Fazenda Roncador aumentou produção em 40 vezes sem cortar uma árvore

A transformação da Fazenda Roncador; como, em uma década, o produtor Pelerson Penido multiplicou a produção em 40 vezes sem cortar uma árvore

O produtor Pelerson Penido Dalla Vecchia tem na memória – e na estante atrás da sua mesa no escritório – o histórico dos diagnósticos socioambientais da Fazenda Roncador, considerada a maior do Brasil, dos últimos 10 anos. A década marcou uma verdadeira revolução em uma das maiores fazendas do país, com 152 mil hectares – área maior que a cidade de São Paulo – movida por boa gestão, tecnologia e monitoramento constante do desempenho. Sua produção cresceu mais de 40 vezes no período, à pecuária somou o cultivo de soja e milho, aumentou a biodiversidade local e neutralizou as emissões de gases de efeito estufa de sua operação. E sem cortar nenhuma árvore, como Penido, CEO do Grupo Roncador e neto do seu fundador, se orgulha em destacar.

Mas não foi sempre assim. Por volta de 2007, a propriedade localizada em Querência (MT) enfrentava um esgotamento da terra e perda de lucratividade. Uma das conclusões para a piora dos resultados econômicos era a prática de uma pecuária extensiva. O desafio, então, era se tornar mais lucrativo e sustentável ao mesmo tempo.

A Produzindo Certo, ainda como Aliança da Terra, testemunhou os esforços dos administradores nessa jornada e se orgulha em ter apoiado a sua transformação. Os técnicos da Produzindo Certo se somaram aos investimentos que já eram realizados na fazenda de intensificação das práticas produtivas e tecnologia para dedicar um olhar exclusivo entre o equilíbrio da produção e o respeito às pessoas e ao meio ambiente.

Em uma propriedade com as dimensões da Roncador, todo o trabalho é superlativo. Só de estradas internas contam-se 700 quilômetros, ao longo dos quais vivem aproximadamente mil pessoas. Após a primeira visita dos técnicos, os administradores assumiram o compromisso de melhoria de 205 itens que poderiam se tornar passivos se não fossem aprimorados.

Entre os temas, Penido destaca o investimento nos espaços de trabalho, garantindo mais segurança e bem-estar aos funcionários – a propriedade passou de 70 para mais de 400 colaboradores em uma década. A gestão das Áreas de Preservação Permanente (APPs) também evoluiu e mais de 30% foi recuperada. Hoje, a propriedade está entre as de melhor score socioambiental da plataforma, com pontuação acima de 90.

Foto: Divulgação

Desde 2008 não se abrem novas áreas na fazenda

Localizada em uma região de transição entre cerrado e floresta, dentro da Amazônia Legal, a Fazenda Roncador precisa manter metade de sua área com mata nativa ou áreas de proteção permanente, conforme o Código Florestal. Além dos 76 mil hectares preservados atualmente, os administradores querem ampliar a cobertura vegetal nativa. Para isso, mantêm um viveiro com cerca de 40 mil mudas de espécies nativas. Com mais áreas conservadas, a fauna também se amplia.

Além de pássaros e pequenos animais, as onças pintadas são cada vez mais presentes na região. Prova disso é a contagem de cabeças de gado abatidas pelos felinos – passou cerca de 90 para mais de 900 em 2018. Mas essa perda não é vista como um prejuízo pelos administradores do rebanho de 70 mil unidades. É, antes de tudo, um indicador de qualidade da biodiversidade local. A fazenda foi a primeira do Brasil a obter o certificado de proteção fornecido pelo Instituto Onça Pintada.

A Roncador integra também outra iniciativa com a Produzindo Certo, dentro do programa de acompanhamento dos fornecedores de carne rubia gallega para o Grupo Pão de Açúcar (GPA) – ação existente desde 2016. E é visitada anualmente pelos técnicos da Produzindo Certo, que avaliam aspectos legais, ambientais, sociais, econômicos, de bem-estar animal e de rastreabilidade.

Fonte: Produzindo Certo

Nesse período, a gestão produtiva e socioambiental foi sendo sofisticada e a fazenda aderiu ainda a outros compromissos, como o Programa 3S, de soluções para Suprimentos Sustentáveis, e o IBS, Instituto Biosistêmico, para consultoria e serviços em agricultura sustentável e desenvolvimento rural.

Um ciclo dinâmico. Cheio de vida

Mais alimentos sendo produzidos sem abrir novas áreas. A porção produtiva se divide entre pecuária (26 mil ha) e o sistema integrado soja-boi (30 mil ha). No modelo de integração lavoura-pecuária, de outubro a fevereiro, o foco é a agricultura, com a criação de gado predominando de abril a setembro. Outros 20 mil ha são usados para cultivo de soja e milho em uma joint venture com o grupo SLC – onde o modelo de produção integrada está no início.

A integração das culturas se traduz em mais produtividade e qualidade. A soja fixa nitrogênio na terra e o estímulo do pastejo (a passagem do gado pelas áreas) aumenta a vida do solo com esterco e urina e gera um capim mais nutritivo. Suas raízes chegam a três metros de profundidade e descompactam o solo criando micro-galerias, que aumentam a permeabilidade ao material orgânico (especialmente CO2) e a palhada que sobra (pelo menos 2,5t de matéria seca) garante a cobertura de solo para o plantio direto da soja, além de permitir a maior umidade e conforto térmico para a próxima cultura da leguminosa.

A prática ainda reduz a necessidade de fertilizantes. A Roncador também tem como compromisso com a redução do uso de defensivos agrícolas – hoje já abaixo dos limites estipulados pela União Europeia – e realiza controle biológico de pragas. O objetivo é expandir o uso de defensivos biológicos em todo o sistema produtivo de grãos nos próximos anos.

Moradias para os funcionários na Fazenda Roncador / Foto: Divulgação

Contribuição para a redução do carbono

O resultado de todo esse processo é uma fazenda carbono positivo. Isto é, as atividades da Roncador absorvem maior volume de gases de efeito estufa do que lançam na atmosfera, colaborando com o combate às mudanças do clima. Na safra 2017/2018, a operação emitiu 82.499 toneladas de CO2 equivalente (tCO2e) ao mesmo tempo em que sequestrou 172.329 tCO2e. Para se ter uma ideia dos efeitos desse benefício é como se as atividades da fazenda retirassem 51 mil carros das estradas por ano.

Essa jornada de transformação da fazenda trouxe ganhos e aprendizados. Gestão e governança são pontos fundamentais. Seu sistema se apoia em dezenas de indicadores, medidos continuamente – e o diagnóstico socioambiental é um deles. Isso garante eficiência e os resultados positivos são consequência, como demonstram os números apresentados pela Roncador.

“Sustentabilidade não é um palavrão. Sem o resultado econômico, o negócio não para em pé. Se você não contar com uma equipe motivada, com um turnover pequeno, pessoas agregando conhecimento e se desenvolvendo, você não consegue sustentar o desempenho. E se você não tiver gestão ambiental, vai aquecer o planeta e não vai conseguir produzir alimento na quantidade necessária”, reflete ele, destacando a interdependência dos eixos econômico, social e ambiental.

Outros resultados vêm sendo alcançados a partir do trabalho consistente da fazenda nos últimos 10 anos. Em junho, o Grupo Roncador obteve empréstimo de US$ 10 milhões do Fundo &Green, com juros abaixo da média do mercado, de 3% ao ano. O fundo norueguês é focado em proteção florestal e commodities florestais tropicais e se interessou pelo trabalho na propriedade a partir dos resultados obtidos em produtividade e conservação do meio ambiente. A Roncador se comprometeu em aumentar em mais 58% a produção de alimentos nos próximos oito anos. E assim como aconteceu até aqui, sem cortar uma única árvore.

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