Frigoríficos vivem crise grave e podem ter colapso

Mercado interno coloca frigoríficos em situação grave e eles podem estar próximos de um grande colapso diante de margens negativas; E agora?

O cenário atual de mercado interno debilitado e boi em alta, e em evolução, está colocando em xeque as operações dos frigoríficos que não exportam ou exportam muito pouco. Embora a situação seja generalizada, em regiões com muita concorrência pelo animal, geralmente onde estão as grandes indústrias com maior poder de compra, o aperto é mais sentido.

Começa, por exemplo, com o aumento da ociosidade dos médios e pequenos frigoríficos. Dos cerca de 10 mais organizados do Tocantins (fora os grandes), por exemplo, o Sindicarnes no estado calcula até 71% de vácuo ante a capacidade instalada de produção de carne.

Para Gilson Bueno Cabral, presidente da entidade, fica cada fez mais difícil trabalhar nessas condições. Pular dias de abate, paralisar plantas temporariamente, comprar menor volume, entre outras ações, não assegura fôlego. “A ociosidade não elimina todos os custos”, diz.

Os que exportam também sentem o peso da alta do boi, em média de R$ 295/@ no Tocantins, mas conseguem ter fluxo por conta dos contratos firmados e ainda tem o dólar a favor. E como não há sinais de melhora, como se esperaria com a entrada de animais das águas, a estiagem vai chegar pegando um rebanho curto – pela retenção de matrizes -, que dará mais suporte aos preços, acredita o empresário.

E com a China na ponta compradora internacional, enxugando mais a oferta, eleva o potencial de dificuldades das unidades de menor porte, cada vez mais sem capital de giro, afirma Gilson Bueno.

Em Santa Catarina, estado no qual os frigoríficos têm que se virar apenas com a oferta local – livre da aftosa sem vacinação, não tem fronteira aberta para gado de fora -, o Verdi está operando no zero a zero, entre custo de originação e venda. “Já é uma vitória”, avalia o proprietário Ariel Verdi.

A referência de preço no estado é de R$ 298, mas com os incentivos estaduais para novilho precoce e outros, a régua vai de R$ 305 a até R$ 320. O Frigorífico Verdi ainda tem uma pequena participação das exportações, “um bom esquema de distribuição”, e, também, atua com programas como Carne Angus Certificada, “mas está ficando cada vez mais difícil”, pondera o empresário.

“Não é à toa que cada vez a gente fica sabendo de frigoríficos fechando, dando férias coletivas”, diz Yago Travagini, da Agrifatto, consultoria que vê o spread do equivalente físico sobre o boi gordo, para as empresas, em torno de menos 5,89% este ano. E subindo.

“O valor médio dos últimos 10 anos foi de 1,57%”, aponta.

Na visão de Caio Toledo Godoy, da StoneX, a situação está “delicada”, mas pode ter um certo alívio com a chegada de mais bois nas próximas semanas, uma vez que, na sua opinião, ainda vai chegar mais animal pronto da safra de verão. A oferta, mesmo que menor que nos últimos anos, poderá aliviar o preço da @.

Mas o equilíbrio que ainda muitos estão conseguindo é via captação de capital de giro nos bancos. “A batalha”, de acordo com o analista, tem esse alívio com a obtenção de crédito enquanto as taxas de juros estão ainda mantidas mais baixas. 

Ociosidade disparou

A combinação entre escassez de matéria-prima, aumento de custos e um mercado interno enfraquecido já levou os frigoríficos brasileiros a reduzirem em mais de 45% sua produção neste ano, segundo levantamento da taxa de ociosidade do setor feito pela Scot Consultoria.

Na Bahia, Estado que apresenta a maior taxa de ociosidade entre os 13 considerados na pesquisa, esse percentual chega a 60%, refletindo uma dura estratégia de reduzir a operação para controlar os custos.

“A gente percebe que muita indústria está fazendo dois tipos de abate: ou pulando dias da escala, abatendo de duas a três vezes por semana, ou abatendo todos os dias, porém, diminuindo o ritmo de abate diário”, explica Rodrigo Queiroz, analista de mercado da consultoria.

Ele destaca as duas estratégias como as principais usadas pelo setor para fazer frente ao cenário atual. Segundo Queiroz, “todas as indústrias frigoríficas hoje estão com dificuldades de encontrar animais para a abate”, mas o cenário é pior para aquelas que dependem do mercado interno.

“O principal importador hoje da carne brasileira é China e Hong Kong, e essa demanda bem aquecida da China fez com que a procura da indústria frigorífica por esses animais, principalmente as que exportam, aumentasse, prejudicando as indústrias menores que não têm a certificação de exportação”, destaca.

A situação, explica o analista, fez com que a margem de comercialização da carcaça bovina superasse a da carne desossada, tornando mais lucrativo para essas empresas abater os animais e enviá-los para serem processadas em plantas menores.

“Hoje, o cenário encontra-se bem complicado. Falando em desossa, com os preços atuais, a gente está com uma margem de comercialização de praticamente zero”, aponta o analista. Os cálculos da consultoria desconsideram demais custos da operação, como mão de obra.

Para o presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Paulo Mustefaga, este é o pior cenário que uma empresa do setor poderia enfrentar, já que a carne desossada possui maior valor agregado.

“Uma planta que opera com 50%de ociosidade ou às vezes até mais fica numa situação muito difícil. Porque ela tem custos elevados e a receita está baixa por estar operando muito abaixo da capacidade, com dificuldade de honrar os compromissos”, pontua Mestefaga.

Situação “dramática”

Segundo ele, a situação dos pequenos e médios frigoríficos voltados para o mercado interno é “dramática” e o fechamento de unidades cada vez mais frequente. “Às vezes, é a única opção que a empresa tem. Ela não tem como continuar abatendo porque compra matéria-prima cara e o retorno para vender a carne no mercado interno é negativo”, destaca o representante do setor.

Nem a Abrafrigo nem a Scot têm um levantamento sobre o número exato de frigoríficos que fecharam as portas nos últimos meses, mas destacam casos emblemáticos, como a Frigol em Goiás, a uma unidade da JBS em Juína, no Mato Grosso.

Segundo a empresa, o fechamento se deu “por razão estratégica de remanejamento da produção de carne bovina para a unidade de Brasnorte, com estrutura mais moderna e maior escopo de atividades”.

“O cenário é tão complicado que a gente percebe é que muitas indústrias frigoríficas pequenas fecharam, inclusive grandes marcas às vezes têm uma planta ou outra que não podem exportar e estão fechadas”
Rodrigo Queiroz, analista de mercado da Scot Consultoria

Sem perspectivas de uma melhora expressiva na oferta de animais no curto prazo, a situação da indústria para os próximos meses depende da melhora das condições da economia e a retomada do consumo no mercado interno.

Neste sentido, o presidente da Abrafrigo considera fundamental o avanço da vacinação para a retomada da atividade econômica a níveis normais, com a reabertura dos canais de alimentação fora de casa, por exemplo.

“Estamos ainda tratando de coisas muito incertas. Tudo são só hipóteses e cenários. A situação para a indústria vai continuar desfavorável neste ano e, dentro deste contexto, não é difícil a gente imaginar que devam ter outras empresas em situação de fechamento, nem que seja temporário”, conclui Mustefaga.

Com informações do Money Times e do Globo Rural.

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