A temperatura ambiental pode ter efeitos importantes no crescimento e nas taxas de morbidade e mortalidade de bezerros…
Em um país de clima tropical como é o Brasil, quando pensamos em estresse térmico em vacas, a principal causa será o calor. Entretanto, quando pensamos em bezerros, o estresse por frio pode um problema comum em algumas regiões, principalmente para os animais recém-nascidos.
Nos primeiros dias de vida os bezerros são muito propensos a perdas de calor devido à maior superfície corporal relativa e ao pouco isolamento e a falta de habilidade para controlar a temperatura corporal (Roland et al., 2016).
Os mecanismos termorreguladores podem levar até 2 meses para se desenvolverem, o que significa que os bezerros são particularmente suscetíveis ao estresse pelo frio durante a fase inicial da vida.
A temperatura ambiental pode ter efeitos importantes no crescimento e nas taxas de morbidade e mortalidade de bezerros.
Existe uma faixa de temperatura ambiente (zona termoneutra) dentro da qual o calor gerado como subproduto do metabolismo geral é suficiente para manter a temperatura corporal dos bezerros.
A zona termoneutra de bezerros jovens varia de acordo com sua idade, peso e outros fatores estressores, estando geralmente entre 15 e 25 ºC. A temperatura encontrada na extremidade inferior da zona termoneutra é conhecida como temperatura crítica inferior e é ela que indica o limite de temperatura mínima que um animal suporta até entrar em estresse por frio (Tabela 1). Para bezerros jovens, a temperatura crítica inferior diminui com o avanço da idade.
Tabela 1. Efeito da idade dos bezerros sobre a Temperatura Crítica Inferior.
Quando trabalhamos com bezerros expostos a clima frio, podemos atuar de duas maneiras básicas para evitar ou reduzir os efeitos negativos desse estresse. A primeira delas é aumentando o suprimento energético e favorecendo a produção de calor, principalmente via dieta.
Alguns estudos já foram publicados sugerindo que a capacidade dos bezerros de se adaptarem a climas mais frios é dependente de uma nutrição adequada, e por conta isso é comum observarmos maiores volumes de dieta líquida sendo ofertadas em regiões frias.
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Além disso, existem recomendações de fornecimento de sucedâneos com maior teor de gordura na composição como forma de mitigar os efeitos de estresse por frio. Nestas duas estratégias, a ideia é aumentar o fornecimento de energia de forma a compensar o aumento na exigência do animal, mantendo-se as taxas de crescimento do animal.
Em dias frios o corpo altera os processos fisiológicos e passa a requerer mais energia para controlar a temperatura por meio da produção de calor. Essa energia extra necessária para atender o aumento nas exigências pode ser suprida pelo aumento na ingestão de nutrientes ou pelo aumento no metabolismo de tecidos de reserva (no caso de bezerros neonatos, muito associado com o metabolismo do tecido adiposo marrom).
Outra maneira de minimiza o estresse por frio é criando um ambiente que reduza ao máximo as trocas de calor do animal com o meio (perda de temperatura) e favoreçam a manutenção da sua temperatura corporal.
Para isso algumas adequações podem ser feitas tais como acesso a um abrigo seco e com cama que forneça proteção contra o vento e condições ambientais extrema, uso de roupas/jaquetas e de fontes de calor suplementares, como lâmpadas de aquecimento.
Apesar de serem estratégias comumente utilizadas, poucos estudos avaliaram de maneira efetiva os efeitos delas sobre o desempenho dos bezerros.
Pensando nisso em 2021, Hyde e seus colaboradores desenvolveram um estudo para avaliar o uso de jaquetas ou lâmpadas de aquecimento e a associação destas para bezerros expostos ao frio durante o período de aleitamento.
Para isso eles dividiram os bezerros em 4 grupos:
- Controle, ou seja, sem jaqueta ou lâmpada de aquecimento;
- Lâmpada de aquecimento;
- Utilização apenas de jaqueta, sem lâmpada de aquecimento;
- Utilização de jaqueta e lâmpada de aquecimento.
A lâmpada utilizada foi de 1kW, a qual estava posicionada a 1 metro de altura da cama e era compartilhada por 4 baias. A temperatura ambiente das baias com e sem lâmpadas assim como da região interna e externa dos galpões foi monitorada (Figura 1).
Figura 1. Temperatura ambiente média (°C) ao longo do tempo coletadas nas baias equipadas com lâmpadas de aquecimento, em baias sem lâmpadas de aquecimento, bem como dentro e fora do galpão onde estavam alojados os bezerros. Temperatura ambiente registrada a cada 15 min.
A temperatura média diária foi aproximadamente 5°C maior nos ambientes com lâmpadas de aquecimento, e os bezerros alojados em baias equipadas com essas lâmpadas tiveram aumento de 90 g/d na taxa de crescimento durante a fase de aleitamento. No entanto, o uso apenas da jaqueta não gerou melhoras no ganho de peso dos animais.
As razões fisiológicas por trás do maior ganho de peso observado nos bezerros que tiveram acesso a lâmpadas de aquecimento não puderam ser muito exploradas neste trabalho.
No entanto, é possível que estes animais tenham gasto menos energia para manter a temperatura corporal nesse ambiente mais quente e possam ter sido mais ativos, aumentando assim o consumo de concentrado e consequentemente a ingestão de nutrientes.
Apesar do uso da jaqueta de forma isolada não ter melhorado o ganho de peso dos bezerros, quando associada a uma instalação com lâmpadas o GMD foi numericamente superior (Tabela 2; Figura 2), sugerindo um efeito aditivo.
A ausência de efeitos significativos com o uso apenas da jaqueta pode ter ocorrido pelo fato de ela não ser suficiente para mitigar a perda de calor a ponto de apresentar melhora mensurável no ganho de peso dos bezerros. O aumento na temperatura ocorre de maneira mais eficiente quando utilizamos uma fonte de calor externa/suplementar.
Tabela 2. Resultados descritivos de pesos e GMD por grupo de tratamento
Figura 2. Ganho médio diário (kg/d) por grupo de bezerros leiteiros aleatoriamente designados ao nascimento em um dos tratamentos: sem roupa e sem lâmpada de aquecimento, lâmpada de aquecimento mas sem roupa, roupa mas sem lâmpada de aquecimento, ou lâmpada aquecimento e roupa.
Durante a discussão os autores abordam a questão do aumento dos gastos com energia para manutenção das lâmpadas e apontam que este pode ser um investimento que vale a pena tendo em vista os potenciais aumentos no ganho de peso.
Além das melhorias no desempenho, outros pesquisadores já relataram que os bezerros tendem a mostrar preferência por áreas aquecidas, sugerindo desta forma que pode haver também um aspecto positivo de bem-estar no uso de lâmpadas de aquecimento (Borderas et al., 2009).
Uma alternativa para otimizar o uso das lâmpadas é mantê-las acessas em períodos específicos, quando a temperatura ambiente estiver abaixo da temperatura crítica inferior.
Os índices de morbidade e mortalidade não foram monitorados neste trabalho, no entanto, pesquisas anteriores reportaram que o estresse por frio pode levar ao desenvolvimento de complicações secundárias, incluindo distúrbios digestivos e respiratórios crônicos, diarreia e pneumonia, os quais afetam diretamente o desempenho dos bezerros e aumentam a mortalidade no rebanho (Young, 1983).
Todavia, é importante considerar que, embora a temperatura das instalações se mostre importante no crescimento de bezerros, a busca de um ambiente quente às custas de ventilação adequada pode aumentar o risco de surtos de doenças respiratórias. Desta forma devemos prezar por um ambiente que associe temperatura adequada, mas sempre com boa ventilação.
É importante atentar-se ainda ao tipo de lâmpada utilizada, pois a eficiência na geração de calor pode variar. Além disso, é preciso redobrar os cuidados com essas lâmpadas, principalmente quando a cama dos animais é composta de maravalha, palha ou qualquer outro material que possa pegar fogo facilmente.
Assim como a maioria dos outros trabalhos, este estudo concentrou-se em avaliar os efeitos de apenas um componente do sistema (nesse caso a temperatura ambiente). Entretanto, é fundamental ressaltarmos que existem vários outros fatores como alimentação, colostragem, higiene ambiental que afetam diretamente a saúde, o crescimento e a produtividade futura dos animais.