O transporte de alimentos por grandes distâncias é hoje uma das principais causas das perdas pós-colheita, e contribui para a pegada de carbono da agricultura
Atualmente, a agricultura urbana responde a uma preocupação mundial, que é o distanciamento entre os centros de produção e de consumo.
O transporte de alimentos por grandes distâncias é hoje uma das principais causas das perdas pós-colheita, e contribui para a pegada de carbono da agricultura, devido à utilização de combustíveis fósseis.
Nesse sentido, as chamadas fazendas verticais podem ser uma das soluções para o aproveitamento de áreas urbanas destinadas à produção agrícola intensiva e para a aproximação dos polos de produção e consumo. A observação é do pesquisador da Embrapa Hortaliças, Ítalo Guedes.
Segundo ele, o sistema que envolve a produção agrícola controlada em construções urbanas e prédios, onde todas as variáveis ambientais são controladas, permite o dobro ou até o triplo de desempenho em comparação à agricultura tradicional.
Guedes afirma ainda que a utilização de variedades e híbridos adaptados de forma específica para esse tipo de ambiente e o manejo adequado dos cultivos podem aumentar essa proporção.
“Para se ter uma ideia, hoje a média de produtividade de tomate para consumo in natura em campo aberto deve girar, no Brasil, em torno de 70 a 90 toneladas por hectare; no cultivo em estufa, não são incomuns produtividades de até 200 toneladas por hectare. O cultivo em fazendas verticais tem potencial para mais”, destaca o pesquisador.
“Em experimentos científicos na Holanda, utilizando ambiente controlado com tomate, já foram alcançadas produtividades equivalentes a mil toneladas por hectare. O potencial é grande”, avalia.
De acordo com o pesquisador, o sistema também oferece como vantagens a utilização de áreas urbanas marginais e o decréscimo nos custos de cultivo como os de hortaliças e frutos. “É preciso também considerar que as experiências de plantio em ambiente controlado demonstram o uso muito mais eficiente de nutrientes e água pelas plantas”, acrescenta.
PROJETOS
No mundo, já existem algumas empresas que investem em fazendas verticais ou “plant factories”. Recentemente, o lançamento da startup Plenty, no Vale do Silício (EUA), recebeu atenção especial da mídia. A AeroFarms, também nos Estados Unidos, é outro projeto do gênero em desenvolvimento.
Alguns países asiáticos, como Coreia do Sul e Singapura, têm realizado pesquisas avançadas com o conceito de fazendas verticais. “São países com alta demanda por hortaliças e frutas de qualidade, mas com escassez de terras e limitações climáticas”, afirma Guedes.
No Brasil, o interesse por fazendas verticais ainda é pequeno. No entanto, o pesquisador da Embrapa lembra que há dois fatores que têm aumentado a área de agricultura em ambientes protegidos (neste caso, em proporção mais modesta que as ‘vertical farms’): o crescimento da população urbana, principal consumidora de hortaliças e frutas, e o aumento da incidência de eventos climáticos extremos, que afetam de forma negativa a produção desses dois grupos de cultivos.
“As áreas de cultivo protegido têm se concentrado ao redor de grandes centros urbanos, já começando a formar expressivos ‘white belts’ ou cinturões brancos (em relação à cor do plástico das estufas), como ocorre ao redor de Brasília, São Paulo e mesmo Manaus, por exemplo”, ressalta Guedes.
Ele observa ainda que é crescente o interesse por empreendimentos conhecidos por “roof farms” ou fazendas de teto, cada vez mais comuns em Nova York, que utilizam as coberturas de grandes edifícios, como shopping centers, para a produção de alimentos. “Em Belo Horizonte há um projeto desse tipo em um dos shoppings da cidade”, afirma o pesquisador.
SOLUÇÃO CRIATIVA
Porém, ele ressalta que “no Brasil, um dos fatores que limita o crescimento da produção tecnificada de hortaliças e frutas em ambiente controlado é o baixo consumo deste tipo de alimento pelo brasileiro”.
De acordo com Guedes, em âmbito global, as fazendas verticais não deixam de ser uma das soluções criativas para a agricultura no mundo. “São sistemas que atendem à realidade atual, diante da maior incidência de eventos climáticos extremos, da pressão urbana por terras agricultáveis, da preocupação com a diminuição de perdas de alimentos pós-colheita e da pressão ambiental por uma agricultura mais eficiente no uso de insumos, mais produtiva e menos dependente do uso de terras”.
Fonte: SNA/Rio