Valem mesmo milhões as pedras da vesícula do boi exaltadas por Bolsonaro? Vamos entender essa história e o mercado que podemos atingir com essa “pedra”!
Como já tinha feito com o metal nióbio, que exaltou como suposta fonte de riqueza exclusiva do Brasil, o presidente Jair Bolsonaro trouxe à tona nesta semana outro item exótico da pauta de exportações que estaria precisando de mais atenção por parte do governo: a pedra da vesícula dos bovinos.
“Tenho conversado com o Ministério da Agricultura, com a [ministra] Tereza Cristina, e foi resolvido isso aí. Quem matar boi, se o boi tiver cálculo renal, vai poder exportar. É caríssimo. Dinheiro que estavam jogando fora. Essas pedras aí fora tem utilidade para fazer remédio”, afirmou o presidente durante live nas redes sociais na quinta-feira.
Quem matar boi, se o boi tiver cálculo renal, vai poder exportar. É caríssimo.
De fato, por sua raridade e supostos efeitos medicinais valorizados no Oriente, o cálculo biliar dos bovinos é caríssimo. Segundo o “garimpeiro” das pedrinhas de vesículas Djalma Alves, de Umuarama, noroeste do Paraná, paga-se hoje no mercado brasileiro entre R$ 12 mil a R$ 37 mil o quilo do cálculo biliar dos ruminantes. “Tem classificação, se for uma coloração boa, alaranjada, o preço chega a R$ 37 mil. Se for mais escura, pagam menos”, explica.
Valorizado a “preço de ouro”, o cálculo bovino é tão difícil de achar quanto o célebre metal. Para juntar um quilo, milhares de bois têm de passar pelo abate, e ainda é preciso contar com a sorte.
“Falar em R$ 30 mil a R$ 40 mil o quilo, parece bastante, é um número bonito. Mas dentro do negócio do frigorífico é algo muito pequeno. (A pedra) é rara e pesa apenas alguns gramas. Para conseguir fazer um quilo tem que matar até 200 mil cabeças de gado”, observa Ângelo Setim Neto, diretor do frigorífico Argos, em São José dos Pinhais (PR).
“Não é significativo para gerar divisas para o país”, assegura o empresário.
E quanto à necessidade, levantada por Bolsonaro, de regulamentar a exportação do cálculo vesicular bovinos e evitar que essa riqueza seja jogada fora?
Pedras são raras, mas não vão para o lixo
Começando pela última parte, com os preços citados, ninguém mais joga essas pedrinhas no lixo. Todos os frigoríficos dispõem de uma espécie de cofre “boca de lobo”, dotado de uma peneira, em que o conteúdo da vesícula é despejado.
“O conteúdo passa por um processo de filtragem onde as pedras que existem são coletadas, higienizadas e deixadas para secar, para então serem utilizadas terapeuticamente”, diz o especialista em medicina chinesa Reginaldo de Carvalho Silva Filho, presidente da Escola Brasileira de Medicina Chinesa (Ebramec).
E haveria mesmo a necessidade de regulamentar as exportações, como foi aventado pelo presidente? Segundo o Ministério da Agricultura, o comércio dessas “pedras preciosas” já está plenamente formalizado e regulamentado.
Os cálculos bovinos entrariam na lista de produtos de exportação sob a nomenclatura de “despojos”, que incluem outras partes do boi pouco consumidas no Brasil, mas valorizadas lá fora, como o sistema digestivo (omaso, retículo e rúmen), tendões, a artéria aorta e o vergalho (membro masculino do boi).
Em 2010, os cálculos biliares bovinos foram o principal produto enviado pelo serviço Exporta Fácil, dos Correios, para o Japão e a China.
Para o professor e zootecnista Paolo Rossi Jr, do Centro de Informação do Agronegócio da UFPR, os exportadores não necessariamente seguem os caminhos oficiais.
“É um mercado clandestino, não se sabe quem compra nem como essas pedras saem do país. Não temos dados sobre o volume disso. Os frigoríficos guardam essas informações a sete chaves”, sublinha.
Rossi já ouviu falar de aplicações afrodisíacas e medicinais das pedras vesiculares, mas acredita num outro destino mais provável: “De tudo o que ouvi até hoje, o que parece fazer mais sentido é que eles usam o cálculo para induzir em ostras a formação de pérolas. Faz sentido, afinal é um conglomerado mineral e a pérola não é nada mais do que isso, dentro de uma ostra”.
Achar as preciosas pedrinhas vesiculares bovinas tende a ser cada vez mais difícil. Setim Neto lembra que o cálculo biliar é uma doença que acomete indivíduos mais velhos.
“Com a melhoria da produção dos bovinos, o animal vai ao abate mais cedo, para gerar uma carne mais macia. Então, o giro da produção é menor e a probabilidade de desenvolver um cálculo também”, observa o empresário, que abate até 400 bovinos por dia em seu frigorífico na região de Curitiba. “As pedrinhas são vendidas a cada seis meses ou um ano, de tão pouco que é”, acrescenta.
Djalma, o comerciante de pedrinhas da Ox Gall Stones, de Umuarama, garante que o negócio é bom, mas não deixa ninguém rico. “Estou no ramo dessas pedras há quinze anos. Já exportei para o Japão e para a China. Dá muito pouco, ainda mais agora, que o gado morre mais cedo. Se fiquei rico? Tenho uma Cherokee 2009. E rezo para não quebrar, se não estou ferrado”.
Na medicina chinesa, pedras valem ouro
O cálculo biliar bovino é largamente utilizado na medicina chinesa. Os tratamentos vão de doenças respiratórias — como bronquite, pneumonia e tosse — até coma e epilepsia.
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Segundo os médicos David Wang e Martin C. Carey, em artigo de 2014 publicado na revista científica norte-americana World Journal of Gastroenterology, seu uso tem efeito de tranquilizante e sedativo, e é utilizado há pelo menos dois mil anos — registrado em livros chineses que datam de 200 a.C.
Suas propriedades integram remédios populares como o chamado “Bezoar Bolus for Ressurrection”, uma mistura de ervas e raízes que ajuda a tratar febre alta. As pesquisas apontam, ainda, que ele é eficaz no tratamento de doenças infantis.
Fonte: Gazeta do Povo