Manter a família trabalhando unida nos negócios não é tarefa simples em qualquer setor.
Larissa Vieira
Mais de 80% das empresas no Brasil são familiares, principalmente no agronegócio, mas somente cerca de 5% delas chegam à terceira geração, segundo dados da consultoria Safras & Cifras. A maior parte termina por conflitos entre os sócios familiares, que não sabem separar o que é o patrimônio da empresa e da família, sustento e investimento.
Como estar entre os 5%? Um dos caminhos para chegar lá é realizar o quanto antes o planejamento sucessório. “Esta é uma ferramenta poderosa que deve ser usada enquanto os patriarcas ainda estão vivos, têm boa saúde e lucidez para comandar os negócios. Assim, eles podem decidir qual o melhor direcionamento para dar ao patrimônio e como gostariam que seus filhos usassem a herança que deixará a eles futuramente”, ensina o advogado e consultor da RCA Governança e Sucessão, Marcos Leandro Pereira.
Lembrando que, no Brasil, ainda há um conceito equivocado de que o planejamento sucessório está ligado à morte do patriarca ou à sua velhice, ele ressalta que o processo, quanto mais cedo for realizado, terá mais chances de proteger o patrimônio da empresa. E se já tiver surgido algum conflito de relacionamento entre os sucessores, a necessidade de implantação do planejamento se torna urgente.
Este não é o caso da família do pecuarista Júlio Vieira Neto, mas ele já iniciou o processo para legalizar a sucessão. De comum acordo com toda a família, ficou decidido que a gestão do negócio seguirá com a filha, Camilla Vieira. “A parte burocrática da sucessão ainda está em andamento, mas já gerencio o negócio há algum tempo, com meu pai me dando suporte sempre que pode, e conto com uma equipe bem eficiente”, diz Camilla, que tem uma irmã também médica-veterinária, mas que prefere atuar na área de saúde pública.
Camilla assumiu a gerência de todas as propriedades há 12 anos, depois de passar um período prestando assistência para várias fazendas, incluindo as da sua família. Com a expansão dos negócios, optou por trabalhar exclusivamente com o pai. Hoje, além da parte administrativa, ela é responsável pela reprodução do rebanho e pela comercialização de animais. E, com referência à área de nutrição, conta com os produtos e a assistência da Tortuga | DSM, prestada pelo técnico Thiago Andreolli.
O rebanho PO da raça Nelore e de cavalos Quarto-de-Milha está concentrado na Fazenda Santa Margarida, em Bofete (SP).
“Meu pai tem feito tudo para que a sucessão aconteça de forma tranquila. Para minha irmã e minha mãe, também é natural que eu seja a gestora dos negócios”, conta Camilla.
PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
Segundo os especialistas, o planejamento sucessório vai além da parte de governança e gestão. “Essa é, ainda, uma forma de proteção patrimonial e de reduzir o pagamento de tributos”, explica o consultor da RCA Governança e Sucessão. É que, sobre a herança ou doação dos bens para os sucessores, incide o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que tem alíquota diferente em cada estado. A base de cálculo é o valor venal dos bens, dos títulos ou dos créditos transmitidos ou doados. Também pode haver a cobrança de Imposto de Renda sobre o Ganho de Capital, dependendo da situação, quando o herdeiro decide vender um imóvel. Então, um planejamento sucessório e tributário bem feito é capaz de propiciar grande economia aos herdeiros, sem que se burle a lei. Cada caso exige um planejamento específico e um profissional especializado no assunto pode orientar a família nesse processo.
Planejar a sucessão com antecedência permite, ainda, minimizar possíveis conflitos entre os herdeiros, além de facilitar a transição da titularidade do patrimônio para garantir a continuidade do negócio familiar. “Esta é uma prática cada vez mais incentivada pelos próprios bancos e pelas cooperativas, pois quando você estimula o planejamento, também está incentivando as boas práticas de Governança, que melhoram o resultado da empresa porque garantem a transparência, a equidade, a prestação de contas e a sustentabilidade dos negócios.
Além disso, gera uma reflexão sobre a qualidade da gestão”, enfatiza o consultor da RCA, que, há 15 anos, atua na área de Planejamento Sucessório no agronegócio.
DE PAI PARA FILHOS
Como pequenas decisões podem ser determinantes para uma propriedade alcançar ou não o resultado esperado, definir o papel de cada membro nos negócios é essencial. Na família Vilhena, dois dos quatro filhos já demonstraram interesse em dar continuidade aos negócios. O amor do pai, Aristides, pela terra e pelo gado foi o que incentivou a médica-veterinária, Carolina Villhena Bittencourt, a trilhar o caminho desbravado por ele ainda na década de 80. Foi nesta época que o senhor Aristides conseguiu realizar seu sonho de menino e se tornou fazendeiro ao adquirir uma propriedade no município de Prata (MG). Lá, Carolina e as irmãs acompanhavam a lida do pai na criação de gado e se divertiam andando a cavalo. “Meu pai conseguiu erguer as empresas da família com muito trabalho e esforço. Hoje, essa paixão pela terra também é minha. Sou responsável pela gestão da parte de pecuária do negócio e o meu irmão atua na indústria de charque, mas meu pai continua à frente dos negócios”, explica Carolina.
Na pecuária, a família trabalha com o ciclo completo, dividido em duas propriedades, uma em Minas Gerais e outra em São Paulo. A base do rebanho é de animais meio-sangue Nelore/Angus. A engorda é feita no semiconfinamento, com o gado suplementado com produtos Tortuga | DSM e em sistema rotacionado de pastagem. Além de cuidar da parte de pecuária de corte, Carolina comanda na fazenda localizada em Bofete (SP) a queijaria “Belafazenda”, onde produz queijo artesanal.
O planejamento sucessório já foi realizado pela família, que contou com a ajuda de um escritório especializado para auxiliá- los no processo. Aos 72 anos, o senhor Aristides continua atuante no negócio, trabalhando conjuntamente com os dois filhos que se interessaram por participar da sucessão.
Para os especialistas, os benefícios do planejamento sucessório superam a manutenção do negócio, já que, com ele, também é possível evitar atritos que podem gerar rompimento familiar, com disputas por patrimônio e poder.
Um problema que afeta as empresas familiares e leva à divisão precoce dos bens é a reivindicação, por algum membro da família, de sua parte do negócio. Isso ocorre, principalmente, entre os filhos que não estão atuando no dia a dia da empresa e desconhecem as necessidades do negócio e o poder de endividamento. Para viabilizar os negócios, é comum que os produtores rurais realizem empréstimos. Os herdeiros que não participam ativamente da gestão podem deduzir que, como estão sendo feitos vários investimentos, há dinheiro sobrando em caixa e querem sua parte nos negócios.
Ainda é preciso determinar regras claras para o uso do patrimônio da empresa pelos sucessores. A partir dos fundadores, é preciso criar, na primeira geração, uma nítida separação entre patrimônio e família. O caixa da empresa não pode ser o caixa comum da família, pois, com a chegada das novas gerações, é provável que o dinheiro da empresa não seja suficiente para sustentar todos os seus membros.Segundo Pereira, é muito comum nas empresas familiares misturar os dois patrimônios.
Para evitar esses problemas, muitos grupos familiares do agronegócio estão criando holdings, que possibilitam implementar o planejamento sucessório e ferramentas de organização, controle e economia tributária. Além disso, a holding familiar cria mecanismos para a proteção patrimonial comum de atos e negócios pessoais dos herdeiros e possibilita a constituição de estruturas societárias que separem as áreas produtivas das patrimoniais.
Fonte: DSM Tortuga