A estação de monta chega todo ano e com ela a ânsia do pecuarista adquirir a melhor genética bovina para o seu rebanho só aumenta.
Por Adilson Rodrigues
Com as edições dos sumários já consolidadas, os holofotes voltam-se aos touros melhor ranqueados. E aí mora o perigo!
O número decimal que designa o melhor reprodutor entre mil, pode esconder algumas pegadinhas. Atualmente, atua como um mindset, um poderoso gatilho mental que induz o subconsciente ao consumo deste material genético.
Mas, nem sempre um TOP 0.1% é o que a propaganda faz crer. É absolutamente comum e compreensível que um touro seja extremamente diferenciado em algumas DEPs e nem tanto em outras de grande impacto econômico.
Veja um exemplo prático
Após passar os olhos pelo Sumário Nelore Brasil da ANCP, dê uma boa olhada no primeiro colocado da tabela para Idade ao Primeiro Parto (IPP), um excelente animal, por sinal, sendo bem destacado em diversas qualidades.
É TOP 0.1% para IPP, 3P (Probabilidade de Prenhez Precoce), Stayability (Longevidade) e nas páginas posteriores em ACAB (Acabamento de Carcaça), porém, não está entre os líderes para PS (Precocidade ao Sobreano) e PPC (Peso da Porção Comestível), entre outras deps.
Noturno está no limite indicado pelos especialistas em habilidade materna, com TOP 35% para MP120, e um ranqueamento até bom para fertilidade, com 11% em PE365 (Perímetro Escrotal aos 365 dias), só que ainda distante daquele número, hoje, cabalístico.
Se o nobre leitor desejasse melhorar a habilidade materna do rebanho, em especial, este touro facilmente poderia ceder lugar a outras opções mais interessantes, incluindo reprodutores líderes em tal característica.
Importante certificar que a régua de deps esteja equilibrada. Como dito no post Sem critério, líder do ranking seria castrado, não existe touro perfeito. Em boa parte dos casos, animais TOP 30% já fariam milagres. E para não ficarmos apenas na especulação, vejamos a opinião de três especialistas no assunto:
Arnaldo Manuel Souza Borges, médico-veterinário, assessor técnico e presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ)
“Muita gente construiu touro TOP 0.1% só com base no computador. Um touro considerado o melhor de avaliação da raça Nelore, aos oito anos de idade já não produzia mais sêmen porque não conseguia ficar de pé. Conversando com Raysildo Lobo (ANCP) o próprio mostrou-se preocupado com a supervalorização do TOP 0.1%. Há topes 15, 20 ou 30% com qualidades produtivas importantes.”
José Bento Sterman Ferraz, médico-veterinário, mestre e doutor em Genética e professor titular de Melhoramento Animal FZEA/USP
“A supervalorização dos touros TOP 0.1% é um problema sério. O animal é “top” para quê? Alguns índices genéticos incluem características em demasia. Pra piorar, comparam touros topes com toda a população. É óbvio esperar-se que um touro safra 2014 seja melhor que um safra 1994. E o TOP de quem tem pastagem oriunda de ILP é diferente do TOP daquele que possui pastos de 25 anos em terreno superarenoso.”
William Koury Filho, zootecnista, jurado, consultor, mestre e doutor em Produção Animal
O melhoramento genético também vive seus dilemas, tais como desmistificar a busca insana pelo tal TOP 0.1%. Geralmente, pode ser um índice que não representa a necessidade no momento. Assim, um touro TOP 10% até 30% pode ser mais indicado aos objetivos, por apresentar biótipo mais adequado ou ser forte em uma característica reprodutiva de interesse ou ainda na habilidade materna que se precisa melhorar na seleção.
Então, o que fazer para escolher um bom touro?
Decisão poderia ser tomada em duas etapas.
Etapa 1 – Fertilidade e Habilidade Materna
“Ninguém comeu e nem vai comer carne de um bezerro que não nasceu, então, fertilidade é a característica mais importante. Além disso, peso à desmama, ganho de peso pós-desmama e acabamento de carcaça são características que qualquer pecuarista precisa ter no rebanho”, explica José Bento Sterman Ferraz.
Etapa 2 – Pente Fino
“Aí falamos de sintonia fina e dependerá do foco do criador. Se vai privilegiar terminação (eficiência alimentar), qualidade de carcaça e carne (medidas de ultrassom e maciez), produção de novilhas de reprodução, etc”, conclui o especialista.
Agora, a decisão é sua, não mais do marketing!
Via Pecnética