Como logística, infraestrutura de transporte e armazenamento afetam o agronegócio brasileiro? Confira as perguntas e respostas abaixo!
Graduado em Engenharia Mecânica pela Escola de Engenharia de Piracicaba (EEP), possui pós graduação em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), mestrado e doutorado em Geografia pela Unicamp e pós doutado em Geografia do Setor Sucroenergético pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Atualmente, Vitor Vencovsky é presidente da Associação das Empresas de Tecnologia de Piracicaba (ATEPI) e faz parte do Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (ESALQ-LOG).
Scot Consultoria: Qual custo a ineficiência logística confere ao agronegócio brasileiro?
Vitor Vencovsky: É uma pergunta difícil de responder, pois a realidade do agronegócio brasileiro é complexa e varia de região para região e de atividade para atividade. Uma resposta simples e fácil, como todos nós gostaríamos de apresentar, pode levar a grandes equívocos e à desinformação.
Para ajudar nessa resposta, é importante entender melhor o que significa agronegócio, logística e ineficiência. O agronegócio envolve uma variedade muito grande de produtos, que possuem características diferentes e que influenciam diretamente nas operações logísticas.
As atividades relacionadas à produção, armazenamento, transporte e distribuição são, portanto, particulares a cada tipo de produto. Por exemplo, produtos perecíveis e não perecíveis ou frigorificados e não frigorificados exigem soluções logísticas muito diferentes. Portanto, a logística de cada produto deve ser tratada de forma específica.
As diferenças na logística também estão relacionadas à origem e ao destino dos produtos. A logística de produtos para exportação é totalmente diferente daquela de produtos de consumo local ou nacional.
A região de origem dos produtos agropecuários também influencia na logística. Produtos distantes do mercado consumidor ou dos portos passam a exigir sistemas de transportes mais eficientes, para percorrer grandes distâncias. Esse é o caso da produção verificada na região Centro-Oeste, que é distante dos portos e do mercado consumidor. Por outro lado, quando a produção é realizada perto do consumo, as distâncias são menores e os desafios logísticos podem ser superados com mais facilidade.
No agronegócio, há uma certa confusão sobre o uso do termo logística, que muitas vezes é associado à infraestrutura de transporte e armazenamento. Na prática, no entanto, a logística envolve uma série de outras questões muito importantes, relacionadas à gestão, tecnologia e serviços. No setor industrial, a logística, conhecida como logística empresarial, parece estar muito mais estruturada e consolidada, com os processos e funções mais definidas. No agronegócio, muitas discussões sobre logística parecem ficar mais no âmbito da infraestrutura e menos nos serviços e processos relacionados.
É importante, também, compreender melhor o que significa “ineficiência logística”. É uma situação que pode estar relacionada às condições da infraestrutura utilizada (estradas sem manutenção, por exemplo) ou à escolha de uma infraestrutura menos eficiente ou até mesmo inadequada. São duas questões que estão relacionadas à infraestrutura de transporte e armazenamento.
A “ineficiência logística” pode estar relacionada, também, à realização de um contrato ruim com o operador logístico ou com a falta de planejamento ou entendimento dos processos logísticos envolvidos. Nesses casos, a ineficiência está relacionada à falta de gestão. Enfim, algumas cadeias produtivas ou mesmo empresas praticam uma logística eficiente e outras não. Portanto, há várias realidades diferentes quando o assunto é logística do agronegócio.
Scot Consultoria: Quais são os principais entraves na aplicação de estratégias de melhorias na infraestrutura de transporte e armazenagem no Brasil?
Vitor Vencovsky: Os maiores entraves para a ampliação das infraestruturas de transportes estão relacionados à disputa entre grandes grupos e setores econômicos ou cadeias produtivas para ver quem controla os sistemas de movimentação e armazenagem.
Alguns setores, como o agroexportador, monopolizam as discussões, os planos, os investimentos e moldam o território para atender seus interesses, e não os interesses de todos os participantes do setor agropecuário nacional. Essa situação coloca em cheque sobre quem está realmente no comando do país, o Estado ou os grandes grupos econômicos.
Scot Consultoria: No curto/médio prazo, quais estratégias poderiam ser aplicadas para a prática de uma logística eficaz?
Vitor Vencovsky: No curto e médio prazos, as sugestões para os produtores praticarem uma logística adequada são: (1) conhecer muito bem as características dos seus produtos, para facilitar na definição dos processos, escolha das embalagens e planejamento dos sistemas de armazenamento, transporte e distribuição mais indicados; (2) conhecer a sazonalidade e o mercado em que os produtos estão inseridos, para planejar o momento correto de realizar a colheita e a venda; (3) acompanhar todos os custos logísticos envolvidos nos processos antes, dentro e depois da porteira; (4) conhecer muito bem cada etapa dos processos logísticos envolvidos, para propor melhorias em cada uma dessas etapas; (5) criar indicadores para as principais atividades desenvolvidas, permitindo medir e gerenciar os processos; (6) criar um ambiente favorável para que os colaboradores possam trabalhar com inovação e tecnologia.
Outras sugestões: (1) contratar colaboradores ou empresas de consultoria especializados em logística para planejar e acompanhar os processos; (2) capacitar os colaboradores através de cursos específicos sobre logística agroindustrial; (3) participar de eventos e congressos técnicos sobre logística, possibilitando a troca de experiências com outros profissionais.
Scot Consultoria: Devido à ineficiência de logística, muitas empresas internacionais de logística vem tomando espaço nesse setor. Qual é o perigo, nacionalmente falando, caso as empresas consigam dominar esse setor futuramente?
Vitor Vencovsky: A consolidação de mercado é uma realidade mundial, que já aconteceu em outros setores no país, como o bancário e telecomunicações. Não é novidade no mundo que setores estratégicos passem a ser controlados por poucas empresas, formando oligopólios ou até mesmo monopólios. O setor ferroviário brasileiro, por exemplo, é controlado atualmente por três empresas, que transportam, em grande parte, seus próprios produtos. É uma situação que não existia quando as ferrovias estatais foram privatizadas na década de 1990.
Outro fenômeno muito comum é a verticalização, em que uma determinada empresa passa a participar, direta ou indiretamente, de toda a cadeia produtiva. Como o setor de alimentos no país é controlado por grandes grupos internacionais, nada mais lógico que esses passem a participar mais ativamente do controle dos sistemas de movimentação e armazenagem.
É importante considerar, também, a prática muito comum no mundo de internacionalização das empresas, através da criação de unidades fabris e filiais em praticamente todos os continentes e países do mundo.
A consolidação, a verticalização e a internacionalização das empresas são, provavelmente, a explicação para a participação de empresas internacionais no setor de logística no país, e não a ineficiência.
Como a logística é uma atividade muito estratégica, permitir o seu controle por poucas empresas internacionais (e também nacionais) pode ser um grande perigo para o país. As empresas são seletivas no investimento e não incluem a totalidade das necessidades do país. É importante lembrar que o que é bom para as empresas, não necessariamente é bom para o país.
Scot Consultoria: Devido ao seu tamanho continental, o Brasil necessita de inúmeros investimentos em infraestrutura de transporte e armazenamento. Na sua opinião, o que é necessário para melhorarmos eficientemente? As empresas deveriam ser únicas e exclusivamente responsáveis por essa melhora?
Vitor Vencovsky: O país deveria construir uma infraestrutura de transporte e armazenamento que atendesse ou estivesse disponível para todos os setores econômicos e atividades agrícolas e industriais. As infraestruturas deveriam estar disponíveis para realizar diversos serviços e não apenas o voltado à exportação de grãos e minério, como acontece com a maior parte das ferrovias brasileiras.
Da maneira como as coisas acontecem no país, parece que as empresas são donas das infraestruturas, muitas delas construídas com dinheiro público. É o que alguns pesquisadores chamam de uso corporativo do território.
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Scot Consultoria: Vitor, você acredita que o governo brasileiro poderia incentivar a melhora na logística agroindustrial através de benefícios como a isenção de impostos na aquisição de galpões em pontos estratégicos, fazendo com que, dessa maneira, o Brasil consiga formar uma rede eficiente e rápida de logística atendendo grande parte do agro nacional?
Vitor Vencovsky: O incentivo deveria privilegiar atividades em que o setor privado não tem interesse em participar, em setores em desenvolvimento e ainda não consolidados e na promoção da inovação para preparar o país para o futuro.
Setores já consolidados deveriam ser autossustentáveis, sem interferência ou ajuda do Estado, e buscar financiamentos e outras formas privadas de apoio para construir seus galpões ou armazéns.
Fonte: Scot Consultoria