De autoria do então senador Blairo Maggi, que foi ministro da Agricultura, o texto vai agora para análise do Plenário; Confira o que deve mudar com a nova Lei.
A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) aprovou, nesta segunda-feira (19), o relatório favorável do senador e presidente do colegiado, Acir Gurgacz (PDT-RO), ao chamado PL dos Agrotóxicos, que modifica as regras de aprovação e comercialização de agrotóxicos, produtos usados no setor agrícola para proteção e aumento das produções. O PL 1.459/2022 tramita no Congresso Nacional desde 1999. De autoria do então senador Blairo Maggi, que foi ministro da Agricultura, o texto segue agora para votação no Plenário do Senado, em regime de urgência.
Nos 23 anos em tramitação no Congresso Nacional, o texto passou por várias alterações. A proposta trata de pesquisa, experimentação, produção, comercialização, importação e exportação, embalagens e destinação final e fiscalização.
— Eu sei que não é o relatório ideal, não é aquilo que realmente todos nós queríamos, mas é o relatório que foi possível fazer. Tudo aquilo que era possível suprimir para melhorar o texto, nós o fizemos. E, dessa forma, eu agradeço a insistência dos senadores e das senadoras, porque por meses nós debatemos, fizemos audiências públicas e agora, por fim, conseguimos chegar a um texto que eu entendo que é um texto possível para que a gente possa avançar — afirmou Acir Gurgacz na reunião.
Chamado de PL do Veneno por alguns senadores, a matéria modifica as regras de aprovação e comercialização de agrotóxicos. O projeto em questão é o substitutivo que a Câmara dos Deputados apresentou ao projeto original de Maggi (PLS 526/1999), que é também um grande empresário do agronegócio em Mato Grosso.
Gurgacz e os senadores Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Soraya Thronicke (União-MS) apoiaram a aprovação. Para eles, as mudanças serão um avanço para a produção de alimentos no país.
Segundo Gurgacz, entre as novas alterações no relatório está a que elimina a possibilidade do uso “de qualquer que seja o pesticida que venha a trazer risco a doenças crônicas”.
O texto concentra a liberação sobre os agrotóxicos no Ministério da Agricultura, mas se o produto não for aprovado pela Anvisa, o ministério terá que acatar a decisão. Além disso, o projeto altera a nomenclatura “agrotóxico”, que passaria a ser chamada na legislação de “pesticida”; fixa prazo para a obtenção de registros desses produtos no Brasil, com possibilidade de licenças temporárias quando não cumpridos prazos pelos órgãos competentes; e altera a classificação explícita de produtos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente.
Gurgacz disse que “serão preservadas as competências dos responsáveis pelo setor da saúde e do meio ambiente”.
— Quando tiver um registro, a Anvisa vai ter que dizer se aprova ou não aprova, e o [Ministério do] Meio Ambiente, através do Ibama, também vai dizer se aprova ou não aprova. Não cabe ao Ministério da Agricultura modificar ou alterar os pareceres científicos e técnicos — disse Gurgacz.
As senadoras Zenaide Maia (Pros-RN) e Eliziane Gama (Cidadania-MA) se posicionaram contrariamente à aprovação do PL. Elas disseram que os malefícios da exposição aos agrotóxicos já foram comprovados por diversas entidades de todo o mundo.
— Foram liberados mais de 1,9 mil agrotóxicos nesses últimos 3 anos e 11 meses. A gente sabe que nossa safra não está com problema, porque todo ano a gente bate recordes na produção de grãos. É tanto que eu vi que estão previstas mais de 300 milhões de toneladas de grãos brasileiros agora para essa próxima safra — disse Zenaide.
Médica de formação, a senadora também afirmou que há muitos casos registrados de abortos e de bebês que nascem com deficiências devido a agrotóxicos
— A gente sabe que os agrotóxicos causam câncer — 50% dos que estão usando no Brasil, na Europa já são proibidos. Eu espero que no Plenário os nossos Senadores tenham um olhar diferenciado. A vida está acima de tudo, a vida não só humana, mas a animal e a vegetal — acrescentou Zenaide.
Eliziane afirmou que o projeto é um “libera geral” para os agrotóxicos. Disse também que várias entidades são contra a aprovação: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Anvisa, Ibama, Conectas, Greenpeace, Observatório do Clima, WWF, e outros.
— A gente vê assim medidas que poderão ser adotadas a partir da aprovação desse projeto que são medidas extremamente devastadoras. Nós temos, por exemplo, a questão de um certo licenciamento, uma certa autorização tácita, que é a autorização temporária. A gente não pode, na verdade, fazer uma autorização temporária quando a gente está tratando da vida humana, isso de fato é algo muito sério — disse Eliziane.
O senador Paulo Rocha (PT-PA) também votou contra a aprovação. Ele já havia apresentado um voto em separado para tentar mudar o texto.
— Esse defensivo, esse tipo de incentivo à produtividade imediatamente cai nos rios, nos riachos, como é o caso do nosso bioma, da Amazônia, como é o bioma do Mato Grosso, do Pantanal etc. Isso tem diferenças de aplicação em cada região. Isso logo vai matando os peixes, matando as vidas nos rios, além do impacto que tem na saúde humana, na saúde pública — declarou Paulo Rocha.
Luis Carlos Heize disse que a aprovação da proposta será “extremamente importante para o agro brasileiro e o agro mundial, porque o mundo consome hoje os alimentos brasileiros, inclusive com esses defensivos”. Segundo ele, os Estados Unidos e diversos países europeus usam os mesmos agrotóxicos usados no Brasil.
— É o pior país em termos de registro de defensivos agrícolas. Assim funciona em todos os países da Europa, assim funciona nos Estados Unidos, e funciona desse jeito em quatro, cinco, seis meses. Aqui são seis, sete, oito, dez anos para registrar um produto. Isso é um crime para o agro brasileiro, para a necessidade que o Brasil seja um grande produtor de alimentos. Já é um grande produtor de alimentos no mundo e vai continuar sendo — opinou Heinze.
Soraya Thronicke disse que os agrotóxicos estão cada vez mais modernos e seguros.
— É avanço, é tecnologia, é inovação, é a modernidade chegando. Estudos e mais estudos científicos são feitos, tanto quanto são feitos sobre medicamentos que nós utilizamos: são genéricos. Isso também barateia e impede a entrada ilegal de agrotóxicos, de defensivos no nosso país — avaliou a senadora.
O projeto
O texto aprovado pela CRA revoga a atual Lei dos Agrotóxicos, de 1989, e flexibiliza as regras de aprovação e comercialização desses produtos químicos. A atual proposta é resultado da relatoria do deputado Luiz Nishimori (PL-PR) na Câmara, que em seu texto dispõe sobre pesquisa, experimentação, produção, comercialização, importação e exportação, embalagens e destinação final e fiscalização desses produtos.
Concentração do poder decisório no Ministério da Agricultura, alteração da nomenclatura “agrotóxico”, fixação de prazo para a obtenção de registros no Brasil — com possibilidade de licenças temporárias quando não cumpridos prazos pelos órgãos competentes —, e suavização da classificação explícita de produtos nocivos à saúde humana e ao meio ambiente são alguns dos pontos que polemizam a matéria.
Presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), o senador Jaques Wagner (PT-BA) considera que o projeto pode colocar em risco o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, assim como poderá ter impactos negativos sobre o meio ambiente, a biodiversidade e a saúde dos consumidores no Brasil e no mundo.
Somente em 2021 foram aprovados os registros de 550 novos produtos desta natureza no Brasil.
A iniciativa fixa um prazo de dois anos para a aprovação de novos produtos. A solicitação de aprovação de novos produtos ocorrerá por meio do Sistema Unificado de Informação, Petição e Avaliação Eletrônica, que facilitará a tramitação e o acesso dos órgãos responsáveis pela análise aos estudos científicos que comprovem a segurança do uso.
Segurança jurídica
Grandes produtores rurais argumentam que o projeto não afeta a fiscalização de defesa agropecuária, traz segurança jurídica para a cadeia produtiva e aumenta a quantidade de informações à disposição dos fiscais. Já os críticos da proposta alegam que o texto vai fragilizar o poder de fiscalização do Ministério da Agricultura e impactar direitos constitucionais relativos à saúde pública, à defesa do consumidor e à proteção ao meio ambiente.
De acordo com o relator, o projeto trará vantagens econômicas e não levará ao descuido da saúde da população.
Nova nomenclatura
Diferentemente do projeto original, o substitutivo aprovado altera a nomenclatura “agrotóxicos”, assim definida na Constituição, para “pesticidas e produtos de controle ambiental e afins”.
O argumento da bancada ruralista é de que em âmbito internacional se utiliza o termo pesticida, enquanto agrotóxico seria pejorativo, sendo, assim, necessária a modernização da legislação nacional.
Nessa mesma linha, os agrotóxicos também poderão ser denominados de “produtos de controle ambiental” quando forem aplicados em florestas nativas ou de outros ecossistemas, assim como em ambientes híbridos. Nesse caso, o registro estará a cargo do Ibama.
Centralização
Para fiscalização e análise dos produtos para uso agropecuário, o projeto centraliza o poder decisório no Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Caberá a esse ministério aplicar as penalidades e auditar institutos de pesquisa e empresas.
Atualmente, há um sistema tripartite de decisão, que congrega a pasta da Agricultura, o Ministério do Meio Ambiente, por meio do Ibama, e o Ministério da Saúde, representado pela Anvisa.
A mudança poderá ajudar a simplificar e acelerar os processos de aprovação dos agrotóxicos, que chegam a durar oito anos.
Reanálise dos riscos
Também ficou estabelecido que quando organizações internacionais responsáveis pela saúde, alimentação ou meio ambiente, das quais o Brasil seja membro integrante ou signatário de acordos e convênios, alertarem para riscos ou desaconselharem o uso de pesticida, de produtos de controle ambiental e afins, caberá à autoridade competente tomar providências de reanálise dos riscos, em prazo de até um ano, prorrogável por mais seis meses.
Para isso, precisam ser considerados aspectos econômicos, fitossanitários e a possibilidade de uso de produtos substitutos. O órgão — Agricultura, no caso de pesticidas, e Meio Ambiente, no caso dos produtos de controle ambiental — deverá notificar os registrantes para apresentar a defesa em favor do seu produto.
Prazos
Para pesquisa, produção, exportação, importação, comercialização e uso o prazo máximo para inclusão e alteração de registro irá variar, conforme o caso, entre 30 dias a 2 anos.
Para produtos novos são exigidos 24 meses, mas os destinados à pesquisa e experimentação poderão ser beneficiados com a emissão de um registro especial temporário (RET), devendo a análise do pedido ser concluída em 30 dias pelo Ministério da Agricultura.
Os produtos não analisados nos prazos previstos em lei também poderão receber um registro temporário (RT). Isso acontecerá desde que estejam registrados para culturas similares ou usos ambientais similares em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Esses países devem adotar o Código Internacional de Conduta sobre a Distribuição e Uso de Pesticidas da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
Penalidades
O texto aprovado insere no rol das penalidades o crime de produzir, armazenar, transportar, importar, utilizar ou comercializar pesticidas, produtos de controle ambiental ou afins não registrados ou não autorizados. A pena prevista é de três a nove anos de reclusão e multa.
Permaneceu com pena de dois a quatro anos de reclusão e multa os atos de produzir, importar, comercializar e dar destinação a resíduos e embalagens vazias de pesticida, de controle ambiental em desacordo com a lei.
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As multas passam a ser aplicadas no limiar de R$ 2 mil a R$ 2 milhões. O valor máximo anterior era de R$ 20 mil. O montante será definido proporcionalmente à gravidade da infração cometida, a partir da análise dos órgãos de registro e fiscalização.
No texto aprovado não há mais definição de crime para empregador, profissional responsável ou o prestador de serviço que deixar de promover as medidas necessárias de proteção à saúde e ao meio ambiente.
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Fonte: Agência Senado