Cruzamento industrial, prática que tanto se fala no Brasil, trás para a pecuária um mundo de possibilidades lucrativas e produtivas para o avanço na “Nova Pecuária”
O cruzamento industrial tem uma importância no mercado da pecuária nacional muito grande, porque traz, por si só, a complementariedade das raças e, ainda, a heterose.
Diante da importância desse tema, tive a imensa oportunidade de conversar com o Marcelo Selistre, Gerente de Produto Corte Europeu da ABS, uma pessoa que, em minha opinião, é um ícone para o setor de cruzamento industrial no Brasil, pela sua dedicação e grande conhecimento daquilo que fala.Nosso bate-papo aconteceu durante o INTERCONF 2018, realizado em Goiânia-GO pela ASSOCON.
Marcelo ressalta que “o produtor rural já sabe que só com essas duas características do cruzamento industrial – complementariedade das raças e a heterose -, ele tem ganhos muito expressivos sem agregar mais investimentos da porteira pra dentro”. Diante disso, temos o primeiro ponto em que a eficiência da propriedade aumenta muito quando é adotado o sistema de cruzamento industrial.
“O cruzamento industrial vivenciou uma fase, tempos atrás, com um boom de cruzamento de múltiplas raças. Entretanto, o mercado não estava preparado para absorver esses animais cruzados. Nos últimos dez anos, e principalmente a partir de 2010, houve uma concentração de cruzamentos utilizando, principalmente, a raça Angus. Para se ter uma ideia, nos últimos três anos, só o Angus Preto vendeu mais do que o Nelore. Isso no mercado de genética, no mercado de inseminação artificial, nos mostra como o produtor enxerga o cruzamento como um benefício. Isso está posto e muito claro”, explica Marcelo.
A cada dia, o que fica mais claro, dentro da utilização do cruzamento industrial, é um grande direcionamento para a raça Angus. Segundo Marcelo, o Angus representa quase 80% do volume de sêmen vendido entre as raças taurinas. “O foco do cruzamento hoje é com o Angus”, completa, destacando que a padronização oferecida pela raça é muito importante e ajudou a alavancar o cruzamento.
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Outro fator que foi determinante para o sucesso do cruzamento industrial foi a série de ajustes que foram feitos no sistema de produção e criação desses animais, aliada à abertura do mercado. Esses sistemas vêm deixando um mundo de oportunidades para o pecuarista hoje, diferente do que ocorreu no passado, como supracitado.
quando você soma uma maior eficiência de produção com um valor agregado, esse cruzamento se torna uma receita de sucesso imbatível
Mercado e sua valorização comercial
“Nos últimos dez anos, o animal cruzado preto teve uma supervalorização, sendo a categoria mais valorizada do mercado atualmente. Então, nós temos, dentro dos programas de carne de qualidade, o programa ‘Carne Angus’ que avançou muito com o crescimento do cruzamento industrial e foi um dos fatores que impulsionou esse crescimento. O mercado de exportação de animais vivos, nos últimos anos, também está com foco no animal cruzado, principalmente preto”, disse o Gerente de Produto Corte Europeu da ABS.
“Esse animal cruzado com Angus, o F1 Angus x Nelore, é o produto que te da um sobre-preço, impactando muito positivamente na rentabilidade do produtor. Além disso, temos os benefícios que já é conhecido há tempos: a complementariedade entre raças e a heterose, que possibilitam uma maior eficiência dos animais da porteira pra dentro. Em resumo, quando você soma uma maior eficiência de produção com um valor agregado, esse cruzamento se torna uma receita de sucesso imbatível. Então, esse é o segredo do sucesso do Angus e do cruzamento industrial”, finaliza Marcelo Selistre.
Qual o papel da Fêmea F1 para o pecuarista?
Quando se trata de cruzamento industrial, precisamos falar da fêmea F1. Coloquei para ele que, na minha opinião, essa fêmea caiu de presente para o mercado. Ele concordou: “É exatamente esse termo que você utilizou. A Fêmea F1 Angus x Nelore é um presente para o mercado”.
Com apenas 14 meses de idade, essa fêmea está muito leve para poder ir para o gancho, mas pela precocidade da raça Angus, ela tem uma facilidade enorme de prenhez. Importante observar que a fertilidade dessa F1 é de 10 a 15% superior do as raças que deram origem a ela, ou seja, a heterose se aplica também à parte da fertilidade, e se torna um ponto chave de sucesso dentro do sistema de cria. Sendo assim, quem não tem uma boa fertilidade, uma boa taxa de prenhez e desmame, vê seu sistema de produção de cria fadado à falência.
A fêmea F1 garante bons índices de prenhez e são precoces com um ano de idade. “Conseguir encurtar o prazo de produção é fundamental para o sucesso a longo prazo da atividade. Conseguir emprenhar a fêmea com 14 meses, chega a representar de um a dois anos a menos no sistema”, conclui.
Conseguir encurtar o prazo de produção é fundamental para o sucesso a longo prazo da atividade.
Benefícios para o sistema de cria
“Em função do programa de qualidade da carne Angus, a fêmea F1, com até quatro dentes, é valorizada a preço de macho. E ela consegue atingir um peso e um acabamento de carcaça com quatro dentes, além de estar te deixando um produto no meio do caminho, tão bem valorizado (cria). Quando se utiliza, principalmente, a raça Brangus – que é a segunda hoje de maior uso entre as raças taurinas, tendo ultrapassado já o Red Angus – na F1, nasce um produto muito parecido com a F1, pois ela consegue agregar valor e ter uma heterose semelhante a do F1, ou seja, possui um índice de produção muito semelhante”, explica Marcelo, destacando que o Brangus dentro do sistema de cria permite que o pecuarista consiga dar sequência nessa alta produtividade com valor agregado no produto, e esse é o motivo que tem feito o Brangus crescer dentro do mercado.
Pontos relevantes para sua utilização
“A fêmea F1, pelos motivos que eu citei, é hoje uma das categorias mais rentáveis dentro da propriedade. É obvio que o produtor que decide inseminar essa F1, precisa preparar a fazenda para isso com qualidade de pasto e suplementação. As pessoas, muitas vezes, comentam: ‘O F1 come muito, é muito exigente, se não der boa comida ele não desempenha…’… E isso é verdade. Só que a pergunta a ser respondida é: ‘Quer mais produtividade ou quer manter a produtividade baixa?’. Então, se quer aumentar a produtividade, é preciso dar condições para que essa produtividade se expresse”.
A F1 precisa de um investimento, a fazenda precisa sim estar preparada para isso.
Qual melhor sistema para criar esse animal?
Marcelo ainda nos conta sobre o sistema de terminação desses animais e quais os gargalos que encontramos no campo: “Eu, que viajo muito pelo país, te digo que o sistema de produção que o Brasil adotou para o F1 é no cocho, seja suplementação a pasto ou diretamente no confinamento. Desconheço fazenda que termina o F1 100% a pasto e sem suplementação. Os números de confinamentos no Brasil são relativamente baixos comparados aos do EUA. Estamos falando na casa dos 12% dos animais que são confinados. Mas, quando olhamos para o universo dos animais F1 Angus x Nelore, eu te digo que a grande maioria é terminada em confinamento e esse é um sistema produção padrão”.