A extensão rural consiste na transmissão do conhecimento às pessoas do campo. Ao longo do tempo, diferentes significados foram associados ao termo.
No Brasil e demais países da América Latina, temos o privilégio de possuir o livro “Extensão ou Comunicação?”, escrito por Paulo Freire, que nos convida a ter um olhar diferente do habitual para a relação criada entre extensionista e agricultores.
Em um dos Diálogos no LAE, projeto de extensão do Laboratório de Análises Socioeconômicas e Ciência Animal da FMVZ/USP, o convidado Laércio Meirelles, Agrônomo e Consultor em Agricultura Ecológica, contou que foi apresentado à extensão rural e a uma diferente forma de exercer sua profissão com o livro “Extensão ou Comunicação?”.
“Paulo Freire fala mais ou menos assim pra gente […] ‘Sejam educados, não cheguem [nas propriedades rurais] despejando conhecimento que vocês nem sabem se é apropriado para aquele contexto”, disse Laércio resumindo o que o autor ensina no livro.
Laércio ainda discorreu sobre a importância de entender nossa ignorância e nossos saberes. Segundo o agrônomo, é importante compreender que técnicos tiveram acesso a conhecimentos acumulados e compilados pela humanidade ao longo de décadas e que as famílias agricultoras possuem o conhecimento fruto do trabalho e cultura delas, também acumulado ao longo de décadas, e que ambos são essenciais para a construção de uma melhor produção de alimentos. “Vamos conhecer as diferentes formas de geração de conhecimento”, convida Laércio.
Esta forma de construção do conhecimento em conjunto entre técnicos e produtores é fundamental para o exercício e desenvolvimento de sistemas agro-eco-alimentares. Faz parte da concepção maior de agricultura ecológica.
A agricultura ecológica, em termos conceituais, pode ser considerada sinônimo da agroecologia. Segundo Laércio, para uma conceituação adequada do ponto de vista acadêmico, é necessário citar o autor ao qual queremos nos referir e considerar sua localização no espaço e no tempo, pois cada país ou região e época possui uma percepção e um entendimento diferentes sobre a agroecologia.
A região Sul do Brasil, por exemplo, é bastante influenciada pelos agrônomos Ana Primavesi e José Lucemberg, que sempre usaram o termo agricultura ecológica expressando que, para eles, não se tratava de uma mudança técnico-produtiva, mas também de outros valores.
“A gente falava que agricultura ecológica é muito mais que produzir sem veneno. Os agricultores e agricultoras expressavam muito isso, nós técnicos e técnicas também. Agricultura ecológica também é fazer comércio local”, disse Laércio, exemplificando a presença de valores sociais no exercício da agroecologia.
O mundo hoje está com problemas ambientais graves e a produção de alimentos é importante no processo de recuperação de um meio saudável. Contudo, o modelo de produção da forma como é dado hoje atua em movimento contrário à sustentabilidade.
O modelo que usamos de forma majoritária hoje “não é multiplicável por algumas décadas a mais”. Segue Laércio afirmando que “nós temos que redesenhar o modelo agrícola brasileiro”. Ele também se expressou quanto à importância da extensão rural neste contexto: “É urgente a transição agroecológica da extensão rural brasileira”, se referindo também aos órgãos públicos de extensão rural.
Laércio levantou o questionamento feito por muitos: “‘Ah, mas o modelo agroecológico vai alimentar o mundo?’ […] Vou dizer o seguinte: eu não sei se vai alimentar o mundo, eu sei que a Revolução Verde e o veneno, transgênicos e adubos químicos não alimentou. Nós temos 1 bilhão de pessoas com fome no mundo”.
Como seria essa transição para um sistema agroalimentar agroecológico? Laércio diz acreditar que a mudança acontecerá nas unidades produtivas, gerando como consequência a mudança no sistema agroalimentar mundial.
Esses e outros debates são realizados no Diálogos no LAE, evento de extensão universitária, periódico, gratuito e aberto, que estimula o questionamento acerca de processos estruturais e que procura desmistificar o senso comum de que, por aprendermos de uma forma, acreditamos que não há outra melhor.
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É preciso expandir nossos pensamentos e talvez chegarmos a modelos com maior potencial de ser saudável para a sociedade, meio ambiente e animais como um todo.
Fonte: MilkPoint