COVID19 BR: O trunfo da pecuária está na visão de longo prazo

O boi não frustra quem está atento aos processos e focado em suas metas produtivas e econômicas. Por isso é importante ter visão de longo prazo!

Sabe quando você anda na pior estrada da sua vida, mais esburacada e cheia de solavancos? Faz muitos anos, hoje já está boa, mas a pior que já andei foi no interior do PA, num trecho entre Redenção e Marabá.  Eu estava de caminhonete, com ar condicionado, vidros fechados, ou seja, ambiente interno controlado. Seguia na retranca, devagar, com muita habilidade para manter a carga bem cuidada e meu rumo.

Com certeza aquela buraqueira toda arrebentou o protetor de carter, causou alguns outros danos no carro, furou o pneu, encheu de poeira o estofado, mas segui com cuidado rumo ao fim da viagem. E, conseguimos. Houve alguns atrasos, mas deu certo.

No meio do caminho, com certeza eu estava melhor do que meu companheiro do Fiat 147, empreendedor, vendedor de camisetas, que não conseguiu passar pela buraqueira e ficou pela estrada. Como também melhor do que o motoqueiro que, apesar de normalmente voar bem mais rápido do que eu, sofreu muito para seguir pelo mesmo destino. Afinal, ninguém queria mais voar com ele e correr riscos.

Está achando estranha essa história? Mas é o paralelo que faço entre a pecuária e outros segmentos neste momento de crise causada pelo Covid-19. Os pecuaristas estão na caminhonete em uma estrada esburacada e muito ruim, uma das mais imprevisíveis que já passaram, mas vão sobreviver com menos sofrimento do que outros setores se prestarem atenção em algumas atitudes gerencias da propriedade. 

Analise em qual perfil você se encaixa

Em meio à crise, temos, normalmente, quatro tipos de comportamento:

■ Se tenho caixa e informação : posso identificar oportunidade e aproveitar.

■ Não tenho caixa, mas tenho informação: consigo entender a situação e posso não aproveitar economicamente, mas não vou sofrer. Mantenho a calma.

■ Se tenho caixa, mas não tenho informação : há grande chance de que se perca dinheiro e se tome decisões erradas. Acenda o alerta, lembrando que ter dinheiro não é a solução para os problemas.

■ Não tenho caixa, nem informação : a situação pode ser de desespero total e muitos erros. Pare e repense.

Veja que são quatro condições diferentes, sendo que as variáveis são dinheiro e informação. A obrigação para qualquer empresário seria ter um caixa de reserva, mas sabemos que nem sempre isso é possível ou que não há recurso para o período necessário.

Portanto, o que o líder precisa é buscar a correta informação, principalmente, dos que se encontram nos dois últimos exemplos. Quando digo informação, entenda dados, calma, discernimento, leitura isenta de emoção controle e razão para a tomada de decisão. 

O grande trunfo da pecuária é sua visão de longo prazo.

Se nos mantivermos no propósito plurianual, ou seja, o que definimos para nosso resultado de três ou quatro anos, continuaremos de pé. A estrada será esburacada, mas temos nosso ambiente controlado. Participamos de um setor base, o da produção de alimentos, e sabemos que com bovinocultura, por pior que seja, é possível esperar. Nos sistemas intensivos um pouco menos, mas mesmo assim, suporta.

Isso acontece, principalmente, pela pecuária ser uma atividade de longo prazo, por isso é preciso manter-se convicto de seu propósito plurianual. Isso é o que determinará o resultado. Se foi definido que tenho que vender mil bezerros no fim do triênio. Esse é meu foco. Como vou manter essa marca mesmo neste momento de crise? Atento ao caminho, resistente aos solavancos, com alguns ajustes e adiamento de investimentos, mas é possível conquistar o que se deseja no longo prazo.

O grande problema é quando o pecuarista superestima o curto prazo e desprezar o longo prazo. Notícias como a alta da arroba, causam extrema euforia e negócios fora do previsto. O mesmo para as situações de baixa como essa que vivemos. Independentemente do momento de alta ou de baixa, nosso foco deve estar na meta que foi definida para o quadriênio e a adequação da rotina aos dois fatores: o momento e a meta.

Fazendo um comparativo e reservadas as devidas proporções no que se refere a saúde pública, em 2017, a pecuária passou por uma turbulência muito grande e o preço nominal da arroba ante a queda era bem inferior ao que temos hoje. O líder que soube segurar as rédeas do negócio conseguiu passar, em seguida, aproveitou de forma mais positiva os anos seguintes para fazer caixa.

Como temos os dados das fazendas mais rentáveis que participam do Benchmarking Inttegra sabemos que o comportamento padrão desse líder foi:

■ Centrado, não tomou medidas desvairadas.

■ Fez os ajustes necessários para o seu negócio, principalmente em custos fixos.

■ Teve atenção aos processos para que fossem muito bem ajustados.

■ Não perdeu o foco no triênio ou quadriênio.

■ Encarou de frente o problema e pediu apoio à equipe.

■ Buscou informação aprofundada sobre o momento que vivia e ajuda técnica.

Se as previsões se confirmarem, passaremos por um período complexo nos próximos 90 a 120 dias, de abril a junho. Lembro que esse período também coincide com a seca no Brasil central. Uma fase que, historicamente, é de baixa de preços e desafiadora, portanto, uma fase que o couro do pecuarista engrossa, ou seja, redobra sua atenção para superar problemas. Em 2020, isso será ainda mais latente. Mesmo assim, o foco deve estar em manter o plano vigente, principalmente, o número de animais que serão abatidos.

Tarefas para quem acaba de despertar

Para quem se conscientizou sobre a importância do planejamento de longo prazo, sugiro que aproveite o tempo que está confinado (muitos na própria fazenda) para fazer uma reflexão sobre seus próximos doze meses. E, o primeiro número que deve buscar será sua previsão de abate ou de venda de animais.

Feito isso, irá refletir sobe as despesas, lembrando que temos quatro ralos pelos quais escorrem o dinheiro. Há o custeio variável, (insumos de rebanho e pastagem) mudanças aqui interferem na produção, custeio fixo (administrativo), investimentos incidentes na produção (como cerca e calcário) e investimentos não incidentes na produção (reformas de escritório ou sede).

Organizadas as despesas em suas respectivas caixas, o foco está em reduzir o custeio fixo e o investimento não incidente na produção. Essas duas categorias não retornam em quilos de carne ao produtor, por isso será onde o cinto irá apertar.

Aproveite a oportunidade para fazer a economia certa e colher todo tipo de informação que puder: dos colaboradores da fazenda aos especialistas de mercado, pois isso será útil para a tomada de decisão.

Sobre a produção, fiquemos atentos que estamos para entrar na entressafra e segurar boi nesta época pode prejudicar todo o sistema de produção.  O trunfo está buscar boas reposições, preparar a fazenda para passar a seca e, principalmente, aproveitar que ainda temos negócios ocorrendo.

Voltando a nossa estrada do começo do artigo, mais uma vez, ao olharmos pela janela, principalmente para outros setores da economia, vamos constatar como o boi é generoso conosco.

Outras atividades serão muito mais impactadas e tendem a levar muito mais tempo para a recuperação. Pode ser que fiquem as margens desta estrada esburacada. O boi não frustra quem está atento aos processos e focado em suas metas produtivas e econômicas. Por isso é importante agradecer a sua fazenda, sua equipe e ao seu rebanho. Cuide bem deles. Esteja atento. Vai passar.

Fonte: Scot Consultoria

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