Os encargos financeiros são uma grande preocupação, mas os desafios climáticos e os impactos à saúde também pesam, revelou uma pesquisa sobre as atitudes dos produtores de leite australianos.
Os encargos financeiros são uma grande preocupação, mas os desafios climáticos e os impactos à saúde também pesam, revelou uma pesquisa sobre as atitudes dos produtores de leite australianos.
- Mais da metade consideraria a transição da produção de leite para outros tipos de agricultura.
- Bem-estar dos produtores é um fator crítico para o futuro do setor.
- Subsídios e programas de financiamento têm pouca influência sobre a decisão de abandonar a pecuária leiteira.
A pesquisa, conduzida por uma equipe do Instituto de Políticas de Sustentabilidade da Curtin University, em Perth, entrevistou uma amostra representativa de 147 produtores australianos para esclarecer os desafios enfrentados pelos trabalhadores do setor, suas atitudes em relação à indústria e se considerariam mudar para outro tipo de agricultura.
Por meio de testes estatísticos e dados da pesquisa, os pesquisadores identificaram uma relação estatisticamente significativa entre os níveis de satisfação dos produtores e vários fatores-chave, incluindo aumento de custos, saúde mental e bem-estar dos produtores e suas famílias.
Principais descobertas
Entre os entrevistados, cerca de 55% (36% “neutros” e 19% “negativos”) não expressaram satisfação com a pecuária leiteira, em comparação com 45% que estavam satisfeitos. Os principais motivos de insatisfação incluíram aumento dos custos operacionais, falta de mão de obra e dificuldades em equilibrar trabalho e vida pessoal.
Preocupações comuns
Preocupações dos agricultores classificadas de acordo com os respondentes da pesquisa (percentuais arredondados).
As restrições financeiras, resultantes de altos custos de insumos e preços instáveis do leite, afetaram a eficiência operacional, como a capacidade de investir em infraestrutura, mão de obra e saúde animal.
Eventos climáticos adversos, como enchentes ou secas, prejudicam a disponibilidade de forragem de boa qualidade, impactando a produção de leite e a rentabilidade.
Embora as calamidades climáticas sejam amplamente vistas como contribuintes para as dificuldades dos produtores, apenas cerca de um terço (36%) dos entrevistados considerou a “incerteza das mudanças climáticas” como um grande desafio para seus modelos de negócio. Isso sugere uma falta de reconhecimento da ligação entre pecuária e mudanças climáticas.
“A incerteza das mudanças climáticas é o elefante na sala”, disse o professor Clive Phillips, coautor do estudo. “Muitos produtores não querem reconhecer que as mudanças climáticas antropogênicas existem e, mesmo quando reconhecem, não admitem necessariamente a contribuição do gado para o aquecimento global. Infelizmente, eles recebem apoio de alguns cientistas e veterinários que têm interesses em sustentar a pecuária.”
Saúde mental em foco
O equilíbrio entre trabalho e vida pessoal também foi uma razão importante para os produtores considerarem mudar para outras atividades.
Mais de dois terços dos entrevistados (69%) relataram que sua saúde mental ou a de suas famílias foi negativamente impactada pelos desafios relacionados à fazenda. Cerca de 51% identificaram os impactos na saúde mental e no bem-estar como os principais desafios em suas vidas profissionais.
As taxas de suicídio entre produtores são 60% maiores em comparação com outros grupos, segundo dados da National Rural Health Alliance. Longas jornadas de trabalho, dificuldades econômicas e a consolidação do setor foram os principais fatores que prejudicaram o bem-estar dos produtores.
Enquanto o número de fazendas leiteiras registradas na Austrália tem diminuído (de 6.770 em 2012 para 4.420 em 2022, segundo o Statista), o número de vacas aumentou, o que coloca mais pressão e responsabilidades sobre os produtores. Essa tendência reflete o que acontece em outros mercados, como na União Europeia, onde o número de fazendas leiteiras diminuiu 62% sem redução no número de animais criados.
De acordo com a National Rural Health Alliance, um produtores morre por suicídio a cada 10 dias, com fatores de risco incluindo rompimento de relacionamentos, depressão subjacente e fácil acesso a armas de fogo.
Abertura para alternativas
Coletivamente, mais da metade dos entrevistados (54%) indicaram estar abertos a explorar alternativas à pecuária leiteira. No entanto, a lucratividade, a adequação de suas terras para outras operações agrícolas e a familiaridade com a produção de leite foram os principais motivos de hesitação.
Quase dois terços (64%) disseram que não estavam abertos à transição mesmo que houvesse financiamento governamental específico disponível. Cerca de um terço (36%) afirmou que o financiamento poderia incentivá-los a considerar outra atividade.
A pesquisa revelou que o apoio financeiro dificilmente persuadirá os produtores a abandonar o setor, com a vasta maioria (80%) indicando que não seriam convencidos apenas por subsídios. No entanto, para aqueles já considerando deixar a pecuária leiteira, o suporte financeiro poderia ser um fator de permanência.
“Nosso estudo descobriu que os produtores que recebem apoio financeiro e/ou outros tipos de assistência têm menos probabilidade de considerar a transição para longe da pecuária leiteira”, afirmaram os autores. “Uma proporção significativa (58,5%) expressou interesse em receber apoio financeiro e/ou outros tipos de ajuda para permanecer no setor.”
A pesquisa também indicou que, à medida que o tamanho do rebanho ultrapassa 700 cabeças, aumenta a necessidade de recursos financeiros adicionais para decisões informadas sobre o futuro das fazendas.
Enfrentando desafios com oportunidades
Para os produtores dispostos a explorar alternativas, idade avançada, problemas de saúde e falta de mão de obra foram fatores chave. A maioria dos entrevistados tinha entre 55 e 64 anos, o que apoia pesquisas acadêmicas anteriores que mostram que produtores com mais de 60 anos têm até 20% mais probabilidade de abandonar o setor.
Para aqueles comprometidos com a produção leiteira, laços familiares, posse de terras e “amor genuíno” pela atividade foram fatores determinantes.
Por outro lado, diversificar para outras atividades agrícolas, como pecuária de corte, horticultura ou agricultura extensiva, foi visto como uma estratégia para estabilizar a renda. Um produtor de Victoria que cria gado leiteiro, de corte e ovinos afirmou que “cada uma dessas atividades tem altos e baixos; [o] leite está sustentando nossas finanças até o próximo ano fiscal, enquanto carne e ovinos estão em baixa.”
Apesar das pressões para reduzir emissões nas fazendas, a pesquisa mostrou que as mudanças climáticas são uma das menores preocupações no dia a dia dos produtores leiteiros.
A agricultura representa cerca de 16% das emissões totais de gases de efeito estufa da Austrália, sendo que as emissões diretas das fazendas leiteiras contribuem com cerca de 19% desse total, equivalente a 3% das emissões nacionais.
“Embora os produtores da nossa amostra tenham demonstrado preocupação com o impacto da incerteza climática em seus negócios, não houve reconhecimento nos comentários qualitativos de que o próprio gado contribui significativamente para as emissões de gases de efeito estufa”, concluíram os autores.
“Pareceu haver uma falta de compreensão sobre a relação entre pecuária e mudanças climáticas e os benefícios de escolhas baseadas em plantas, que poderiam potencialmente influenciar o interesse dos agricultores leiteiros em transitar para outros negócios.”
Fonte: Dairy Reporter
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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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