Artigo: Relações de confiança ou a melhor cotação do dia?

Por Fernando Furtado Velloso
Assessoria Agropecuária FFVelloso & Dimas Rocha

Na pecuária de corte, fala-se muito em “parceria”: eu tenho uma parceria com o plantador de soja, tenho uma parceria com a empresa de inseminação, com a empresa de produtos de nutrição animal, etc, etc. Algumas parcerias de fato existem e é real o compromisso mútuo nas relações e a continuidade de ações, tanto na área comercial como no suporte técnico possível e esperado. Em outros casos, a dita parceria é pontual ou só teórica (está só no discurso).

Essa abordagem serve tanto para as relações com empresas como para prestadores de serviços.
Tentarei abordar neste texto que é possível ter bons ganhos com o verdadeiro desenvolvimento de relações de confiança e não só com a busca pela melhor cotação do dia (para comprar ou vender um produto ou serviço).

As áreas nas quais podem ser desenvolvidas boas relações de confiança em pecuária são várias e os ganhos possíveis são muitos. Na assistência técnica (veterinário/agrônomo), na comercialização de animais (venda de gado para outros produtores ou frigoríficos), na aquisição de reprodutores, no transporte de animais e outros produtos, na aquisição de produtos veterinários ou para nutrição animal…

Avançar nestas relações de confiança depende da resposta para a seguinte pergunta:

Quero ter verdadeiros parceiros ou a melhor cotação do dia?

O veterinário pode realizar para a propriedade somente o Diagnóstico de Gestação (DG) e disparar, ou estar inserido de fato no programa reprodutivo e sanitário da fazenda. O corretor ou a leiloeira pode agir pontualmente, uma vez no ano, na venda de um lote ou na realização de um leilão, ou participar continuamente nas necessidades e oportunidades comerciais para o pecuarista. O consultor da empresa de nutrição animal pode esclarecer alguma dúvida somente na venda de uma carga de sal mineral ou ser verdadeiramente um orientador técnico para o planejamento do programa de suplementação do rebanho. O caminhoneiro pode só realizar o frete pelo menor valor possível no dia ou ser um integrante da equipe da fazenda, sempre sendo buscado nas necessidades de transporte, estando disponível e prestando o melhor serviço possível.

E como decidir entre o “plano mínimo” ou a “relação de confiança”?

Essa é uma opção e um caminho que depende do perfil de cada pessoa, tanto do produtor como de quem está do outro lado do balcão (técnico, vendedor, corretor, caminhoneiro, etc.). Pode-se optar pela relação pontual, pelo menor preço do dia, pelo compromisso mínimo (ou zero) na relação de trabalho ou comercial, pelo negócio “sem comissão” e por tantas outras situações que priorizam o imediato.

Na própria relação entre os produtores, notamos que a real integração é difícil ou sofre resistência. Alguns pecuaristas até reúnem-se para a realização de leilões (gado comercial ou reprodutores), mas poucos avançam em outras tantas áreas possíveis de ganhos em um trabalho “de grupo” ou integrado: no melhoramento genético dos rebanhos, na compra de insumos, na troca de experiências, no compartilhamento de tantas ações comuns a todo pecuarista.

Trago esse assunto neste texto baseado só em percepções pessoais e pelo que vejo e ouço em tantas propriedades visitadas nos últimos anos. Algumas estão permanentemente alterando seus “parceiros”, fornecedores, prestadores de serviço, etc. A sensação é meio de um permanente reiniciar, de um trabalho que está sendo sempre alterado, seja através das pessoas envolvidas, dos produtos usados, das decisões e alterações nos manejos, no sistema de produção, etc. Em outras, é possível ver que relações de confiança foram construídas e que há uma ordenação natural das coisas, dos responsáveis para cada função, do real compromisso e do comprometimento dos envolvidos.

Vivemos em uma era que temos toda informação ao alcance da mão. A tecnologia lançada ontem estará hoje em nossos computadores ou telefones. Os novos produtos aparecem todos os dias em nossos e-mails, desde a semente forrageira até o sal que controla o carrapato. As ofertas de gado e as oportunidades de negócio saltam nas tantas telas de nossos equipamentos. Tudo isso é ótimo e temos que aprender a conviver com tanta informação. O que não podemos esquecer é que todos os processos são feitos com e por pessoas. Este texto não traz nada de novo: valorizar as pessoas e as relações de confiança é a verdadeira parceria. Porém, ainda há quem opte pela melhor cotação do dia.

* Publicado na coluna Do Pasto ao Prato, Revista AG (Maio, 2017)

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