Com a alta dos combustíveis, sobem os custos de produção e os fretes, que poderão acelerar o aumento dos preços ao consumidor final.
O aumento no preço do diesel e da gasolina, anunciado pela Petrobras, nesta quinta-feira (10/3), deve ter impacto direto nos custos de produção, com riscos de reduzir os investimentos no plantio da safra 2022/2023, além de acelerar o aumento de preços ao consumidor final. O preço médio do diesel sofreu alta de 24,9% nas refinarias, passando de R$ 3,61 a R$ 4,51, uma alta de 24,9%. A gasolina subiu 18,7% para R$ 3,86 o litro. Por enquanto, não há estimativa de quanto será cobrado pelo combustível na bomba.
Nesta semana, o preço do barril do petróleo chegou US$ 139, o maior patamar em 14 anos, em decorrência da guerra da entre a Rússia e a Ucrânia, que pode manter pressionado o preço do produto, mesmo após recuos na cotação, segundo analistas. Essa pressão, levou o Senado a aprovar um fundo para a estabilização do preço do combustível, projeto que precisa ainda ser analisado pela Câmara.
Embora o preço do diesel tenha sido o que mais subiu no ano passado entre os combustíveis, com alta de 46,8% em relação a 2020, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Fábio Silveira, sócio-diretor da Macrosector Consultores, explica que não houve grandes impactos na época no agropecuário, porque a relação de troca, que é a evolução do preço agrícola em comparação ao preço de insumos e do diesel, foi favorável. “O produtor rural no ano passado teve um excelente desempenho, porque os preços dos produtos agrícolas ainda guardavam favorável relação frente aos preços de insumos”, diz.
Mas, com essa escalada no preço dos combustíveis, que também influencia o preço da uréia, nitrogenado da amônia usado como fertilizante, que é derivado do petróleo, a situação se complicou. “O preço do óleo diesel subiu bem menos em 2021 que os preços agrícolas, mas em função da guerra da Ucrânia e risco de escassez de petróleo, o produtor rural vai ter um desempenho neste ano menos favorável, porque a rentabilidade será pior, porque não vai ter alta de preços tão expressiva de soja, milho, arroz e feijão. E vai ter pela frente um preço médio de óleo diesel mais elevado”, explica ele.
Somado à escalada do preço dos fertilizantes, isso trará sérios problemas ao setor agrícola, com impactos na produção em 2023. “Vai ser um ano cuja rentabilidade do produtor rural será consideravelmente menor do que a do ano passado. E isso dá para dizer, estando apenas no início de março, mas vendo a evolução desses preços, com perspectivas de preços agrícolas e de insumos apresentando relação bastante desfavorável, vai inibir a produção agrícola da safra 2022/2023”, afirma, embora ainda não haja uma estimativa de queda.
Pergunta do milhão
Vanessa Gasch, coordenadora de desenvolvimento regional do Instituto Mato-Grossense de Economia Agrícola (Imea), diz que essa é a “pergunta do milhão” frente a todas as pressões que o agricultor está enfrentando no início deste ano. Segundo ela, no ano passado a alta do preço do diesel elevou os custos operacionais dentro das lavouras de soja, milho e algodão do Estado em 17%, 30% e 21%.
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“O que sabemos é que o produtor já foi penalizado e conseguiu manobrar e passar por cima desses aumentos. E estamos estimando uma safra 2021/2022 dentro da normalidade no Estado, com previsão de 40,6 milhões de toneladas de milho, e 39,2 milhões de toneladas de soja”, diz. Para a safra 2022/2023, a pressão do diesel dentro das propriedades vai subir 26% na cultura de soja, 19% na de milho e 6% no algodão. “E não conseguimos olhar para a safra 2022/2023 porque tem muita coisa acontecendo no mercado, tem a tensão na Europa, petróleo. Essa é a pergunta do milhão, não conseguimos dizer isso ainda.”
José Carlos Hausknecht, sócio-diretor da consultoria MBAgro, avalia que a queda na produção até pode acontecer no caso de produtos destinados ao consumo interno, como arroz, feijão, hortifrutis. Mas, para ele, apesar de pressionado, o setor agropecuário ainda tem pela frente preços em alta das principais commodities produzidas pelo Brasil, como a soja, o trigo, entre outras. “O preço do diesel com certeza atrapalha a rentabilidade do produtor. Por outro lado, estamos com mercado de venda bastante pressionando com a guerra e a seca, fazendo que os produtos agrícolas estejam em patamares elevados, o que ajuda a minimizar os efeitos dos combustíveis”, avalia.
Custo da guerra começa a pesar no bolso
O consumidor final também sentirá os efeitos da alta dos combustíveis, pois seus custos são um dos componentes do setor de logística, por meio do preço do frete de transporte dos produtos. Hausknecht diz que a alta para o consumidor vai depender da capacidade de cada setor de absorver o impacto da alta do diesel no frete e nos custos agrícolas. Nesse sentido, para não trabalhar com margens negativas, talvez o produtor tenha que reduzir a área plantada no caso de alimentos destinados ao mercado interno. “Se não tiver rentabilidade o produtor não vai produzir, pode reduzir a produção em caso de produtos que estejam pressionados”, afirma. “Mas no grosso da produção, que são commodities regidas pelo mercado externo, entendo que a rentabilidade é possível para se evitar uma queda na produção.”
Segundo Rodrigo Marinheiro, executivo de Relações Institucionais e Comunicação da Associação Paulista de Supermercados (APAS), o contexto do setor agrícola com escassez de fertilizantes, preço do trigo e, agora, aumento do preço dos combustíveis vai acelerar a alta dos preços em razão dos fretes mais elevados. “Os preços estão mais altos, como o do óleo, trigo e seus derivados. E vão continuar aumentado devido aos combustíveis. Isso porque nada garante que a produção nacional vai atender a demanda nacional”, explica o executivo.
No caso dos produtos importados, a alta do petróleo impacta diretamente os preços de transporte marítimo, que serão repassados pelo consumidor. “Não seria tão desesperador (a alta do diesel) se não estivéssemos em contexto de elevada taxa de juros para conter a inflação, principalmente no grupo de alimentos, que vai seguir em alta. É uma situação bem complicada”, diz ele, que espera alta até mesmo no preço das sacolas de plástico do supermercado, até mesmo nas sacolas de modelo ecológico.
Perpectivas
Heitor Paiva, analista de energia da consultoria Hedge Point Global Markets, avalia que a pressão sobre o preço do petróleo deve continuar, com o barril cotado por volta de US$ 130, apesar do recuo da cotação ontem e hoje. Ele explica que a saída do mercado da Rússia, que exporta 5 milhões de barris por dia, o segundo maior exportador do mundo, provoca a escassez do produto frente à uma demanda mundial muito alta. Segundo ele, os preços já estavam pressionados bem antes do início da guerra na Ucrânia, por falta de investimento em aumento da produção pelos países da Opep, e a situação se agravou agora.
Por mais que tem inflação nos EUA, a demanda por combustível continua forte, a perspectiva para o preço do petróleo é positiva porque a oferta não está se adequando. O que observamos ontem e um pouco hoje, é que o motivo de ter caído o preço ocorreu porque o mercado está com medo de destruição de demanda pelos altos preços, mas não parece cenário factível porque demanda continua alta. A tendência é de alta para os preços do petróleo, o que coloca desafios econômicos para o mundo e para o Brasil”, diz Paiva.
Fonte: Globo Rural