“Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Frase célebre de Stan Lee se encaixa perfeitamente no atual cenário do agronegócio brasileiro
Ana Carolina Monteiro* – Em pouco mais de 10 anos, a população mundial chegará a 8,5 bilhões de pessoas. Apenas alguns países, nas últimas décadas, desenvolveram tecnologia de produção agropecuária e estão preparados para enfrentar o desafio de alimentar todo este contingente humano. O Brasil é o único exemplo no cinturão tropical do globo (Embrapa, 2019).
Este potencial gigante do agronegócio brasileiro tem sido desafiado a se manter desde seus primórdios, quando o país ainda lucrava com a produção e a exportação, no início do século 19, com os mercados do açúcar, algodão e do arroz, no contexto do final da Revolução Francesa e da Guerra da Independência dos Estados Unidos.
Desde então, o processo de desenvolvimento do agro no país tem se caracterizado por constantes avanços tecnológicos. Particularmente, a partir do início dos anos 70, com a criação da Embrapa, uma sucessão de novos cenários surgiu a cada sucesso conquistado, com base em ciência e pesquisa.
Contudo, nos últimos 50 anos, e apesar do enorme avanço e das mudanças no crescimento agropecuário brasileiro, a lista de desafios continua a ser grande.
Vamos expor aqui aqueles cuja superação tem sido considerada imprescindível pelos estudiosos da área para a consolidação do Brasil, nos mercados interno e externo, nas próximas duas décadas:
- a infraestrutura brasileira não tem conseguido acomodar o extraordinário crescimento da produção e dos mercados, toda a rede de logística precisa ser melhor estruturada;
- faz-se necessária a criação de novos corredores de exportação, uma vez que solucionar esta questão significa mais renda e mais produção, maiores exportações e menores preços para os consumidores;
- superar as crises institucionais e estabelecer políticas regulatórias e tributárias eficazes se faz fundamental para que o setor opere com ganhos reais e com ajustes contábeis dentro da legalidade;
- desenvolvimento de um programa nacional de manejo integrado de água, algo que tem se tornado um problema global e alvo público de ambientalistas no mundo todo;
- as relações trabalhistas no agronegócio, o problema das sucessões familiares e o crescimento do perfil de jovens ricos e familiarizados com tecnologia, à frente de grandes empreendimentos na agricultura e pecuária do país, colocam em alerta como ficará a situação da mão de obra no campo;
- o incentivo à agricultura familiar, que precisa ser tratado sob o aspecto do acesso e transferência de tecnologias, redução de custos e taxas de financiamentos e opções adequadas de gestão dos negócios;
- as problemáticas relacionadas à coordenação e governança nas cadeias produtivas, assim como o combate ao oportunismo e às incertezas não podem ser deixados de lado.
Por último, mas não menos importante, pontuam-se dois desafios cruciais para se ganhar o jogo da competitividade no cenário do agronegócio mundial:
- a melhor comunicação, dentro e fora do setor, porque falar de seus feitos e mostrar ao país e ao mundo o que tem sido construído é muito mais do que fazer propaganda, é influenciar e se posicionar em mercados, é uma forma de competir, é um meio de dividir experiências, é dar sentido ao que o agro produz, é esclarecer dúvidas, é diminuir o déficit nas explicações da opinião pública, é formar e informar e é, ainda, estabelecer conexões com futuros parceiros e clientes;
- e a sustentabilidade, temática que está em discussão desde o início do processo de desenvolvimento do agro no Brasil, principalmente, em razão das queimadas em áreas como a Amazônia e o Cerrado brasileiro, a instituição do Código Florestal e o rebanho bovino brasileiro, um dos maiores do mundo, criticado pela emissão de gás metano e influência sob o efeito estufa.
Mesmo tratando aqui dos desafios, é possível afirmar que o desempenho da agropecuária brasileira tem sido um verdadeiro sucesso. E sobre os novos desafios a serem enfrentados, é possível que a integração do setor com a indústria e os serviços continue, tanto quanto o avanço da produtividade.
Para finalizar, ressalta-se o que está pontuado no documento “O futuro da cadeia produtiva da carne bovina: uma visão para 2040”, produzido pelo Centro de Inteligência da Carne Bovina (CiCarne), da Embrapa Gado de Corte, no que tange a tendências e megatendências para a agropecuária nacional, cujos cenários também se configuram como desafios a não serem perdidos de vista: “Novas tecnologias surgem e desaparecem de forma rápida, impactando os processos produtivos e forma de fazer negócios. Frente a este contexto, torna-se cada vez mais essencial antecipar futuros possíveis, realizar escolhas inteligentes e planejar cada vez mais de forma eficiente” (MALAFAIA, 2020, p. 10).
As cartas estão todas na mesa. E o player da vez é o Brasil. O futuro do agronegócio no país será mais tecnológico, científico, responsável, sustentável, social, comunicativo, produtivo e competitivo quanto mais, no presente, o setor souber solucionar e superar seus desafios. Não há, neste tipo de jogada, espaço para o blefe.
*A autora é Jornalista, Mestre em Comunicação (UFMS), Doutoranda em Administração (UFMS) | E-mail: anamonteiro79@gmail.com.
Ana também é autora do artigo publicado “Desmistificar é receita para agronegócio brasileiro evoluir”
Referências
MALAFAIA, G. C. (org.), O futuro da cadeia produtiva da carne bovina brasileira: uma visão para 2040. Centro de Inteligência da Carne Bovina, Embrapa Gado de Corte, Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Corte, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Campo Grande-MS, 2020.
MORETTI, C. L.; Alimentos para o mundo. Embrapa.br, 2019. Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/47327924/artigo—alimentos-para-o-mundo. Acesso em: 15 de janeiro de 2021.