Projeto de Lei de Deputado Federal obriga todo animal criado a pasto portar um chip que seja possível informar a sua localização geográfica
É nessas horas que vemos a disparidade entre o campo e cidade. Um político, eleito pelo povo, propor algo tão fora da realidade, talvez querendo lacrar, mostra como o campo ainda é desconhecido pela grande maioria dos brasileiros, é por essas e outras que o agronegócio, que sustentou a economia durante a pandemia, é taxado como vilão ainda nos dias de hoje. E para provar a insanidade, ele mesmo retirou o projeto de lei de tramitação que estava em pauta na Câmara dos Deputados.
O Projeto de Lei PL 345/2021, de autoria do Deputado Federal David Soares (DEM/SP), tinha como objetivo obrigar que “todo animal criado exclusivamente por sistema de pastagem deverá portar uma identificação eletrônica que informará sua localização por meio de GPS (Sistema de Posicionamento Global)”. Isso mesmo, você não leu errado, o deputado queria obrigar os pecuaristas brasileiros a investir em uma tecnologia que se quer existe em larga escala no Brasil. Algumas startups estão investindo na tecnologia em modo experimental.
Ainda sobre o projeto, confira mais alguns trechos que retiramos do documento apresentado:
- Nenhum animal poderá ser transportado sem a presença de identificação eletrônica;
- Nenhum animal irá para abate se não estiver com a identificação eletrônica;
- O animal será apreendido se estiver sem a identificação eletrônica, desligada de forma não justificada ou inoperante.
Uma das melhores partes do projeto, segue:
“A identificação eletrônica deverá ser programada para enviar um alerta para o proprietário do animal, ao Instituto Chico Mendes e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis sempre que este adentrar em áreas de preservação ambiental ou similares.”
Resumindo, caso uma vaca “varadeira de cerca” adentre uma área de preservação ambiental você teria que providenciar uma estrutura tecnológica na sua fazenda com internet – conectividade – para enviar notificações a várias entidades sobre a atitude suspeita da mimosa.
Vamos avaliar somente dois aspectos desse projeto de lei. Primeiro, a adoção de uma tecnologia que ainda não é usada no Brasil em larga escala. Por isso pesquisamos na internet e encontramos o “Digitanimal GPS cattle tracker” que faz exatamente esse papel de rastrear os animais em tempo real e manda para o celular a posição geográfica do bovino. O custo do equipamento é de £165,99, convertido em reais nos traria o valor de R$ 976,08 (valor sem impostos de importação). Estamos falando de um custo adicional (por cabeça) de quase mil reais, totalmente inviável em uma pecuária com margens tão apertadas. E aqui não há nenhuma crítica à adoção de tecnologias, cada vez mais empregada na pecuária brasileira.
Falta conectividade no campo – Existe um grande esforço do governo e setor privado em aumentar a conectividade no campo, em suma, não há infraestrutura tecnológica no campo brasileiro. Usamos o exemplo aqui do Mato Grosso, um dos Estados de maior produção de grãos do país, em recente levantamento do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária mostra que somente 5% das fazendas tem 4G (5 em cada 100 fazendas). Isso nos dá uma dimensão do tamanho do desafio.
Existem estudos mostrando que em quatro anos a conectividade pode elevar em mais de R$ 100 bilhões o faturamento anual do agronegócio brasileiro apenas com a chegada dessa infraestrutura. Às vésperas da introdução da tecnologia de internet 5G, o Brasil tem apenas 23% da área agrícola coberta com algum tipo de conexão e precisa investir pesado para ampliar a inclusão digital dos produtores rurais.
De área total rural brasileira, somente 23% tem internet, logo esse projeto de lei não faz nenhum sentido pois não haveria internet para se transmitir os dados.
Importante ressaltar que no último dia 23 de junho, o referido Deputado David Soares (DEM/SP) apresentou um requerimento que “Requer, nos termos do art. 104, Regimento Interno da Câmara dos Deputados, que seja retirado de tramitação o Projeto de Lei n° 345 de 2021 de minha autoria“.
Antes tarde do que nunca.