Além de trazer fundamentos éticos à bovinocultura, o bem-estar garante melhora na produção, já que estes respondem com melhor ganho de peso ou maior produção de leite.
Caio Nunes Christoffe Simões1
Fernanda Vieira Galvão1
Gabrielle Araujo Rodrigues dos Santos1
Ana Paula Lopes Marques2
Na produção animal discussões sobre bem-estar vêm ganhando cada vez mais espaço. Além de trazer fundamentos éticos à bovinocultura, o bem-estar garante melhora na produção, pois quando o proprietário entende que é sua responsabilidade fornecer aos animais condições para que tenham uma vida digna e saudável, estes respondem com melhor ganho de peso ou maior produção de leite.
No século XVI a Europa já discutia sobre bem-estar animal no manejo pré-abate. Em 1822, a Grã Bretanha criou a 1ª Lei geral sobre bem-estar animal. Em 1979 o Farm Animal Welfare Council, na Inglaterra, estabeleceu as cinco liberdades dos animais, fundamentando as abordagens técnicas sobre o bem-estar animal no mundo todo. De acordo com as cinco liberdades, todo animal tem o direito de estar livre de fome e sede; livre de desconforto (com acesso a abrigo adequado àquela espécie); livre de doença, dor ou injúria (não podendo, portanto, ser maltratado ou mantido sob condições sanitárias inadequadas); ter liberdade para expressar comportamentos naturais da espécie e estar livre de medo ou angústia mental, minimizando os estímulos estressantes.
No Brasil, apenas em 1934, com o Decreto nº 24.645/34, que se inicia a discussão de bem-estar em animais de produção e, desde então, diversas publicações ganharam força na atualidade. A portaria Nº 62, de 10 de maio de 2018, emitida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, estabelece procedimentos de boas práticas relacionadas ao transporte, manejo pré-abate, abate humanitário, métodos de insensibilização, bem como a obrigatoriedade de que todo e qualquer estabelecimento que desenvolva atividade de abate conte com um responsável pelo bem-estar animal.
Bem-estar não é só usar “bandeirinha” para não machucar os animais durante o manejo. Pode-se avaliar o grau de bem-estar dos animais de produção a partir do modelo dos “Cinco Domínios”, considerando que “nutrição” (Domínio 1), “ambiente” (Domínio 2), “saúde” (Domínio 3) e “comportamento” (Domínio 4) são estados internos ou físico-funcionais do animal e, o domínio “mental” (Domínio 5) se refere as experiências afetivas.
Todos os sistemas de produção animal podem utilizar o modelo dos “Cinco Domínios”. Aplicando a bovinos de corte em fase de terminação, ou bezerras de leite em regime de produção intensiva, imagine que se os animais forem submetidos a confinamento que exceda o número de animais por m² com baixo grau de saneamento, fere-se o Domínio 2, “ambiente”, então o nível de estresse dos animais aumenta, agrava-se a competição social e, o Domínio 4, “comportamento” se altera. Nesse caso haverá redução da ingestão de alimentos e água alterando o Domínio 1, “nutrição”, que associado ao aumento do estresse leva à redução da imunidade, prejudicando o Domínio 3, “saúde”. Por fim, o Domínio 5, “estado mental”, é negativo, e o animal desenvolve medo, ansiedade e fome, muitas vezes com apetite depravado. Neste cenário, o bem-estar animal está comprometido, e a produção jamais será eficiente.
O gado leiteiro sofre maior influência humana devido ao manejo diário de ordenha ao qual o animal é submetido. Assim, além dos fatores ambientais, nutricionais e sanitários, se torna necessária a criação de uma rotina de boas práticas que visem o bem-estar animal e a qualidade do leite. A realização de um manejo aversivo, além da queda na produtividade, tende a alterar o comportamento do animal dificultando seu manejo.
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A produtividade do rebanho é o reflexo do manejo ao qual o mesmo é submetido, por isso, é de extrema importância ter, desde uma estrutura que atenda as necessidades dos animais, fornecendo-o conforto e segurança, como também trabalhadores treinados para lidarem com os mesmos. O ideal, tanto para pecuária de corte como para de leite, são funcionários atentos aos fundamentos de bem-estar e seus conceitos, para que as ações estejam focadas na rentabilidade, mas sem depreciar a sustentabilidade dos sistemas de produção e o bem-estar dos animais.
Nos dias de hoje é necessário ter em mente que o bem-estar, além de respeito às necessidades físicas e mentais dos animais, gera melhores resultados de produtividade e, em relação aos consumidores, estes se sentem mais confortáveis com a procedência ética do produto que consomem, resultando em ganhos diretos e indiretos para a pecuária.
1 Discentes e 2 Orientadora, Grupo de Estudos Liga de Bovinos – LiBovis
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRRJ
Referências
BRASIL. Decreto nº 24.645, de 10 de julho de 1934. Estabelece medidas de proteção aos animais. Coleção de Leis do Brasil, Brasília, DF, v. 4, p. 720.
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Portaria nº 62, de 10 de maio de 2018. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 18 mai. 2018. Seção 1, p. 24.
DA COSTA, M. P. Comportamento e bem-estar de bovinos e suas relações com a produção de qualidade.In: Anais dos Simpósios da 41a Reunião da Sociedade Brasileira de Zootecnia. Campo Grande, Brasil. 2004. p. 260-268.
DA SILVA BRAGA, J. et al. O modelo dos “Cinco Domínios” do bem-estar animal aplicado em sistemas intensivos de produção de bovinos, suínos e aves. Revista Brasileira de Zoociências, Juiz de Fora, v. 19, n. 2, p. 204-226, 2018.