Grande competição de touros Nelore puxadores de pedra, o Mahanandi, acontece neste fim de fevereiro; conheça um pouco mais dessa tradição secular
O Nelore foi trazido da Índia para o Brasil no século passado, isso todos já sabem. No entanto, o que nem todos conhecem é que, em seu país de origem, ele desempenha uma atividade pouco comum para nós brasileiros. Os animais da raça Ongole, como são chamados na Índia, também são utilizados como tração animal para arar as terras agrícolas do extenso território indiano. Foi dessa prática que surgiram os torneios de puxadores de pedra, nos quais touros da raça demonstram sua força, chegando a puxar pedras de mais de duas toneladas.
As competições do torneio de Mahanandeeshwara Swamy Temple, Mahanandi, ocorrem na região de Andhra Pradesh, sudeste do país, e devem acontecer no dia 27 de fevereiro. O templo é sagrado para os indianos, onde inclusive existe uma estátua enorme do Boi Nandi. Segundo Tejeswara Reddy, indiano apaixonado pelo Nelore brasileiro e apelidado carinhosamente de Teja, o evento é um dos maiores eventos esportivos e religiosos da Índia, bem como uma grande herança cultural da região que tem no Zebu um dos seus patrimônios culturais.
“Mahanandi é um dos locais icônicos e mais antigos neste esporte animal, abrangendo cerca de 200 anos. Os proprietários de touros competem pelo nome e fama. Após a vitória, a multidão aplaude e é possível sentir a energia positiva do Deus Shiva. O torneio Mahanandi é realizado na ocasião do Maha Shivaratri (casamento do senhor Shiva e Parvati e para seu Tandava) no dia seguinte após o festival. Atualmente são três dias de competição com três categorias diferentes, algumas décadas atrás eram apenas 2 tamanhos (a pedra maior e uma um pouco menor) basicamente chamados de 1º e 2º tamanho”, relata Teja.
Segundo Carlos Marino, nelorista e especialista no assunto, o evento é também a principal festa religiosa do hinduísmo. Por mais que hoje a Índia esteja dividida entre várias religiões, a região de Andhra Pradesh é muito forte de hinduísmo ainda. “O torneio de Mahanandi passou a ser considerado o mais importante no decorrer dos anos, é um dos torneios mais antigos do gênero”, revela o especialista.
Teja conta que o torneio tem uma forte relação com o Brasil, pois os primeiros exploradores que saíram do Brasil em direção à Índia, em busca da raça, tiveram acesso aos touros que competiam no Mahanandi. Segundo ele, a raça é selecionada ao longo dos últimos séculos para força e potência, e ressalta que as corridas de puxar pedra se espalharam por todo o Sul da Índia.
Segundo o indiano os touros mais icônicos a participar e ganhar o campeonato Mahanandi foram VEMAVARAM, CHOWTIPALLE, GOPALAPETA, GHANDIVA, AVULAMPALLI, DHEERA ao longo dos anos. Teja confessa que a raça Ongole é um dos orgulho da nação indiana,
Qual a relação entre Mahanandi e o Nelore brasileiro?
O Nelore é disparado a raça de maior sucesso no Brasil, e para entender esse sucesso precisamos conhecer um pouco mais de suas origens e porque puxar pedras tem relação com esse sucesso. Para isso conversamos com Carlos Marino, um dos maiores nomes do Nelore e conhecedor da cultura indiana, quando o assunto é zebu.
Marino disse que primeiramente, para se produzir um puxador de pedra, é necessário entender que ele irá nascer em uma condição restritiva, porque lá na Índia é tudo em aldeias ou pequenas fazendas. Lá os machos são usados para tração e as fêmeas para leite, normalmente, já que eles não comem carne bovina na região de Andhra Pradesh. A fêmea, para criar um bom bezerro com desenvolvimento esquelético e muscular adequado para ser um bom puxador de pedra ou um bom tracionador de arado, que ainda é usado lá, a vaca tem que ser boa de leite.
Em segundo lugar, os machos jovens são treinados desde jovens para os torneios. Então, se eles não mostrarem a força que eles têm nessa parte de esqueleto, ossatura, musculatura, e bons aprumos desde jovem, eles são descartados como competidores, e consequentemente não se tornam reprodutores.
E aí no decorrer da carreira desses touros puxadores de pedra o que você tem que olhar é a força e musculatura forte de pescoço, isso denota masculinidade. Outro fator que é intrínseco a estas características, é a libido, mostrando-se capaz de cobrir muitas vacas na estação de monta.
Outra condição determinante é ter um animal de constituição física robusta, ou seja, costelas arqueadas, profundas, espaço para bom funcionamento de aparelho reprodutor, cardíaco e digestivo. Esses fatores contribuem para que o touro seja um bom puxador de pedra. E isso começa, inclusive, na raça, com narinas bem dilatadas para o animal respirar bem, boca grossa e grande para poder apreender bem o alimento.
Ser campeão no Mahanandi só demonstra que o racial do animal também deve ser impecável, para desempenhar um bom papel durante as competições de força e potencial. Esse tipo de prova vai provar um animal ideal para puxar um arado, pois nas competições as pedras podem chegar a três toneladas.
Por fim os animais precisam de aprumos e cascos perfeitos para que possam usar toda a força dos membros e jarretes para fazer uma força descomunal. Toda a sustentação está nestes membros inferiores, os cascos são o começo de tudo, resumidamente, essa conjunção entre casco, articulação, ossatura e musculatura dos membros tem que ser perfeita, para que esses animais sejam realmente bons puxadores.
“Tudo isso que eu estou falando tem a ver com a questão do animal funcional a campo. O animal que anda grandes distâncias para apreender alimento, tomar água, o animal que consegue se defender de situações de ameaça natural, o touro que precisa andar atrás da vaca, a vaca que precisa cuidar bem do bezerro. Tudo isso que está ligado a um bom puxador de pedra tem a ver com rusticidade, funcionalidade e produtividade no Nelore, tão perfeito para o Brasil“, resumiu o especialista.
Com a colaboração de Carlos Marino e do indiano Tejeswara Reddy
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