite A2, em sustentabilidade, segundo seu proprietário. Ele já tem 140 placas de energia fotovoltaica e pretende dobrar a estrutura. As placas foram instaladas em estacas de 4 metros, criando uma área de sombra e conforto para as vacas criadas a pasto na pista de trato, enquanto esperam a ordenha duas vezes por dia. A fazenda produz também biogás que fornece água quente para higienização da área de ordenha, além de aproveitar os dejetos da produção como biofertilizante nos pastos. A propriedade possui também uma estação de tratamento de esgoto (ETE), construída no ano passado, que trata a água utilizada nos processos lácteos.
ABRALEITE
O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite), Geraldo Leite, diz que até as indústrias começarem a comprar o leite A2 pagando um diferencial, a saída para os produtores agregarem renda é mesmo construir seu próprio laticínio, mesmo de porte pequeno. Segundo ele, já há dezenas de produtores investindo no negócio, mas ainda não há estimativa desse mercado.
Um dos pioneiros e maiores produtores do A2 é o laticínio Letti, da fazenda Agrindus, de Descalvado (SP), que pertence a Roberto Jank. Com 1.900 vacas em lactação, ele produz 24,5 milhões de litros por ano entre leite A e A2. Jank conta que só no final de 2021 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a alegação de funcionalidade do leite A2, ou seja, autorizou a inclusão no rótulo das embalagens de leite A2 da frase “Leite produzido a partir de vacas com genótipo A2A2”. Além de leite, o laticínio produz manteiga, queijo fresco, creme fresco, iogurtes, coalhadas e doce de leite.
Outro grande laticínio que passou a investir no leite A2 para pessoas com problemas de digestibilidade, não confundir com intolerância à lactose, foi o Xandô, maior produtor de leite do país, com uma média de 85 mil litros por dia. Sediado em Araras, o Xandô lançou o A2 no início deste ano, apostando no nicho de consumidores de maior poder aquisitivo que podem pagar por um leite superpremium que não desencadeia reações inflamatórias no organismo que provocam a má digestão ou fermentação.