Você comeria carne sintética? Esta carne é produzida a partir de células-tronco animais, sendo cultivadas e alimentadas com nutrientes em laboratório
Há cerca de dois meses a empresa Memphis Meats anunciou o desenvolvimento de carne de frango cultivada em laboratório. O fato reascende questionamentos sobre este assunto e comprova que as pesquisas nesse campo avançam rapidamente, já que há quatro anos pesquisadores holandeses anunciavam ter criado o primeiro hambúrguer bovino in vitro.
Esta carne é produzida a partir de células-tronco animais, sendo cultivadas e alimentadas com nutrientes em laboratório por volta de 21 dias até que ficarem grandes o suficiente para ser cozidas e comidas.
A produção de carne em laboratório
O processo inicia-se com a coleta de um pequeno pedaço de tecido muscular animal de onde são extraídas as células indiferenciadas que são estimuladas a se transformarem em células musculares. Sendo assim, essas células fudem-se formando os miotubos musculares, eu são colocados em placa de Petri ao redor de uma estrutura circular contendo gel para aumentar de tamanho. Este tecido muscular é combinado com tecido de gordura, também cultivado em laboratório, formando o produto com um sabor próximo ao da carne tradicional. Como essa carne não contém mioglobina (proteína que confere a cor vermelha as carnes) são adicionados açafrão, corante caramelo e suco de beterraba, deixando hambúrguer com aspecto avermelhado.
O primeiro hambúrguer de carne cultivado em laboratório foi apresentado à imprensa em 2013, sendo desenvolvido por Mark Post da Maastricht University, na Holanda. Na ocasião, o alimento não arrancou muitos elogios dos provadores, entretanto, serviu para colocar um foco na questão de como os governantes irão regulamentar o campo emergente da agricultura celular, que usa a biotecnologia em vez de animais para produzir carne, leite e ovos.
Até agora, nenhum desses alimentos sintéticos chegou ao mercado, porém há número significativo de empresas iniciantes nos EUA e em outras partes do mundo tentando aumentar a produção. Isto porque, desde quando a técnica foi desenvolvida, a barreira para que chegassem as mãos dos consumidores foi o custo de produção. Em 2013, foram gastos em torno de US $ 325.000 para produzir a carne in vitro, mas o processo foi refinado, e o custo para produção de um hambúrguer atualmente foi reduzido para US $ 11,36.
Os principais pontos levantados pelos pesquisadores em defesa da carne artificial é que esta é uma “carne limpa”, pois a produção emitiria 96% menos gases de efeito estufa (GEE) do que a carne tradicional e usaria de 82% a 96% menos água do que o sistema tradicional, além de evitar o abate dos animais.
Repercussão da carne artificial: Você comeria?
Um estudo realizado por pesquisadores Wilks e Phillips da School of Psychology da University of Queensland, publicada em fevereiro de 2017, verificou as opiniões de cidadãos nos Estados Unidos, um país com um grande apetite pelas carnes e um apetite igualmente voraz em adotar novas tecnologias. Um total de 673 pessoas responderam à pesquisa, realizada on-line, na qual foram dadas informações sobre carne cultivada e feitas perguntas sobre suas impressões em relação a ela.
Embora a maioria das pessoas (65%), particularmente os homens, estivessem dispostos a experimentar a carne artificial, apenas um terço disseram que poderiam usá-la regularmente ou para substituir a carne tradicional.
Muitas pessoas estavam indecisas: 26% não sabiam se a utilizariam como uma substituta para a carne tradicional e 31% não sabiam se comeriam regularmente. Isso sugere que existe ainda certo receio entre a população.
As maiores preocupações foram em relação ao gosto e o fato de não ser muito atrativa, particularmente no caso de carnes de peixe e frango. Apenas dois terços das pessoas que as consomem regularmente continuariam se fossem produzidas pelo método in vitro. Em contrapartida, 72% das pessoas que normalmente comem carne bovina e produtos de suínos continuariam a fazê-lo se fossem produzidas artificialmente.
As vantagens desta carne percebidas pelos entrevistados foram: a forma de produção é mais ética; o produto é amigo do ambiente e do animal; e é menos propenso a transmitir doenças. As desvantagens foram: a carne in vitro foi percebida como não natural; é potencialmente menos saborosa; e com probabilidade de ter um impacto negativo sobre os trabalhadores do campo, colocando-os fora do agronegócio.
De fato, as preocupações dos consumidores diante dessa novidade possuem todo sentido, principalmente por não ser um produto natural. São adicionadas outras substâncias para melhorar o gosto e dar cor a esta carne, indo contra corrente cada vez mais forte de tornar a alimentação humana mais natural e equilibrada. Além disso, os efeitos do consumo frequente ainda não são bem conhecidos pela comunidade científica.
A percepção que estes avanços científicos trazem é que independente da forma com que a carne seja produzida, ela é sem dúvida um produto singular em relação ao valor nutricional e de grande importância na alimentação humana. Isso justifica o interesse e o foco dos pesquisadores por diferentes formas de produção.
Em vista de todas essas colocações, de uma coisa se pode ter certeza: “A carne é e continuará sendo o ator principal no prato da maioria das pessoas.”
Fonte: Carne com consciência