“Se ainda não alcançamos os EUA em quantidade de carne produzida/ano, é uma questão de pouco tempo”; confira uma análise do cenário macro da pecuária brasileira
Por William Koury Filho* –– Prezados leitores, escrevo esta coluna no final de setembro. Deixamos o inverno para trás e adentramos a primavera – ainda sem chuvas. Nas minhas andanças nos últimos três meses, estive em SP, MG, GO, MS, MT e, também, na Bolívia. O cenário de seca braba é a realidade do momento.
A definição das estações permite um planejamento específico, mas muitos pecuaristas insistem em reclamações recorrentes sobre a seca, fenômeno climático que, todo ano, deixa as paisagens das fazendas, especialmente o capim, com tom de palha e de poeira.
Isso quando dá tudo certo, porque há sempre o risco de fogo – que, este ano, só aqui na vizinhança, vitimou as fazendas do Instituto de Zootecnia de Sertãozinho (SP) e da Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos (SP), assim como outras tantas propriedades brasilzão afora. O fogo torna o cenário triste da seca em caótico. São situações que, muitas vezes, fogem totalmente do controle, mesmo com o planejamento estratégico de aceiros e reserva de alimento. Este ano, particularmente, tivemos o agravamento das geadas, que esturricou pastagens já castigadas pela seca e colocou algumas fazendas literalmente no chão.
Seguindo o roteiro do título desta coluna, falei inicialmente da seca, fenômeno natural de GAIA, teoria que descreve o planeta Terra como um imenso organismo vivo e dinâmico – gosto dessa visão. Agora, entramos no segundo ator deste cenário, o pecuarista, um personagem valente que enfrenta as adversidades do clima e da política com trabalho e dedicação. Porém, em média, planejamento não é o forte desse “super herói”. Muitos insistem reclamar todos os anos ao invés de tomar atitudes que, se não resolvem o problema de disponibilidade de alimento para o gado em circunstâncias normais, ao menos, abrandam as secas mais severas e até situações de entrada de fogo na fazenda.
Nos EUA, o pecuarista que deixa um gado em situação de extrema debilidade em função de disponibilidade de alimento pode ser denunciado e punido por maus tratos, mas não sei se aqui seria uma solução, já que depende dos agentes que interpretam a lei, e nosso judiciário não tem demostrado a parcialidade que deveria para que a democracia realmente seja praticada em sua plenitude.
Aí entra o terceiro personagem dessa história de sucesso da maior potência pecuária do planeta. Se ainda não alcançamos os EUA em quantidade de carne produzida/ano, é uma questão de pouco tempo. Essa é minha percepção, acompanhando a evolução genética e tecnológica da pecuária brasileira ano a ano. Este personagem é o gado zebu que, em pouco tempo, dominou as pastagens do Brasil – onde o rebanho bovino é próximo ao número de seres humanos, cerca de 211,7 milhões de habitantes. Nossa pecuária é realmente muito pujante. Hoje, temos o segundo rebanho em número de cabeças, ficando atrás da Índia, e o segundo maior em produção de carne (atrás dos EUA, com desfrute maior do que aqui).
Mas quem é esse tal de zebu?
É o bos taurus indicus, que possui a funcionalidade e a rusticidade moldadas pela seleção natural há milênios, e que, na história mais recente, vem sendo aprimorada pela seleção artificial. Direcionada antes pelos olhos dos selecionadores, hoje, essa seleção é norteada por avaliações genéticas e genômicas., tanto para o bem como para o mal. Essas duas formas já acertaram muito, mas também já se equivocaram, e a pecuária segue firme e forte porque ainda existe muita variabilidade genética para redirecionar os rumos da seleção quando necessário.
Opa, não vamos deixar a conversa seguir para esse rumo porque aí são muitas páginas de prosa, vamos voltar ao tema. Neste imenso Brasil, com todas as qualidades e adversidades, o pecuarista, o zebu, e seus cruzamentos, têm dado um show de produtividade crescente a cada ano. Ao aprender a lidar melhor com as particularidades de cada região, buscar pacotes tecnológicos de adubação, cultivar de capim e genética bovina, o produtor pode produzir cada vez com menos riscos.
O título da coluna, que poderia seguir um conto engraçado, como aqueles
imortalizados por Monteiro Lobato, poderia também compor os mais sofisticados livros de ciências, economia ou geopolítica. O mundo mudou e a maneira de enxergarmos nossa atividade também. Bem vindos à pecuária de precisão! Vamos que Vamos!
William Koury Filho –– Zootecnista, mestre e doutor em Produção Animal, jurado de pista de Angus a Zebu e proprietário da Brasil com Z – Zootecnia Tropical