Para o presidente do Sindicato Rural, a retração do mercado interno tem gerado grandes dificuldades para os frigoríficos que atendem apenas mercados locais.
Frigoríficos pequenos de Mato Grosso do Sul têm enfrentado dificuldades, que resultam em recuperação judicial, atraso de salários e demissões de funcionários. Para o Sindicato Rural de Campo Grande, a crise está ligada à retração do mercado interno, com queda nos preços e redução nos abates.
Para o presidente do Sindicato Rural, Alessandro Coelho, a retração do mercado interno tem gerado grandes dificuldades para os frigoríficos que atendem apenas mercados locais.
“Eles perdem competitividade, próximo dos outros frigoríficos. Em fases como essa, seria importante a avaliação de políticas públicas, ligadas ao setor fiscal”, diz. O presidente do sindicato ressalta que, tais incentivos financeiros para as indústrias, são fundamentais para a continuidade dessas empresas menores que desempenham importante papel na economia dos municípios em que estão instaladas.
“Além de atrair novas indústrias, é preciso manter as que estão instaladas também. Precisa de incentivo”, ele reforça.
O que explicaria essas dificuldades?
No mesmo período em que a Boibras, em São Gabriel do Oeste, entrou na Justiça com um pedido de recuperação judicial, a Beta Carnes, em Campo Grande, enfrenta dificuldades para cumprir com as obrigações trabalhistas. As duas empresas atuam no ramo de abate de bovinos. Além disso, um frigorífico em Nioaque também enfrentaria dificuldades e teria dado férias coletivas aos trabalhadores.
De acordo com o analista de agronegócio, João Pedro Cuthi Dias, fatores que podem explicar essa dificuldades financeiras das pequenas plantas sul-mato-grossense são vários.
Entre eles está a dificuldade em conseguir matéria prima, o que consequentemente afeta a taxa de uso do frigorífico; a competitividade da carne bovina frente a outras proteínas, como a de frango que é mais barata; e uma dificuldade para crédito devido à alta taxa de juros. A Selic, a taxa básica de juros do Brasil, opera em 13,25% ao ano.
O especialista afirma que do lado do pecuarista já foi dada “sua parcela de sacrifício”, diante da desvalorização da arroba do boi gordo nos últimos dois meses.
O levantamento da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul) aponta que a cotação do animal saiu de R$ 266/@ em abril deste ano para R$ 233/@ em junho, o que representa queda de 12.40%. Em setembro do ano passado, a @ chegou a custar R$ 291.
Associado a desvalorização do preço do animal e um alto custo de produção, o analista afirma que o pecuarista que tiver condição de segurar o animal na fazenda por mais tempo irá esperar uma melhora no mercado. Com isso, a oferta de bovinos para abate pode cair.
A edição de julho do boletim Sigabov, elaborado pela Famasul, aponta que o Estado abateu menos animais entre o ano passado e 2023.
Foram abatidos 897.142 bovinos machos no acumulado de janeiro a junho de 2022, enquanto no mesmo período deste ano foram 734.430, o que representa queda 18,14% no número de animais abatidos em Mato Grosso do Sul.
Já no caso das fêmeas também houve retração, saindo de 907.196 no primeiro semestre de 2022 para 827.706 no mesmo comparativo de 2023, ou seja, queda de 8,76%.
“Outro fator a se olhar é o aproveitamento da área industrial, se estiver baixo uso, isso pode encarecer os custos gerais dos frigoríficos”, aponta João Pedro Cuthi Dias.
Como exemplo, o analista explica que se um frigorífico tem capacidade para abater 600 animais, mas tem abatido somente 120, a taxa de uso da planta está em 20%, enquanto 80% está ocioso. “Cada frigorífico tem suas particularidades”, pontua.
A dificuldade para conseguir matéria prima, inclusive, foi um dos problemas apontados pela Boibras no pedido de recuperação judicial.
Outro ponto que pode explicar o cenário é que o brasileiro tem consumido menos carne bovina nos últimos anos, especialmente se comparado a proteínas mais baratas.
O relatório do Itaú BBA aponta que o consumo per capita de carne bovina caiu para 24,2 kg em 2022, o menor patamar desde 2004, enquanto o consumo da carne de frango chegou a 37,5 kg.
O especialista em agronegócio também aponta que a queda na exportação e menor preço pago em dólar pode ter afetado o setor. A Carta Conjuntural da Famasul mostra que a receita com as exportações de carne bovina do Estado caíram 29% no comparativo entre o segundo semestre de 2022 e 2023.
Dados da Balança Comercial mostram que a tonelada da carne bovina fresca brasileira, em julho de 2022, era exportada por US$ 6.549,9, enquanto em julho deste ano o valor caiu para US$ 4.740,3.
“O frigorífico até tinha uma rentabilidade boa com as exportações pouco tempo atrás”, ressalta o analista de agronegócio.
Pedido de recuperação judicial
O grupo empresarial ligado a Boibras, planta frigorífica sediada em São Gabriel D’Oeste, entrou com um pedido de recuperação judicial no dia de 24 de julho, alegando dificuldades financeiras. O valor da causa é de R$ 51,2 milhões.
A empresa atua no ramo de processamento de carne bovina e, inclusive, faz exportações para países da América do Sul, em especial para o Chile. A Boibras emprega mais de 400 pessoas diretamente.
No pedido de recuperação judicial é exposto que a empresa enfrenta uma grave situação financeira.
“A qual vem experimentando dificuldades em adimplir as obrigações trabalhistas, tributárias e com seus fornecedores conforme provas que faz em anexo, enfrentando severa dificuldade financeira, ensejando o reconhecimento da sua precária condição econômica”, diz o texto.
A empresa também entrou com pedido de justiça gratuita, que foi negado pelo TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), visto que se a empresa não tem recursos para manutenção corriqueira, “então não se considera séria a sua tentativa de superar a crise econômica-financeira”.
Ainda nos autos, a Vara Regional de Falências, Recuperações e de Cartas Precatórias Cíveis em Geral determinou a constatação prévia da real situação da empresa, bem como da documentação apresentada, antes de decidir sobre o deferimento do pedido de recuperação judicial.
Contudo, a empresa contratada para fazer a análise da situação da Boibras pediu prorrogação do prazo de cinco dias devido à falta de apresentação de documentos por parte da empresa, o que foi concedido pela justiça.
Fonte: Conteudo MS
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