A iniciativa visa conservá-los em nitrogênio líquido, a uma temperatura de 196 graus célsius negativos, no Banco Genético da Embrapa, em Brasília.
A “Arca de Noé” da Embrapa foi incrementada com peixes de Tocantins. Nos últimos dias 28 e 29 de novembro, em Brejinho de Nazaré, no Centro-Sul do estado, pesquisadores dos centros de pesquisa da Embrapa Pesca e Aquicultura (Palmas, TO), Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília, DF) e Tabuleiros Costeiros (Aracaju, SE) coletaram 450 amostras de sêmen de 25 peixes, entre tambaquis (Colossoma macropomum) e caranhas (Piaractus brachypomus). O objetivo é garantir a variabilidade genética e a manutenção de características de interesse econômico que podem se perder com o tempo, após sucessivos cruzamentos das espécies.
Segundo Luciana Nakaghi Ganeco Kirschnik, pesquisadora da Embrapa Pesca e Aquicultura, foi a primeira vez que a Unidade fez a coleta. “Selecionamos os reprodutores que estavam aptos, coletamos o sêmen e criopreservamos em nitrogênio líquido”, explica ela, que faz parte da equipe de pesquisadores que realizaram a coleta em Brejinho.
A conservação de material genético de peixes já ocorre na Embrapa desde o início dos anos 2000, e no ano passado houve um incremento na quantidade de amostras armazenadas. “Até 2015 eram trabalhos pontuais, principalmente realizados pela Embrapa Pantanal, com espécies daquela região. Mas desde o ano passado a coleta ficou mais sistematizada, com amostras para o banco de sêmen, de tecido e de DNA”, explica Alexandre Nízio Maria, pesquisador da Embrapa Tabuleiros Costeiros.
Segundo ele, no Nordeste espécies como o tambaqui já estão sofrendo com o problema de endogamia. “Após 30 anos de criação intensiva para comercialização, observamos a reprodução de indivíduos aparentados, o que prejudica a variabilidade da espécie”, destaca Nízio. Com a conservação no Banco Genético da Embrapa, será possível retomar características perdidas e usar o material em programas de melhoramento genético.
Diferentemente de certos mamíferos, como os bovinos, que possuem um sistema de conservação e reprodução in vitro já dominado pela ciência, no caso dos peixes só é possível a coleta e armazenamento de material reprodutivo masculino. Para Alexandre Floriani Ramos, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Brasília-DF) e curador do Banco de Germoplasma Animal, há um longo caminho a ser percorrido pela piscicultura. “Ainda não é possível coletar e armazenar gametas femininos ou embriões com a qualidade necessária para a conservação, apenas masculinos. Assim, para reproduzir determinada espécie de peixe é necessário utilizar o sêmen congelado juntamente com óvulos de fêmeas vivas daquela mesma espécie. A técnica da conservação e reprodução de peixes in vitro ainda precisa avançar bastante, tal como ocorreu com a pecuária”, opina.
Banco genético da Embrapa vai conservar material de pecuaristas
No caso dos bovinos, a Embrapa quer integrar ao seu banco genético o material dos animais considerados formadores das principais linhagens de raças comerciais no Brasil, como nelore, angus ou gir. A empresa pretende fazer acordos com criadores e associações para uso e transferência de material genético, como sêmen, embriões ou amostras de DNA. “Precisamos conservar o material dos fundadores dessas raças e dos grandes reprodutores”, diz Ramos, acrescentando que a variabilidade genética do rebanho bovino está menor.
A Embrapa prestará o serviço de conservação gratuitamente. Isso é possível porque a empresa é autossuficiente na produção no nitrogênio usado nos tanques de conservação. Os termos dessa custódia serão definidos por um contrato com o proprietário do material. O documento, explica Ramos, estabelece condições de uso e disponibilidade.
O pesquisador da Embrapa pondera, no entanto, que será feita uma seleção criteriosa do material, com base na genealogia e na importância para a conservação e melhoramento genético. Ramos reforça que a intenção é preservar as referências das diversas linhagens presentes no rebanho bovino do Brasil.
A Embrapa começou a formar o banco de germoplasma animal em 1983, como sequência da conservação de amostras vegetais, iniciada em 1974. Atualmente, a divisão de Recursos Genéticos tem mais de 90 mil doses de sêmen, 450 embriões e 12 mil amostras de DNA. Do total, 80% são de bovinos, mas há também caprinos, ovinos, suínos, equinos e asininos. Diversificar ainda mais essa reserva de material se tornou possível com a ampliação do Banco Genético da Embrapa.
Chamado pela própria empresa de “Arca de Noé dos tempos modernos”, o banco genético visa preservar em um só lugar espécies animais, vegetais e microrganismos. O local funciona como um “backup” do que é pesquisado nas unidades da empresa pelo Brasil e que, a depender da necessidade, pode ser compartilhado com redes de pesquisa das quais ela é participante.
As informações do Banco Genético da Embrapa estão disponíveis para o público por meio do sistema Alelo Animal, que dispõe de ferramentas de gestão de dados de recursos genéticos animais, que possibilitam cadastrar animais e seus descritores, imagens, taxonomia, dados fenotípicos, genotípicos e genômicos. Além de propiciar o gerenciamento de coleções biológicas, o sistema permite que informações públicas sobre diferentes grupos de animais estejam disponíveis para a sociedade: equinos, bubalinos, bovinos, suínos, asininos, caprinos, ovinos, peixes de água doce, além de outras espécies de animais silvestres.
Por ELISÂNGELA SANTOS / NEO MONDO